Educação
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13 de novembro de 2023
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18:34

CPI da Educação: ‘Ela parece ser laranja’, diz vereadora sobre empresária após depoimento

Por
Luciano Velleda
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Mari Pimentel na CPI da Educação. Foto: Fernando Antunes/CMPA
Mari Pimentel na CPI da Educação. Foto: Fernando Antunes/CMPA

A sessão conjunta das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) da Educação, realizada nesta segunda-feira (13), deixou a sensação entre vereadores de que uma das depoentes exerceu papel de “laranja” na empresa que firmou contrato de R$ 2,4 milhões ao vender kits de robótica para o governo do prefeito Sebastião Melo (MDB).

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Se apresentando como empresária e terapeuta de reiki, Verônica Almuas é proprietária da  empresa Conceito, que vendeu os kits de robótica à Prefeitura de Porto Alegre num processo de inexigibilidade, ou seja, sem concorrência. Ela garantiu não ter tido contato com a ex-secretária de Educação, Sônia da Rosa, durante o processo de venda do kit, função que, afirmou, coube à funcionária Marjorie Nunes, gerente comercial e pedagógica da empresa Conceito. O kit de robótica, ela explicou, era composto por robôs e tapetes pedagógicos. 

A vereadora Mari Pimental (Novo), presidente da CPI da Educação, perguntou como a empresária adquiriu a empresa Conceito, ao que o advogado da testemunha interveio dizendo que tal questão não era objeto da CPI. Mari perguntou então sobre Airton Piez, antigo proprietário da Conceito, que assinou documentos da empresa mesmo após sua saída. Verônica explicou que comprou a empresa de uma pessoa chamada Tauane, não de Airton, e que só era responsável pela mesma a partir de 2019.

Em determinado momento do depoimento, a vereadora Cláudia Araújo (PSD) quis saber se a empresa Conceito vendeu os kits de robótica por inexigibilidade para outras prefeituras do Brasil, ao que Verônica respondeu: “Nós vendemos os kits de robótica apenas desta maneira”.

 

Lia Wilges e Verônica Almuas depuseram nesta segunda (13). Foto: Fernando Antunes/CMPA

Foi quando a vereadora Mari mostrou uma venda dos kits de robótica da empresa Conceito por pregão para a Prefeitura de Maringá. E questionou se Verônica não se lembrava ou se havia faltado com a verdade em seu depoimento para a CPI. A presidente da CPI da Educação disse ainda que o antigo dono da empresa, Airton Piez, representou a Conceito mesmo quando já não era mais o proprietário. 

Verônica e seu advogado disseram que ela ainda não era a proprietária da empresa na época. Porém, a vereadora Mari contestou a informação, enfatizando que tal pregão foi realizado em 2019, quando Verônica já havia comprado a Conceito.

Diante da inconstância, a presidente da CPI da Educação avalia que o depoimento de Verônica Almuas mostrou que a empresária detinha “quase zero” conhecimento sobre a própria empresa, o que revela a fragilidade dos vínculos da empresa contratada pelo governo de Melo numa compra de R$ 2,4 milhões. Ao mesmo tempo, a empresária confirmou ser amiga de longa data da ex-secretária Sonia.  

“Ela parece uma ‘laranja’ nessa relação empresarial”, afirma Mari. A vereadora observou que gostaria de ouvir ainda quatro ou cinco testemunhas na CPI, incluindo Alexandre Alves Borck da Silva, conhecido como “Xandão”, secretário extraordinário de Modernização e Gestão de Projetos e presidente do MDB de Porto Alegre. Ele já foi citado em diferentes momentos ao longo das oitivas da CPI. Mari acredita que o andamento da CPI até o momento traz a suspeita de que o secretário Borck pode ter atuado para “desenrolar” alguns processos de compra da Smed.

“É um cara ligado ao partido, era quem estava ajudando a desenrolar, dentro da prefeitura, as coisas dessas aquisições que tinham problemas. Mostra que estava ao lado da porta do gabinete do prefeito quem estava facilitando para que esses processos todos, que tiveram origens erradas, fossem feitos”, afirmou recentemente a presidente da CPI da Educação ao Sul21.

Em outro momento do depoimento, o vereador Tiago Albrecht (Novo) questionou por qual motivo a empresa Conceito se localizava no mesmo endereço da cervejaria de Airton Piez, se ele continuou sócio da empresa mesmo após tê-la vendido e qual função efetivamente Verônica exerce na empresa. “Sou diretora executiva. O Airton aparece como comercial, na época”, disse Verônica. Sobre o endereço da empresa, ela declarou que “a gente passou pra esse endereço pelo espaço físico que a gente precisava naquele momento, comercialmente”.

O vereador Roberto Robaina (PSOL) perguntou qual era o conceito de inexigibilidade, tendo em vista que a empresa realizou uma venda de R$ 2,4 milhões para a Prefeitura de Porto Alegre. O advogado novamente tomou a palavra: “Isto aqui não é uma prova oral sobre licitações públicas”. Verônica reconheceu que teve a oportunidade de adquirir a empresa, embora não tivesse o conhecimento técnico da área de robótica ou de educação.

Por sua vez, o vereador Aldacir Oliboni (PT) questionou por que o produto da empresa Conceito era tão superior, considerando que não havia concorrência e foi adquirido pelo Município por inexigibilidade. Verônica então disse que não era da parte pedagógica ou de projetos, sendo da área administrativa.

Lotada atualmente no gabinete de Melo, Lia Wilges já esteve no gabinete da Secretaria Municipal de Educação (Smed), na gestão da ex-secretária Janaina Audino, com foco na área de sustentabilidade e meio ambiente. Ela afirmou que, na Smed, desempenhava uma função de “ponto focal”, com gerência somente sobre os fluxos dos processos, se subordinando ao então secretário-adjunto, Mário de Lima. Lia participou das contratações das empresas Ambiética, que, segundo ela, veio de um projeto de trazer a educação ambiental através de um programa na rede municipal; e Mindlab.

A vereadora Mari Pimentel (Novo) questionou a relação de Lia com Jackson Müller, professor da Unisinos, responsável pela Ambiética, preso em operação da Polícia Federal, ao que a testemunha disse que não tinha qualquer relação com ele. A parlamentar trouxe a informação de que o mesmo era secretário num município da serra gaúcha, além de ser filiado ao mesmo partido do prefeito de Porto Alegre, MDB. Lia disse que não imaginou que isso implicaria qualquer impedimento de contratá-lo e que ele foi contratado por seu “notório saber”.

Para a presidente da CPI da Educação, o depoimento de Lia Wilges mostrou uma cumpridora de ordens que passou a responsabilidade de sua atuação para outras pessoas. “Ela disse que só executou o que mandaram ela fazer”, comenta. “Ela reforçou a narrativa de que quem tomava as decisões de compra não era ela e que só fez o que lhe foi pedido”, pondera a vereadora, em relação às compras da empresa MindLab e Ambiente.

Mari quis saber qual a relação de Lia com o prefeito de Porto Alegre. Ela disse que não tinha qualquer relação com Melo. Lia contou que foi indicada para ser a representante da Smed no Conselho de Meio Ambiente e se tornou a interlocutora da Secretaria com o gabinete do prefeito. Segundo a testemunha, a partir disso, o secretário André Flores a convidou para ocupar um cargo no Plano de Logística Sustentável (PLS) no gabinete do prefeito.

 

Lia Wilges e Verônica Almuas depuseram nesta segunda (13). Foto: Fernando Antunes/CMPA

“As oitivas mostram que nada foi por acaso e que é preciso investigar. Todo mundo viu que o que foi feito, não foi correto”, defende Mari.

O vereador Tiago Albrecht (Novo) perguntou por que ela ocupava a função gratificada de diretora de uma escola que não funcionava (fantasma) sendo que trabalhava no gabinete do prefeito e em que contexto se deu sua atuação na contratação da Mindlab. 

Lia disse que teve conhecimento do primeiro fato através do jornal Zero Hora e que a resposta da secretária foi que não haveria problema pra ela. “Mas hoje vejo que sim”, constatou. Sobre a Mindlab, Lia afirmou que seguiu um rito, que recebia uma demanda, atendia e dava fluxo. “Cabia a mim distribuir e encaminhar o processo para quem deveria dizer sim ou não”, esclareceu.

O vereador Roberto Robaina (PSOL) quis saber por quem foi determinada a contratação da Mindlab por inexigibilidade. “Eu não tinha à época nenhum poder de decisão de compra”, disse Lia, reforçando que este poder vinha de instâncias superiores, da secretária titular da pasta. O parlamentar questionou se havia produtos similares aos da Mindlab no mercado e que a servidora Michele Bartzen (também testemunha em oitiva da CPI) declarou que a indicação para a compra desses produtos era de Lia. Mas a testemunha disse que a indicação era do setor CGP, sob tutela à época de Michele Bartzen.

O vereador Giovani Culau (PCdoB) lembrou que a contração da Mindlab chegou a quase R$ 15 milhões e em uma das visitas da CPI às escolas o kit da mesma estava inutilizado, questionando por que da indicação de Lia para a aquisição de Mindlab. Ela disse que sua participação foi somente em uma breve reunião, e depois recebeu um encaminhamento para dar inicio ao processo de aquisição. “Sobre a manifestação da Michele, esse é o posicionamento dela. Não é o meu”, declarou. A testemunha afirmou também que não percebeu qualquer tipo de direcionamento para a aquisição dos produtos da Mindlab.


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