Política
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31 de março de 2023
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15:21

Ex-funcionários denunciam abandono de maquinário da Corag, sete anos após extinção

Por
Luís Gomes
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Gráfica estatal teve extinção aprovada em 2016 e concluída em 2019, mas maquinário permanece no local | Foto: Divulgação
Gráfica estatal teve extinção aprovada em 2016 e concluída em 2019, mas maquinário permanece no local | Foto: Divulgação

Às vésperas do Natal de 2016, a base aliada de José Ivo Sartori (MDB) na Assembleia Legislativa aprovou o projeto que previa extinção da Companhia Rio Grandense de Artes Gráficas (Corag), a gráfica estatal que, entre outras coisas, tinha a responsabilidade de imprimir o Diário Oficial do Estado. Em junho de 2019, já no governo de Eduardo Leite (PSDB), o processo de liquidação foi concluído. Sete anos depois do início do processo, contudo, ex-funcionários da companhia denunciam que os equipamentos da gráfica se encontram abandonados, em estado avançado de deterioração, na sede da extinta estatal, no bairro Glória, em Porto Alegre.

Ex-trabalhadores da companhia procuraram nesta semana a deputada Luciana Genro (PSOL) para denunciar o abandono dos equipamentos. À deputada, entregaram fotografias, feitas em 2021, que mostram como os equipamentos se encontram amontoados, sem qualquer cuidado com a preservação e em ambientes sujeitos a goteiras e a umidade, entre outras intempéries.

Ex-funcionário da companhia, Ricardo Camilo Cunha diz que a Corag, poucos anos antes do fechamento, tinha adquirido máquinas que, à época, tinham custado cerca R$ 1 milhão — em valores da época — e que hoje se encontram em estado de abandono. “Impressoras, reveladoras, máquinas que foram compradas zeradas em 2013, 2014, tudo isso ficou atirado ao deus dará porque o governo Sartori achou por bem encerrar as atividades da Corag”, diz.

O balanço patrimonial da Corag, publicado em 31 de dezembro de 2015, apontava que o valor das máquinas e equipamentos eram calculados em R$ 22,7 milhões ao final daquele ano.

Um dos aspectos mais graves relatados por Ricardo é que, segundo ele, o telhado da Corag já estava condenado há anos e, sem a manutenção adequada, uma parte caiu, justamente em um dos espaços que abriga o maquinário.

“Teve duas guilhotinas [de gráfica] que vieram da China, umas máquinas enormes, que estão lá atiradas, pegando água. Um maquinário caríssimo, todo automatizado, as placas eletrônicas corroídas por pegar água, isso é máquina que vai para o lixo, vai para o descarte. Se contratar um técnico mecatrônico para tentar recuperar a placa eletrônica e um técnico de parte mecânica para tentar trazer a movimentação dessa máquina com óleo hidráulico, que é usado, não imagino quantos mil reais precisa para botar uma máquina dessas para funcionar”, afirma.

 

Foto: Divulgação

Ricardo diz que, além do descaso com os equipamentos que devem ir a leilão, muitos materiais que não tinham sido usados quando a Corag foi encerrada, mas que ainda poderiam ser aproveitados, acabaram sendo descartados ou apodreceram com o passar do tempo. “Os equipamentos que estão ali, mais os papéis que eram utilizados nas impressões, aquilo vai tudo pro lixo. É uma coisa inadmissível, poderia ter sido doado para alguma gráfica para imprimir livros para crianças ou qualquer outra coisa”, diz.

Nesta semana, ex-funcionários da empresa retornaram ao local e, apesar de não serem autorizados a captar imagens, dizem que os sinais de deterioração só se acentuaram. Durante a visita, inclusive, teria sido possível perceber falhas e buracos no teto que levariam à incidência de chuva sobre os equipamentos.

A deputada Luciana Genro pontua que a informação que circulou em 2019 era de que o governo cogitava vender o terreno e utilizar o valor na construção de um novo presídio. A deputada e a reportagem não encontraram informações da época sobre o destino dos equipamentos.

Após receber a denúncia sobre o abandono dos equipamentos, ela encaminhou um ofício ao governo do Estado em que cobra informações sobre a situação da sede e do maquinário da extinta companhia, questiona o número de equipamento, seus valores e quais são as ações tomadas a respeito do destino dos bens.

“Não sabemos, até agora, o que ocorreu com os equipamentos que restaram na antiga sede, e nem o destino do prédio. Estamos questionando o governo sobre o abandono desse patrimônio, que foi constatado por fotografias que chegaram a mim por parte de ex-funcionários”, diz Luciana Genro.

Procurada pela reportagem, a Casa Civil do governo do Estado afirmou que, quando as atividades da Corag foram encerradas, os bens móveis integrantes do seu acervo patrimonial passaram para a Secretaria da Modernização Administrativa e dos Recursos Humanos (SMARH). “Esse mobiliário foi destinado a diversos órgãos integrantes da Administração Estadual”, diz nota encaminhada à reportagem.

Já a respeito dos equipamentos da gráfica, a Casa Civil diz que eles não puderam ter aproveitamento em atividades administrativas e que estão, neste momento, em “processo de avaliação para posterior alienação”.

A Casa Civil diz ainda que o prédio que sediava a Corag está sendo utilizado pela Brigada Militar, portanto não haveria “qualquer forma de abandono”. Contudo, o que está sendo usado pela BM é um espaço na frente da antiga sede, com a área onde estava a maior parte do maquinário sendo localizada nos fundos do terreno. É neste local que o maquinário foi alocado e permanece, segundo as imagens feitas por ex-funcionários, em estado de abandono.

 

Foto: Divulgação

A extinção da Corag foi aprovada juntamente com a autorização para o fechamento da Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde (FEPPS) e da Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH). Além dessas, o governo Sartori também recebeu autorização para extinguir a Fundação de Esporte e Lazer do Estado do RS (Fundergs), a Fundação de Ciência e Tecnologia (Cientec), a Fundação para o Desenvolvimento de Recursos Humanos (FDRH), a Fundação de Economia e Estatística (FEE), a Fundação Zoobotânica, a Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional (Metroplan), a Fundação Piratini — TVE e FM Cultura –, a Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa), a Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore e a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro).

Quando da conclusão da liquidação, em 2019, o governo do Estado informou que a extinção da Corag representava uma economia média de R$ 37 milhões por ano aos cofres do Estado, levando em conta salários e outras despesas.

Em ação que questionou a extinção, o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Gráficas de Porto Alegre alegou que a empresa registrou lucros de R$ 7,7 milhões em 2015 e, nos cinco anos anteriores, repassou R$ 50 milhões aos cofres do Estado. “Longe de constituir economia para os cofres do Estado, a extinção da Corag representaria a perda desses recursos”, diz nota do sindicato divulgada em 2017.

Contudo, o Estado argumenta que 70% do faturamento anual da empresa, na casa dos R$ 54 milhões anuais, deixou de existir quando o Diário Oficial do Estado passou a ser editado apenas em sua versão online.


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