Opinião
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18 de agosto de 2022
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07:13

Mudaram as projeções para 2022. Será? (por Flavio Fligenspan)

Foto: Marcelo Cassal Jr./Agência Brasil
Foto: Marcelo Cassal Jr./Agência Brasil

Flavio Fligenspan (*)

No início do mês de agosto conhecemos os números do IBGE e do Banco Central sobre a atividade econômica de junho, com o que fechamos as estatísticas do primeiro semestre do ano no Brasil. Vários analistas se esforçaram para interpretá-las com um ar de otimismo, tanto pelos resultados já obtidos, como pela projeção possível a partir deles até o final do ano. Quando compararam o primeiro trimestre do ano com o segundo, chegaram mesmo a alterar suas projeções de crescimento do PIB para 2022, em alguns casos alcançando 2% ou até um pouco mais.

É interessante observar que as projeções mais altas para 2022 são acompanhadas de projeções mais baixas para 2023, tanto por efeito estatístico – uma base maior em 2022 –, como porque não se vê sustentação no crescimento. Sabe-se que vários estímulos eleitoreiros terão que ser revistos e que a política econômica ainda será bem apertada no ano que vem, nada a favor do crescimento. O fato é que não me parece haver espaço para otimismo, nem em relação ao que já aconteceu no primeiro semestre de 2022, nem em relação à segunda metade do ano. O balanço de forças positivas e negativas não oferece um saldo que entusiasme.

Falando sobre o passado recente, o primeiro semestre do ano até pode ter tido resultados um pouco melhores do que se esperava inicialmente. As análises mais otimistas se basearam, principalmente, na comparação entre o desempenho do primeiro e do segundo trimestres, mas me parece que há um exagero nesta interpretação. Vejamos. Por exemplo, a produção física (quantidades) da Indústria de transformação no segundo trimestre foi 1,2% maior que a produção do primeiro trimestre, feitos os ajustes sazonais. Foi o melhor resultado dentre os três setores da economia. Em compensação, o Comércio varejista ampliado, que inclui Veículos e motos e Material de construção, vendeu 1,3% menos (em volume) no segundo trimestre do ano, em função de vários fatores, destacando-se a perda de poder de compra ocasionada pela inflação. Já os Serviços, com a o avanço da vacinação e a liberação cada vez maior das atividades presenciais, cresceu 1,1% entre o primeiro e o segundo trimestres.

Com estes números, o IBC – Br, índice produzido pelo Banco Central e considerado uma prévia do PIB, cresceu 0,6% entre os dois trimestres do ano, alternando taxas positivas e negativas nas medidas mensais. Aliás, esta alternância mensal de taxas positivas e negativas ocorre desde o final de 2020, mostrando como não é confiável e firme o ambiente de crescimento na economia brasileira. Inflação alta e mercado de trabalho ainda bem frágil não dão sustentação nem às famílias para o consumo, nem às empresas para o investimento. A propósito, a produção física da indústria de alimentos caiu 4,0% entre os dois trimestres analisados, e o comércio de produtos básicos, medido pelas vendas (volume) dos Hiper e supermercados ficou estagnado. Estas são informações relevantes para avaliar o quanto as famílias de baixa renda estão sofrendo com as condições econômicas atuais e como elas ficaram à margem de qualquer resultado positivo na primeira metade do ano. Observe-se que nem mesmo os muitos incentivos eleitoreiros do primeiro semestre foram suficientes para levantar o consumo, em especial o das famílias de mais baixa renda.

O segundo semestre do ano vai trazer fatores pró crescimento e outros em sentido contrário. Os mais importantes do primeiro grupo são uma inflação um pouco menor, a criação de vagas no mercado de trabalho – ainda que quase a metade delas na informalidade e com rendimentos baixos – e o Auxílio Brasil com valor de R$ 600 por mês. Jogam contra o crescimento várias variáveis, mas a mais relevante é a política monetária com taxas de juros muito elevadas. Como se sabe, o ciclo de alta começou em março de 2021 e seus efeitos são retardados em aproximadamente um ano, mas não falham. Ou seja, o segundo semestre deste ano começa a concentrar as consequências esperadas do arrocho.  

No início de junho eu já havia tratado aqui das expectativas para o segundo semestre de 2022 (“Há um caminho de retomada no segundo semestre de 2022?”), com uma visão não otimista. As estatísticas divulgadas posteriormente entusiasmaram alguns analistas, mas não me fizeram mudar de opinião.

(*) Professor Aposentado do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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