Opinião
|
1 de julho de 2021
|
09:36

Os malandros do transporte de Porto Alegre (por Jonas Reis)

Vereador Jonas Reis (PT) (CMPA/Divulgação)
Vereador Jonas Reis (PT) (CMPA/Divulgação)

Jonas Reis (*)

O tema do transporte público está na ordem do dia, devido ao aumento da passagem para R$4,80, às propostas do prefeito Melo de privatizar a Carris, acabar com os empregos de cobradores e retirar os direitos de isenção da população de Porto Alegre. A malfadada licitação do transporte coletivo feita na gestão Fortunati/Melo apresentou a sua conta para a cidade. A arrogância do prefeito da época e de seu vice (atual prefeito), que não ouviram os alertas da oposição e dos movimentos sociais, levou a uma crise do transporte. Eles são os pais da crise. Crise que não pode ser atribuída apenas aos aplicativos. O transporte privado individual de passageiros, se bem regrado pelo poder público, pode ajudar a agregar qualidade neste sistema falido e não transparente do transporte coletivo.

A licitação feita pela gestão Fortunati/Melo só agravou as mazelas do transporte coletivo, que tiveram início no governo Fogaça. Todos os ganhos obtidos a partir da intervenção nas empresas de ônibus em 1989, na administração do prefeito Olívio Dutra (que possibilitou à prefeitura conhecer as empresas por dentro) foram perdidos. A licitação que deveria servir para reduzir o preço da passagem para o usuário, provocou a elevação da tarifa com um aumento de escandalosos 15,38%, R$0,50 no valor da passagem, antes da assinatura dos novos contratos, em 2016.

O resultado que temos é um sistema que oferece um serviço caro e de péssima qualidade, com ônibus sucateados, lotados, com manutenção preventiva sofrível e sistemático descumprimento de horários. Tudo isso somado a uma planilha de cálculo defasada e a omissão da prefeitura na cobrança das multas das empresas de ônibus. Quem paga essa conta é o povo trabalhador.

A entrega da bilhetagem eletrônica para a ATP resultou em um total descontrole do sistema. O saldo em caixa da ATP decorrente de passagens vendidas e não utilizadas é da ordem de R$160 milhões, que deveriam ser utilizados para a motricidade tarifária. Ao invés disso, a ATP utilizou R$14 milhões desse saldo para pagar dívidas das empresas privadas de ônibus, conforme análise feita pelo Observatório das Metrópoles, nos dados da auditoria do sistema de bilhetagem eletrônica. A auditoria, contratada pela prefeitura no final da gestão passada, não foi completa, pois a ATP deixou de fornecer extratos bancários e outros documentos para os auditores.

O recente processo de aumento da passagem revelou a inclusão no cálculo da tarifa, da conta de luz da ATP, de contas de celulares e multas de trânsito de diretores ou funcionários da associação. Tamanho o descontrole nas contas do transporte coletivo, que são pagas pelo “Seu João” e a ‘Dona Maria’, pelo camelô e pela diarista, trabalhadores em geral que utilizam o ônibus diariamente para se deslocar pela cidade e ir buscar o sustento de suas famílias. Mas o descontrole não acaba aí. As empresas de ônibus devem 60 milhões para a Câmara de Compensação Tarifária, dívida não cobrada pela prefeitura. Desde 2013 as empresas recebem isenção de ISSQN sob o argumento de que é necessário para a passagem não subir. Mas todos os anos (com exceção de 2020) a passagem sobe. É uma farra.

Se não bastassem todos os favores da prefeitura para as empresas, em 2020 o governo Marchezan repassou R$39 milhões para as concessionárias e, em 2021, o governo Melo está repassando mais R$16 milhões de dinheiro público para as empresas que já têm dívidas milionárias com o município, diretamente ou através de sua associação. Empresas que em plena pandemia abandonaram linhas, deixando os usuários sem transporte. O edital da licitação de 2014 prevê que o abandono da prestação de serviço é motivo para o cancelamento da concessão. Mas, ao invés de cancelar a concessão e passar estas linhas definitivamente para a Carris, a prefeitura fez acordo com os empresários e a Carris assumiu temporariamente as 22 linhas, que agora estão sendo devolvidas para as empresas privadas, gerando prejuízos para a companhia pública.

“A dívida das concessionárias com o sistema de transporte público é superior a R$300 milhões de reais.”
Se somarmos os 160 milhões de passagens não utilizadas, os 60 milhões de dívidas das empresas privadas com a Câmara de Compensação Tarifária, os 41 milhões que a ATP diz ter passado para a Carris, mas que a empresa pública afirma não ter recebido, as multas não pagas, os valores ilegalmente incluídos no cálculo da tarifa e os repasses indevidos feitos pela prefeitura para as empresas privadas em 2020 e 2021, a dívida das concessionárias com o sistema de transporte público é superior a R$300 milhões de reais. O povo exige este dinheiro de volta. Chega dessa bandalheira com dinheiro público.

Frente a este descalabro, um verdadeiro caso de polícia. O prefeito Melo propõe entregar a bilhetagem eletrônica para um banco gerir, privatizar a Carris, demitir cobradores e retirar direitos de estudantes e trabalhadores.

Não, prefeito Melo! A cidade não aceita mais este ataque à economia popular! A solução é a assunção da bilhetagem eletrônica pela EPTC, o fortalecimento da Carris e a cobrança das dívidas dos empresários, abatendo nos valores da tarifa paga pelos trabalhadores.

(*) Vereador e Vice-líder do PT. Professor e Doutor em Educação.

§§§

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora