Saúde
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9 de fevereiro de 2024
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19:15

Prefeituras da Serra desobrigam vacinação contra covid para matrícula em escolas

Por
Bettina Gehm
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Prefeituras de Caxias do Sul e de Farroupilha, na serra, publicaram decretos que dispensam a obrigatoriedade de apresentação do atestado de vacinação no ato da matrícula ou rematrícula. Foto: Cristine Rochol/PMPA
Prefeituras de Caxias do Sul e de Farroupilha, na serra, publicaram decretos que dispensam a obrigatoriedade de apresentação do atestado de vacinação no ato da matrícula ou rematrícula. Foto: Cristine Rochol/PMPA

Às vésperas de iniciar o ano letivo, a vacina contra covid-19, que faz parte do Plano Nacional de Imunização (PNI), deixou de ser obrigatória para a matrícula em escolas de algumas cidades do RS. Nesta terça-feira, as prefeituras de Caxias do Sul e de Farroupilha, na serra, publicaram decretos que dispensam a obrigatoriedade de apresentação do atestado de vacinação no ato da matrícula ou rematrícula. Uma lei estadual, no entanto, diz que é obrigatório apresentar a carteira de vacinas na hora de matricular alunos em escolas públicas e privadas.

A lei 15.409/2019 estabelece que os pais ou responsáveis que não apresentarem a carteira de vacinação ou apresentarem a carteira desatualizada serão notificados no ato da matrícula ou rematrícula dos alunos. O texto também dá o prazo de 60 dias para apresentação da carteira atualizada, contando com “todos os registros prescritos, conforme a idade, no Calendário Nacional de Vacinação emitido pelo Ministério da Saúde”.

A prefeitura de Caxias do Sul alega que, como o imunizante contra a covid passou a integrar o PNI em janeiro deste ano, a secretaria de saúde local ainda não dispõe de doses para todas as crianças até 4 anos, 11 meses e 29 dias. A nota do município diz ainda que “cumprir com o calendário vacinal é responsabilidade de pais e responsáveis” e que cabe à escola orientar, acompanhar e divulgar as ações de vacinação do município.

A nota publicada pela prefeitura de Farroupilha ressalta que o decreto emitido na cidade desobriga a apresentação do comprovante de vacinação referente exclusivamente à vacina da covid-19. Continua necessária a apresentação da caderneta de vacinação com os demais imunizantes no ato da matrícula ou rematrícula escolar.

A Secretaria de Educação do RS informou que tem atuado com o Ministério Público e demais órgãos para demonstrar evidências científicas da importância e resultados individuais e coletivos da vacinação. Já a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre disse que, até o momento, não há exigência de vacinação para realizar a matrícula. “De qualquer modo, orientamos que todas as vacinas sejam realizadas”, diz a nota enviada pela pasta. Questionada sobre por que não exige a caderneta de vacinação mesmo com a existência da lei federal, a pasta ainda não se manifestou.

Para a Associação Mães e Pais pela Democracia, os decretos municipais que deixam de exigir a vacina das crianças contra a covid-19 para a matrícula na rede de ensino contrariam a ciência e prestam um desserviço à saúde, além de serem ilegais. O advogado Júlio Sá, presidente da entidade, salienta que em 2020 o STF já definiu que é constitucional a obrigatoriedade de imunização através de vacinas que tenham sido incluídas no PNI. A Associação estuda as medidas cabíveis para buscar a nulidade dos decretos e garantir o direito de vacinação das crianças.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. “Mas a não vacinação não pode ser motivo para negar a matrícula”, ressalta Sá. “Pois, neste caso, a criança ou adolescente estaria sendo duplamente penalizado: primeiro, por não ser vacinado e ficar com sua saúde em risco. Depois, por ter seu acesso à escola negado”. O advogado diz que é preciso garantir a matrícula da criança e que sejam tomadas medidas, inclusive junto ao Conselho Tutelar, para exigir dos pais a vacinação dos seus filhos.

Em Santa Catarina, duas prefeituras que haviam emitido decretos desobrigando a vacina para matrícula em escolas voltaram atrás. A prefeitura de Joinville revogou o decreto uma semana depois de emiti-lo, após a abertura de um inquérito pelo Ministério Público de SC para apurar a legitimidade da norma.

A prefeitura de Criciúma também revogou um decreto da mesma natureza. No entendimento do juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública do município, dispensar a exigência de vacina contra a covid-19 para matrícula e rematrícula escolar viola decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o ECA, já que o Ministério da Saúde decidiu pela inclusão da vacina no PNI.

O Sindicato dos Enfermeiros no RS (SERGS) manifestou repúdio ao decreto emitido em Farroupilha. A categoria considera a norma um movimento contrário à ciência, aos dados epidemiológicos e a determinação federal e estadual de manter atualizados os calendários vacinais da população. A nota ressalta que as crianças e jovens passam 4 horas ou mais em ambientes nem sempre ventilados. “Os 700 mil óbitos pela Covid 19 no país parecem não ter sido suficientes para alertar aos gestores municipais da importância da vacina. […] Desestimular uma vacina enfraquece a cobertura vacinal de todo o calendário. Isso é crime”, conclui o texto.


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