Eleições 2022
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29 de agosto de 2022
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01:02

Primeiro debate tem acusações, insulto a jornalista e destaque para temas ligados às mulheres

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Sul 21
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Primeiro debate durou cerca de duas horas e meia (Reprodução/TV)
Primeiro debate durou cerca de duas horas e meia (Reprodução/TV)

O primeiro debate entre seis presidenciáveis realizado na noite deste domingo (28), num pool entre TV Bandeirantes, TV Cultura, Folha de S. Paulo e UOL, teve troca de acusações entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), agressão verbal contra uma jornalista por Bolsonaro e destaque para temas ligados às mulheres.

Chamado três vezes, pejorativamente, de “ex-presidiário” pelo atual presidente, Lula se disse “mais limpo” que Bolsonaro ou “qualquer outro parente dele”. Foi o ápice das acusações entre os dois candidatos, mas não o único caso. Ciro Gomes (PDT), por exemplo, chamou Bolsonaro de “mau caráter” ao responder a uma provocação do presidente sobre declarações que deu em relação à sua ex-mulher, a atriz Patrícia Pillar.

“Há 20 anos cometi uma bobagem absurda contra uma mulher extraordinária, que foi casada comigo. Já me desculpei um milhão de vezes em relação a isso, mas a sua falta de escrúpulos não permite que o senhor reconheça isso. O senhor corrompeu todas as suas ex-mulheres. Corrompeu os seus filhos. Isso é falta de caráter. O senhor não aprende nada, nunca. O senhor não tem coração”, reagiu.

O bloco de perguntas entre os candidatos começou com Bolsonaro perguntando a Lula sobre corrupção. O presidente citou uma dívida contraída pela Petrobras de R$ 900 bilhões devido ao que chamou de desmandos na estatal. “Isso daria para fazer 60 transposições do [rio] São Francisco, ou seja, o povo nordestino sofreu de sede por causa da corrupção de seu governo”, disse. “O senhor quer voltar ao poder para quê?”, perguntou a Lula.

O ex-presidente ironizou dizendo que sabia que a pergunta viria. “Números mentirosos não compensam na TV”, disse Lula. Segundo ele, não houve governo que mais tivesse apurado casos de corrupção, citando a criação dos portais da transparência, a atuação da Controladoria Geral da União, do Conselho de Atividades Financeira (Coaf), entre outras medidas.

“Tudo aparelhado”, retrucou Bolsonaro, citando a delação do ex-ministro da Fazenda de Lula, Antonio Palocci – anulada pelo STF em 2020. “O presidente está destruindo o país. Adora bravatas, adora citar números que não existem, de achar que o povo acredita. O povo tem saudades do meu governo. Aquele país vai voltar”, concluiu Lula.

Bolsonaro virou o alvo preferencial dos outros candidatos, especialmente da senadora Simone Tebet (MDB). Respondendo a uma pergunta sobre o SUS, atacou a gestão da pandemia pelo governo. “A pandemia poderia ser bem gerida se tivéssemos um presidente preocupado com a dor alheia. Eu sei porque estava na CPI [da Covid]. Ele negou vacina. Ele atrasou em 45 dias a vacinação. Quantos filhos perderam pais ou mães perderam filhas? Não vi o presidente pegar a sua moto e entrar num hospital para abraçar uma mãe em luto. A pandemia se arrastou porque não teve coordenação”, disse.

Antes disso, Tebet já havia atacado Bolsonaro ao responder uma pergunta da bancada coordenadora do debate sobre o clima de tensão entre os poderes. “A harmonia [entre os poderes] precisa de um presidente que cumpra a Constituição. Mas hoje esse presidente ameaça a democracia e os valores democráticos a todo momento. Não respeita a imprensa livre e a independência entre os podres. A resposta para isso é trocar o presidente. Sem paz não vamos crescer. Nem gerar empregos”, disse.

Segundo Bolsonaro, a crise entre os poderes se deve aos critérios técnicos que usou para a escolha dos seus ministros. “Isso causou desconforto, principalmente no MDB. Eu abalei o equilíbrio entre os poderes, onde todos eram amiguinhos e davam uma banana para o povo”, afirmou o presidente. O candidato do PL criticou o que classifica como “ativismo judicial” de ministros do STF, que entre “outras barbaridades” mandou investigar um grupo de empresários que defenderam um golpe de Estado caso o presidente não seja reeleito. “Alguns ministros querem interferir no Executivo a qualquer preço”, disse, em referência indireta ao ministro Alexandre de Moraes.

O presidente também foi acuado pelo candidato do PDT, Ciro Gomes, que se disse “chocado” com uma declaração recente de Bolsonaro sobre a fome no país. “Cada um interpreta como quer. Nossa inflação é das menores do mundo. Menor que nos Estados Unidos. Voltamos agora aos números pré-pandemia, com o PIB crescendo. Fizemos milagres. Lamentamos as mortes, mas no meu governo reduzimos as famílias pobres de 5 milhões para 4 milhões. Alguns passam fome sim, mas não nesse número exagerado”, defendeu-se Bolsonaro.

“É uma aberração termos um presidente que desconhece a realidade. Há 33 milhões de pessoas passando fome no país. 125 milhões que não fazem as três refeições por dia. É uma política de renda politiqueira”, retrucou Ciro.

Lula foi fustigado pela tema da corrupção, mas tentou centralizar suas intervenções nos avanços econômicos de suas gestões. Perguntado pela candidata Soraya Thronicke (União Brasil) sobre questões tributárias, disse que quando foi eleito pela primeira vez, em 2002, o Brasil estava quebrado. “Tínhamos 12% de inflação e de desemprego. Uma dívida pública de 60% [do PIB]. Reduzimos para 39%. A inflação foi para dentro da meta. Geramos 22 milhões de empregos. E conseguimos ter reserva internacional que jamais tivemos. Ou seja, o país é possível de ser consertado”, afirmou.

A candidata retrucou que o país de Lula só existe na propaganda eleitoral e acusou os economistas do PT de serem “mofados” ao desconsiderarem os avanços do mundo digital nas suas propostas de governo. “Não vi esse mundo que o senhor descreve”, disse Thronicke. “Mas seu motorista viu, seu jardineiro viu, sua empregada doméstica viu”, respondeu Lula.

No segundo bloco do debate, as perguntas aos candidatos eram feitas por jornalistas do pool de veículos, que decidiam quem iria responder e quem iria comentar sobre a resposta. O bloco foi marcado, principalmente,  pelo descontrole do presidente Bolsonaro, que atacou verbalmente a jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura, e a candidata Tebet, além de elevar o tom de voz durante diversos momentos.

Bolsonaro foi o primeiro candidato a ser questionado. Feita pelo jornalista Rodolfo Schneider, da TV Band e Rádio Bandnews FM, a pergunta abordou o tema do auxílio emergencial. Schneider mencionou os auxílios já aprovados e previstos para 2023, como o Auxílio Brasil, além de auxílios para caminhoneiros e taxistas, e questionou de onde sairá o dinheiro para cobrir os programas de transferência de renda. 

“Como conseguir recurso? Não roubando, não metendo a mão no bolso do povo. Podemos pegar recursos das estatais, trazer para o lado de cá para o orçamento. Nosso governo tem esse olhar, tem meios e fará com responsabilidade”, afirmou Bolsonaro. Lula, que havia sido escolhido para comentar, retrucou que a manutenção dos R$ 600,00 do auxílio emergencial, não está na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que foi enviada para o Congresso Federal e afirmou que Bolsonaro “adora falar números que nem ele entende”. 

“Para de mentir, tá no teu DNA mentir”, retrucou Bolsonaro a Lula, com o tom de voz exaltado. “Sobre a LDO, se resolve, tenho contatos com a Câmara. Temos ao nosso lado a verdade e a responsabilidade, a economia está bombando”, afirmou.  

O tema das vacinas foi citado novamente por Lula durante sua resposta a uma pergunta da jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha, sobre a união da esquerda e o clima de rivalidade entre ele e Ciro Gomes. “Se as pessoas não são vacinadas é irresponsabilidade de quem comanda. E o Brasil era lembrado no mundo inteiro como exemplo de vacinação”, disse Lula. 

“Tenho profundo respeito pelo Ciro Gomes. Mas, nesse instante, ele resolveu não estar conosco”, continuou Lula respondendo a pergunta de Patrícia. “Eu espero que o Ciro nessas eleições não vá pra Paris [no segundo turno], que ele fique aqui no Brasil, que a gente sente para conversar e construir uma verdadeira aliança”.

“Lula é um encantador de serpentes. Ele sempre quer trazer a coisa pro lado pessoal”, retrucou Ciro, afirmando que Lula “se deixou corromper” e que atribui ao candidato e ao PT a eleição de Bolsonaro em 2018. Ao que Lula respondeu: Nós ainda vamos conversar e você vai pedir desculpas, porque você sabe que tá dizendo inverdades. Eu não fui pra Paris, e fui preso para não ganhar as eleições. Você sabe que eu fui absolvido em todos processos”. 

O tema do respeito aos direitos das mulheres foi dominante. A senadora Simone Tebet, candidata do MDB, acusou Bolsonaro que defender assassinos e estupradores e perguntou por que o presidente tem tanta raiva das mulheres. “Qual estuprador? Me acusa sem provas. Por que faz uma denúncia barata como se eu não gostasse de mulheres? Não cola mais. Chega de vitimismo. Sancionei mais de 60 leis favoráveis às mulheres. A maioria das mulheres me ama.”, declarou.

O segundo bloco do debate também foi marcado pelos ataques verbais de Bolsonaro à jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura, e à candidata Tebet, além de elevar o tom de voz durante diversos momentos. Vera Magalhães endereçou uma pergunta para Ciro, abordando a queda nos números da cobertura vacinal do Brasil e questionando em que medida a desinformação sobre vacinas, difundidas, inclusive, pelo próprio presidente, influencia a população. Ciro reforçou que a vacina é algo trivial e lembrou que o Brasil era um exemplo na cobertura vacinal. “Mas vimos disputa envolvendo a vacina, propina na compra de vacinas. Estamos no fundo do poço”, disse. 

Já Bolsonaro, que havia sido escolhido para comentar, fugiu do tema e utilizou todo o tempo de seu comentário para atacar a jornalista da TV Cultura. “Acho que você dorme pensando em mim. Você tem alguma paixão em mim. Não pode tomar partido num debate como esse. Fazer acusações mentirosas a meu respeito. Você é uma vergonha para o jornalismo brasileiro”, disse. À candidata Tebet, Bolsonaro disse que ela era “uma vergonha no Senado Federal”. “E não, não tô atacando mulheres não, não venha com essa historinha de se vitimizar”, finalizou Bolsonaro. 

A atitude de Bolsonaro foi criticada pelas duas candidatas mulheres em outros momentos do bloco. “Quando eu vejo o que aconteceu com a Vera, eu realmente fico extremamente chateada. Quando homens são tchutchuca com outros homens, mas vem pra cima da gente [mulheres] sendo tigrão, eu fico extremamente incomodada”, afirmou Soraya. 

Ao falar sobre violência contra mulheres e crianças, a candidata Tebet ressaltou que Bolsonaro, enquanto presidente, não dá um bom exemplo para a população. “Temos que colocar na cadeia agressor de mulheres, crianças e adolescentes. É esse exemplo que temos que dar, exemplo que o presidente não dá quando fala e agride as jornalistas, quando agride as mulheres”. 

As diferenças entre as candidaturas das duas mulheres também foi pauta. A jornalista Thaís Oyama, do Uol, ressaltou que Tebet tem focado na campanha o fato de ser mulher e feminista, enquanto Soraya não tinha esse enfoque. “Ser feminista é defender o direito das mulheres, e não tem esquerda ou direita que vai capitanear essa pauta. Precisamos de uma mulher para arrumar a casa, para pacificar o país”, afirmou Tabet. Soraya disse que é “pela paridade”. “Tanto foi, que escolhi pra ser meu vice um homem. Não quero mais do que nós mulheres merecemos. Nós queremos o nosso lugar, nosso espaço de poder, que merecemos e temos a capacidade”, disse.

Outros temas abordado no debate foram a mistura entre religião e política. Escolhida pela jornalista Mônica Bergamo, da Folha, a candidata Soraya defendeu a liberdade religiosa e que “todos têm direito a adorar o deus que bem entenderem” e criticou as pessoas que utilizam “na política o nome de deus em vão”. Escolhido para comentar, Felipe d’Avila afirmou que “É preciso manter a religião longe da política. Isso é uma democracia não uma teocracia”.

A última pergunta do bloco abordou o tema da infraestrutura brasileira, especialmente em relação ao agronegócio e o transporte de itens para exportação. Felipe d’Avila defendeu a necessidade de investimento público privado, concessão e parcerias, não só na área da infraestrutura, mas também em outras, como saneamento básico. “Não sei como as pessoas são contra a privatização. A gente tem que privatizar tudo no Brasil, tem que acabar com esse mal uso do dinheiro público”, disse. 

O mesmo ponto foi reforçado por Tebet, escolhida para comentar. “Precisamos de investimento privado para o Brasil voltar a crescer. Quem faz ferrovias no Brasil é a iniciativa privada. Rasgar o país de ferrovias significa trazer os grãos mais baratos, mais rápido e de forma mais ecológica”, afirmou. 


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