Política
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10 de fevereiro de 2023
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16:06

PLs no legislativo federal e estadual propõem ações para coibir assédio em casas noturnas

Por
Duda Romagna
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Foto: Jensie De Gheest/Pixabay
Foto: Jensie De Gheest/Pixabay

Na primeira semana de atuação dos novos parlamentares do legislativo, dois Projetos de Lei (PLs) em defesa de mulheres vítimas de violência e assédio sexual em bares e casas noturnas foram protocolados, um na Câmara dos Deputados, de autoria de Maria do Rosário, e outro na Assembleia Legislativa, de Stela Farias, ambas deputadas do PT gaúcho. Os PLs “Não é não” e “Não se cale RS” preveem protocolos de atendimento e acolhimento humanizados, além de estabelecerem normas de cooperação na identificação de agressores.

Logotipo do protocolo “No Callem”. Foto: Reprodução

Recentemente, o protocolo que inspirou os projetos, chamado de “No Callem”, foi aplicado em Barcelona no caso protagonizado pelo jogador de futebol brasileiro Daniel Alves, acusado de estuprar uma mulher em uma boate. Na cidade catalã, a norma foi implementada em 2018. No caso de Daniel Alves, a rapidez no atendimento à vítima chamou atenção, o crime teria ocorrido na noite do dia 30 de dezembro de 2022 e o exame de corpo de delito foi realizado na mesma madrugada. O jogador foi preso no dia 20 de janeiro e, segundo o jornal El Periódico, as amostras de DNA confirmaram que havia sêmen de Daniel na cavidade intravaginal da vítima.

As tramitações na Câmara e na Assembleia Legislativa são independentes, mas, na opinião de Maria do Rosário, são igualmente essenciais para garantir o cumprimento efetivo do que é proposto. “Assim como foi decisivo no caso de Daniel Alves, em Barcelona, agir decisivamente em favor de uma vítima de violência, achamos que no Brasil, do tamanho que somos, precisaria de muito esforço. Nesse sentido, a existência de projetos nos âmbitos federal, estadual e municipais cria um movimento sinérgico que fortalecerá a sua aprovação e implementação em todo o país. Reflete a dimensão do problema que temos”, explica.

Optamos inclusive por fazer uma proposta nacional reconhecendo a legislação existente para enfrentar a violência de gênero, pois ela resulta de décadas de lutas das feministas, estendendo a responsabilidade para as empresas privadas”, finaliza.

Stela Farias concorda e reforça a importância de outras leis que já preveem o acolhimento às mulheres, como a Lei Maria da Penha. “Depois de aprovadas, a nossa lei estadual vai estar amparada por uma legislação federal, o que sempre é positivo, na medida em que assegura o cumprimento do protocolo assim como as suas penalidades”, diz. Ela espera que a recepção pela sociedade civil e pelas organizações e empresas seja positiva. “Vamos constituir com essas instituições uma atuação conjunta em rede para assegurar que o protocolo seja cumprido, que haja penalização e que, principalmente, as mulheres vítimas tenham direitos assegurados e sejam protegidas aos olhos da legislação”, completa.

Stela e Rosário protocolaram projetos sobre o tema. Fotos: Celso Bender/Agência ALRS e Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Os textos definem que é direito da vítima de assédio ou violência sexual o respeito às suas decisões, ser prontamente atendida por funcionários para relatar a agressão, resguardar provas e evidências, ser acompanhada de pessoas de suas escolha, ser imediatamente protegida, acionar os órgãos competentes e ser atendida sem preconceitos.

Aos estabelecimentos é dever capacitar funcionários e treiná-los para agir em situações de violência, disponibilizar recursos para a vítima se dirigir aos órgãos competentes, manter serviço de filmagem interna e externa, preservando e disponibilizando para investigação, criar um código próprio para que mulheres possam alertar funcionários, manter informações visíveis ao público sobre o protocolo, manter ambientes seguros para a proteção da vítima e chamar seus amigos.

Os funcionários, devidamente treinados, devem acolher a vítima, ouvi-la, confortá-la e respeitar suas decisões, afastá-la do agressor, informar sobre os procedimentos que serão adotados e identificar o agressor. Os dois projetos definem que valem para festas, espetáculos, shows, restaurantes, bares e eventos esportivos.

Duas mulheres que já foram vítimas de violência em boates foram ouvidas pela reportagem. Uma delas, relatou que estava sendo seguida por um homem dentro de uma festa, quando precisou acionar um segurança para afastá-lo. “Saí procurando algum segurança, de roupa toda preta, com fone, na multidão. Achei um, disse que tinha um cara estranho me seguindo e me incomodando. Eu apontei quem era, foi fácil, mas depois o cara voltou e eu desisti de pedir ajuda. Fui embora da festa por estar perturbada”, explica. “A maior parte dos casos como esse acho que poderiam ser facilmente evitados, um segurança ter ficado de olho nele por mais tempo já teria resolvido.”

A outra foi ameaçada por um homem após se recusar beijá-lo. “Ele ficou agarrando o meu pulso bem forte e meu amigo teve que me puxar pra me afastar”, disse. Neste caso, procurou ajuda de um segurança que só ameaçou tirar o homem da festa. Em outro lugar, presenciou o assédio de uma menina que dormia encostada em uma mesa. “A gente precisou afastar o cara e acordar a menina, os seguranças viram e não fizeram nada.” Para ela, as iniciativas propostas pelas deputadas são importantes para garantir que esses casos não fiquem impunes. “Principalmente para os profissionais saberem como agir, segurança não é só pra evitar briga e roubo”, observa.

Enquanto protocolos padronizados não existem, algumas casas noturnas experimentam alternativas. Um exemplo de código para identificação de violências é o adotado pela Cucko, casa noturna localizada no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre. Nos banheiros femininos, placas informam sobre o “Drink da Maria”, uma bebida fictícia, que quando é pedida no bar, a equipe é alertada que a pessoa está precisando de ajuda. A partir disso, a equipe aborda a vítima de maneira discreta e oferece suporte, podendo chamar um táxi, pessoa de confiança ou órgãos competentes.

Para Pedro Tribino, gerente de produção da Cucko, as propostas de lei são importantes para que mais locais adotem esses procedimentos. “Nossa equipe de atendimento e segurança passa por treinamentos constantes focados no cuidado e atenção com os nossos clientes, principalmente mulheres e pessoas LGBTQIAP+. Em casos de assédio contra mulheres, possuímos uma equipe feminina para auxilio imediato à vítima. Incentivamos através de placas de sinalização dentro da casa, a denúncia imediata para nossa equipe, em casos de assédio ou abuso”, explica.


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