Política
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8 de janeiro de 2023
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23:25

Destruição, orações e choros: jornalista faz imagens exclusivas de invasão do Congresso

Por
Sul 21
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Foto: Reprodução/Sul21
Foto: Reprodução/Sul21

Jornalista que estava no Congresso Nacional durante invasão terrorista neste domingo (8) e que,  por medo de represálias, pediu para não ser identificado enviou um relato e imagens exclusivas para o Sul21 sobre ato terrorista no prédio

Eram três da tarde deste domingo (8), e a invasão do Congresso, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF) já havia iniciado há uma hora. Na Esplanada dos Ministérios, principal acesso aos mais importantes palácios da República, ainda não havia qualquer bloqueio policial que impedisse que mais golpistas se aproximassem dos prédios. E era justamente o que acontecia. Pior do que isso: ao perguntar para os poucos policiais militares do Distrito Federal que estavam ali sobre possíveis providências, um deles não se acanhou em responder.

– A manifestação é legítima, com certeza.

Ao contrário de qualquer manifestação da esquerda brasileira – por exemplo, na votação da PEC do Teto de Gastos em 2016 ou a Greve Geral de 2017 -, não havia repressão violenta ali na baixada de grama que dá acesso ao espelho d’água, à rampa e às principais entradas do Congresso Nacional.

A reportagem do Sul21 entrou no Congresso por um vidro quebrado, e a situação dentro do prédio era caótica. Havia aquele barulho intenso de quebradeira. Vidros, detectores de metais, obras de arte, placas de sinalização, tapetes, maquetes do próprio prédio, jardins, janelas, portas: tudo havia sido atacado. Destruição total, pichações. O carpete do salão negro do Senado estava encharcado. No subsolo, chovia água dos equipamentos anti-incêndio.

A própria porta de vidro de acesso ao plenário do Senado estava quebrada. Os golpistas tentavam sem sucesso ligar a câmera de vídeo, que transmite as sessões da Casa. Muitos oravam a Deus, com manifestações católicas e protestantes. Alguns choravam, emocionados. Outros já estavam sentados na mesa diretora do Senado. Um, vestido com trajes militares, escrevia num papel “Supremo é o Povo”. Poucos cobriam o rosto, preocupados com uma possível prisão. Uma oração em conjunto foi convocada. Dezenas colocavam os pés sobre as mesas.

A quebradeira também rompeu o vidro que separa o Senado da Câmara de Deputados. No momento em que a reportagem chegou, um cordão de isolamento da Polícia Militar impedia a invasão ao plenário da Câmara. Um dos policiais tentava negociar com os golpistas, com palavras condescendentes.

– Não estamos representando nenhum lado aqui. Queremos negociar.

Mas foi interrompido por um superior.

– Eu preciso que vocês saiam, senão vamos iniciar a operação!

Como ninguém saiu no primeiro momento, bombas de gás e balas de borracha foram disparadas à queima roupa. Houve correria no Salão Verde na casa, na escada de acesso e na saída para a rampa da Casa.

Do lado de fora, a situação continuava extremamente tensa. A reportagem tentou se aproximar do Palácio do Planalto, que a essa altura também estava tomado por golpistas. A mesma ação de retomada pela Polícia era executada por ali. Além do Choque da PM-DF, chamava a atenção o efetivo da Guarda Nacional, que conseguiu, outra vez, expulsar os manifestantes.

Alguns quebravam pedras portuguesas para lançar sobre os policiais. No céu, helicópteros mandavam bombas de gás, desbaratando os grupos golpistas. Chamava a atenção a falta de um comando claro na ação criminosa: enquanto alguns pediam todos sentados, outros pediam por um avanço. Enquanto alguns aplaudiam os policiais militares que se postavam parados à retaguarda, outros chamavam esses policiais de traidores.

Do outro lado da Esplanada, perto do Itamaraty, um grupo grande de policiais militares do DF se reuniu. Em fila, eles desceram o gramado, numa tentativa de criar um cordão de isolamento para o Congresso. Foram cercados e humilhados pelos manifestantes. E não reagiram. Preferiram se esconder, em marcha ré, na entrada de veículos do Congresso. Ali, os golpistas, inflamados, comemoravam o recuo da Polícia quando foram duramente atacados com balas de borracha e gás lacrimogênio. Fugiram outra vez.

A essa altura, quase no fim da tarde, o Supremo também já havia sido recuperado pela Polícia e a Guarda Nacional. Os terroristas se puseram a frente da cavalaria e cantaram o hino nacional, como súplica contra ação da PM. Não adiantou, foram novamente varridos pela repressão policial.

No recuo, a reportagem passou novamente no Congresso, onde no primeiro andar, havia focos de incêndios. Na sala da liderança do PT, fotos do presidente Lula estavam quebradas, da mesma forma uma placa que celebrava as deputadas federais do Partido dos Trabalhadores.

Enquanto anoitecia, a maioria dos manifestantes remanescentes, os mais radicais, subiram no teto do Congresso e até mesmo na cúpula do Senado. Dali, foram atacados por helicópteros da Polícia Militar. Os golpistas desciam escorrendo a cúpula, apavorados. Foi o momento de maior repressão. Muita gente caiu ao chão. Na rampa do Congresso, um homem se ajoelhou, de costas para a polícia, que disparava balas de borracha. Levou muitas balas nas costas, e virou uma espécie de herói da maioria que fugia, assustada.

Foi justamente nesse momento que começaram a ocorrer as prisões, para quem insistia em se manter em posição de ataque. Embora extremamente tardias, as ações da Polícia Militar do DF e da Guarda Nacional conseguiram retomar o controle dos principais palácios da República.

Já era noite quando os golpistas, muitos aos celulares, indicavam que a nova concentração ocorreria na frente do Quartel Militar do Exército Brasileiro, a alguns quilômetros dali.


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