Meio Ambiente
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13 de dezembro de 2023
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19:05

COP 28: Conferência em Dubai termina com sinal tímido para fim da era dos combustíveis fósseis

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Sul 21
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Cerimônia de encerramento da COP 28, em Dubai. Foto: COP28 / Anthony Fleyhan
Cerimônia de encerramento da COP 28, em Dubai. Foto: COP28 / Anthony Fleyhan

“Fazer a transição para fora dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos.” A frase, inserida no documento final da COP 28, encerrada nesta quarta-feira (13) em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, indica que pela primeira vez desde 1994, quando a Convenção do Clima da ONU entrou em vigor, os principais causadores da catástrofe climática são encarados.

A referência que convoca todos os países do mundo a mudarem sua matriz energética consta na decisão do primeiro Balanço Global (GST) do Acordo de Paris, aprovado em poucos segundos na manhã de quarta (madrugada no Brasil). O sinal para o fim da era dos combustíveis fósseis foi dado nos Emirados Árabes Unidos, um dos principais produtores de petróleo do mundo e numa conferência presidida por um executivo do petróleo. O evento deste ano contou com a forte presença de lobistas do setor petrolífero.

Nas 48 horas que antecederam o fim da COP 28, um texto demandando a “eliminação gradual, justa e ordenada” dos combustíveis fósseis chegou a ser incluído e depois eliminado. Na avaliação do Observatório do Clima, a principal rede da sociedade civil brasileira sobre a agenda climática, o evento terminou com o Balanço Global (GST) do Acordo de Paris produzindo um pacote de decisões sobre energia com algumas sinalizações importantes, em meio a “um monte de empulhação e um agrado aos países produtores de óleo e gás”.

Para o Observatório do Clima, os principais pontos positivos do pacote são a convocatória à “transição” (“transition away from”, no original em inglês), que pode ser entendida como um sinônimo de “eliminação gradual” que não ofende nações petroleiras como a Arábia Saudita; a determinação de que isso seja iniciado já nesta década, prazo crítico para que o mundo tenha a chance de se manter no limite de aquecimento global de 1,5ºC preconizado pelo Acordo de Paris; e a determinação de triplicar a parcela de fontes renováveis na matriz energética global até 2030, duplicando a taxa global anual de eficiência energética no mesmo período.

Ainda que importante e inédito, o resultado também é avaliado como insuficiente para garantir o que o presidente da COP 28, Sultan Al-Jaber, chamou de “estrela-guia” da negociação, o objetivo de estabilizar o aquecimento em 1,5ºC. Isso porque o pacote traz uma série de elementos que ou não auxiliam na transição ou que vão diretamente de encontro a ela.

“O GST fala, por exemplo, em ‘acelerar esforços para reduzir o carvão mineral não-mitigado’, o que não tem nenhuma diferença para o que o mundo já está fazendo e que já havia sido decidido em 2021, na COP de Glasgow. Também promove tecnologias que ajudam a manter a produção e o consumo de fósseis, como a captura e armazenamento de carbono (CCS). Por fim, num aceno gigantesco ao status quo dos países petroleiros, o texto de Dubai defende ‘combustíveis de transição’, que incluem o gás fóssil”, critica a entidade brasileira que reúne mais de 95 organizações, entre ONGs ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais.

O documento final cita a necessidade de atingir o pico das emissões globais em 2025, porém o apelo não é ancorado em chamados específicos para os países. Outro vazio apontado no texto se refere ao prazos para a transição, a diferenciação entre países e os recursos financeiros que deveriam vir das nações ricas para as pobres efetivaram a transição energética. Na avaliação do Observatório do Clima, países africanos e outros menos desenvolvidos “engoliram” a omissão em nome do consenso, mas essa será uma disputa para as conferências de Baku, no Azerbaijão, em 2024, e a COP 30, em Belém, em 2025.

“A menção no texto da conferência de substituição do uso de combustíveis fósseis é inédita, mas totalmente em desacordo com a realidade de países que projetam um aumento em suas fontes sujas de energia que é 100% maior do que o permitido pelos limites do Acordo de Paris”, declarou Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima. “Os países agora precisam decidir que verdade irá prevalecer: a do texto da COP, ou a dos seus planos de explorar cada vez mais petróleo, carvão e gás.”

Ele pondera que o Balanço Global deveria orientar os países a produzir Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) para 2035 mais robustas, em sintonia com os indicadores científicos. Porém, a ciência demanda que as emissões sejam reduzidas em 43% já nos próximos sete anos para que o objetivo de Paris não seja perdido. Há uma requisição (“the Conference of the Parties requests”) aos países para que melhorem suas metas para 2030 já no ano que vem para alinhá-las com o objetivo do acordo, mas nenhuma indicação de como isso será feito e sem referência ao custo financeiro para que os países em desenvolvimento, que são hoje os maiores emissores de gases de efeito estufa, alcancem o objetivo.

O conjunto de decisões de Dubai, conhecido como o “Consenso dos Emirados Árabes Unidos”, aborda ainda como funcionará o fundo de perdas e danos, o delineamento de uma Meta Global de Adaptação e avanços considerados tímidos no Programa de Trabalho de Transição Justa e no Artigo 6, que trata de mecanismos de flexibilidade (a maioria deles mercados de carbono).

“Em mais uma demonstração do limite do que as conferências do clima podem entregar num mundo em aquecimento descontrolado, a COP28 fornece mais uma plataforma de ação e adia as esperanças da humanidade”, avalia o Observatório do Clima.

A expectativa agora é que na COP 29, em Baku, seja finalizado o novo objetivo quantificado global de financiamento climático, e que na COP 30, no Brasil, as novas metas ajustadas para o ano de 2035 sejam apresentadas.

“O texto que sai daqui hoje também aumenta a responsabilidade do Brasil em construir um caminho para que a COP 30 em Belém entregue um aumento de ambições que responda ao desafio de manter o mundo dentro do limite de 1,5ºC. E isso deve começar recusando o convite de ingresso na OPEP”, defende Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.


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