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26 de janeiro de 2022
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17:25

Em meio ao calor, periferia de Porto Alegre sofre com falta de água: ‘Quando tem, é muito pouca’

Por
Fernanda Nascimento
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Zona leste da Capital enfrenta problemas graves com a falta de água. Foto: Luciano Lanes/Arquivo/PMPA
Zona leste da Capital enfrenta problemas graves com a falta de água. Foto: Luciano Lanes/Arquivo/PMPA

Os moradores da periferia de Porto Alegre enfrentam há dias a falta de água. Em um mês de temperaturas recordes, regiões da zona leste e do extremo sul da cidade passam dias sem água nas torneiras. Mais do que uma ação pontual, as lideranças comunitárias das regiões cobram uma solução definitiva para a falta de água recorrente no verão: “é falta de planejamento e infraestrutura da Prefeitura”, aponta Cláudia Maria da Cruz, moradora da Restinga.

Em meio à pressão da comunidade e de vereadores, o prefeito Sebastião Melo realizou uma reunião com a direção do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) e anunciou que adotará medidas para solucionar o problema. “Vamos contratar mais caminhões-pipa para abastecer as regiões que estão desabastecidas de água. Nós vamos fazer contratos emergenciais de funcionários para poder ajudar na manutenção. E fazer todas as providências possíveis para amenizar o drama que vive hoje a cidade”, declarou em vídeo publicado em suas redes sociais.

Para os moradores de regiões afetadas, o problema precisa de soluções rápidas para o momento e, especialmente, investimento em obras de médio e longo prazo. Jaqueline de Castro, presidente da Associação de Moradores da Ocupação Vida Nova, localizada na Restinga, conta que a falta de água é “uma constante”. “Hoje, em algumas partes da comunidade tem água fraca e, em outras, não tem nada. Como a gente é uma comunidade que ainda não é regularizada, parece que a gente não tem voz”.

5ª unidade da Restinga é uma das comunidades que mais sofrem com a falta de água na região. Foto: Luis Antônio Gomes de Souza/Arquivo pessoal

A falta de água não impacta apenas o cotidiano da comunidade, interferindo também em situações de emergência, como em casos de incêndio. Em 2019, a casa de Jaqueline pegou fogo e não havia água para ajudar a apagar as chamas. “Aconteceu comigo e já aconteceu com outros vizinhos. Enquanto os bombeiros não chegam, ninguém pode ajudar porque não tem água”, relata.

Matheus Gomes (PSOL) é um dos vereadores que tem recebido muitas denúncias de falta de água e encaminhado requerimentos diários para a Prefeitura solicitando providências. Desde sábado (22), ele foi contatado por mais de 30 pessoas de diferentes localidades em busca de ajuda. “A falta de água em Porto Alegre é um problema que sempre ocorre no verão. E diante da onda de calor e da estiagem está afetando de maneira significativa a cidade e, especialmente, as comunidades. Os casos cresceram em uma velocidade preocupante e a gente já apresentou para a Prefeitura a defesa de um plano de contingência”, relata. Entre os pontos defendidos por Gomes está o aumento de caminhões-pipa e a construção de caixas d’água em casas de famílias em situação de extrema vulnerabilidade que estão inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) do governo federal.

Para a liderança Márcia Kovaski, também moradora da Restinga, a onda de calor dos últimos dias tem explicitado outros problemas graves já enfrentados na região. “A Restinga é muito diversa. Então, tem locais em que as pessoas já moram em condições precárias e tudo se intensifica com o calor: não tem água potável, não tem água para nada, não tem saneamento básico e fica o esgoto correndo a céu aberto. É uma situação muito difícil”.

Outra reclamação dos moradores é a qualidade da pouca água que chega às torneiras. Muitas vezes com coloração ou odor, a água é apontada como responsável pelo desenvolvimento de problemas de saúde, especialmente estomacais. “As crianças ficam com diarreia, vômito e os médicos falam que pode ser por causa da água”, diz Jaqueline. “Hoje, eu tenho um filtro de água que ligo na torneira, mas já tive que ir muitas vezes para a emergência tomar soro por causa da água”, conta Cláudia.

Para Rafael Barros, a questão é que os investimentos públicos não acompanharam o crescimento da região no extremo Sul. “A Restinga cresceu muito nos últimos 10 anos, com loteamentos e com ocupações, mas os investimentos públicos não. Então, as pessoas não estão sendo atendidas”.

A situação relatada pelas lideranças da Restinga é semelhante à enfrentada na zona leste. Em bairros como Morro da Cruz e Lomba do Pinheiro, várias regiões vivem a escassez de água. Representante do Comitê de Combate à Fome e ao Vírus da Lomba do Pinheiro, Isabel Adriana Klein diz que a situação é “frequente”, especialmente para quem não possui caixa d’água. “Agora, por exemplo, estamos sem água. E esse problema não é um problema novo, não só na Lomba, mas nas partes altas da cidade, isso ocorre em todo o verão, já é de praxe. E a gente sabe que é por falta de investimento, de fazer uma política séria que resolva o problema”.

O desgaste pela falta de água afeta a rotina dos moradores. Em muitos dias, a água retorna durante a madrugada e os moradores precisam armazenar o líquido ou realizar as tarefas domésticas e de higiene no momento em que deveriam estar dormindo. “Sempre nos dizem que o problema será resolvido no futuro. Mas parece que é um futuro muito distante, porque continuamos sempre com esse problema”.


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