Geral
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20 de agosto de 2021
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18:16

Para aprovar Projeto Arado, Melo omite que obra do DMAE sairá mesmo sem ‘bairro planejado’

Por
Luciano Velleda
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O novo Sistema de Abastecimento de Água Ponta do Arado deve beneficiar 16 bairros das zonas Sul, Extremo-Sul e Leste. Foto: Luiza Castro/Sul21
O novo Sistema de Abastecimento de Água Ponta do Arado deve beneficiar 16 bairros das zonas Sul, Extremo-Sul e Leste. Foto: Luiza Castro/Sul21

“O empreendimento Arado vindo, vai trazer muitos benefícios, inclusive essa estação de tratamento de água pra região, que é muito carente, e é muita ampla a região e os bairros atingidos, todo o Extremo-Sul, mais Restinga e Lomba do Pinheiro. Então vindo o empreendimento, vem a estação de tratamento, que é essencial e vai acabar com a falta d’água que é muito frequente na região.”

A fala é de Elias Antônio Nicoli, morador de Belém Novo, e consta no vídeo promocional apresentado na audiência pública por Rodolfo Fork, arquiteto do empreendimento que pretende construir um “bairro planejado” com 1.650 casas na área de 426 hectares da antiga Fazenda do Arado, na Zona Sul de Porto Alegre.

O vídeo apresenta falas de outros moradores reclamando da falta d’água na região e, em seguida, Fork diz que o empreendimento “criou” uma área que será doada para a construção da nova Estação de Tratamento de Águas (ETA), que beneficiará mais de 400 mil famílias da região.

A audiência, realizada nos dias 12 e 13 de agosto, debateu o polêmica projeto que, para sair do papel, quer alterar o regime urbanístico previsto no Plano Diretor da região de Belém Novo, como mostra o recente especial Que Porto é esse, do Sul21. A disputa acontece com força desde 2015, quando um projeto de lei proposto pela Prefeitura efetivou a mudança para adequar a área ao empreendimento – dois anos depois, a Justiça declarou ilegal o projeto aprovado na Câmara.

A construção da Estação de Tratamento de Água (ETA) Ponta do Arado tem sido enfatizada pelo empreendedor e pela própria Prefeitura de Porto Alegre como uma grande vantagem que o negócio trará para os bairros do Extremo-Sul da Capital que sofrem com a falta d’água.

O detalhe não enfatizado pelo governo do prefeito Sebastião Melo (MDB) e tampouco pelo empreendedor do “bairro planejado”, é que a ETA Ponta do Arado será realizada mesmo que o empreendimento não se concretize. Quem afirma é o próprio Departamento Municipal de Águas e Esgotos (DMAE) de Porto Alegre.

“O DMAE informa que mesmo que o empreendimento na fazenda do Arado não saia, a Estação de Tratamento de Água (Eta) Ponta do Arado será construída. Hoje, a doação do espaço encontra-se como contrapartida do empreendimento. Caso o projeto não seja executado, o DMAE custeará pela área utilizada”, informa o órgão.

Na audiência pública, coube à arquiteta Gisele Vargas, funcionária da Diretoria de Planejamento Urbano da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), compartilhar a apresentação do projeto com Rodolfo Fork, arquiteto do empreendimento.

Em determinado momento, Gisele citou as contrapartidas do empreendedor em função dos benefícios pela alteração do regime urbanístico: a realização de projeto urbanístico na orla de Belém Novo; a qualificação de equipamentos públicos comunitários e a “doação antecipada do lote destinado à estação de tratamento”.

A arquiteta da Prefeitura, porém, não fez qualquer menção à construção da ETA independente da realização do empreendimento imobiliário, como afirma o DMAE.

Em maio deste ano, um folheto apócrifo intitulado “A verdade sobre a fazendo do Arado – a comunidade em primeiro lugar” (confira no final da reportagem), foi distribuído nas caixas de correspondência dos moradores de Belém Novo. Entre as informações apresentadas como supostos benefícios e melhorias que o empreendimento trará para a região, também consta a “viabilização da estação de tratamento de água, gerando abastecimento de água para 300 mil pessoas”.

Segundo o DMAE, a área de 9,4 hectares prevista para ser doada para a construção da ETA Ponta do Arado foi declarada de utilidade pública pelo decreto número 18.732 de junho de 2014, recentemente renovado pelo decreto de número 21.036 de maio deste ano. O DMAE diz ainda que a realização da construção da ETA já possui licenciamento ambiental amparado pelo número 0010/2021, emitido pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).

O DMAE explica que se o projeto sair do papel, a área será doada ao órgão como contrapartida, e se o empreendimento imobiliário não acontecer, o DMAE efetivará a compra da área, avaliada atualmente em R$ 4,5 milhões – menos de 2% da obra da ETA Ponta do Arado e de todo o sistema de abastecimento planejado para região, estimado em cerca de R$ 240 milhões.

“O novo Sistema de Abastecimento de Água (SAS) Ponta do Arado irá beneficiar 16 bairros das zonas Sul, Extremo-Sul e Leste, incluindo a Lomba do Pinheiro, que sofre com desabastecimento, principalmente no verão, quando há alto consumo. O Departamento estuda desde 2012 ampliar a produção de água para suprir o déficit de abastecimento da região. A construção do novo Sistema de Abastecimento de Água na região conhecida como ‘Fazenda do Arado’, irá acontecer mesmo que o empreendimento urbanístico não seja viabilizado”, enfatiza o DMAE.

Apesar das afirmações do órgão, na audiência pública o prefeito Melo, ao citar os problemas de abastecimento da região, destacou a importância que a ETA Ponta do Arado terá e deu a entender que a melhoria será consequência da aprovação do empreendimento imobiliário.

“É um terreno que está nessa área e tem a destinação pro DMAE pra finalidade dessa obra, que vai qualificar o abastecimento de água extremamente importante pra cidade”, disse, sem explicar que a obra já está garantida pelo DMAE.

O modo como a Prefeitura trata o tema da nova ETA para obter apoio dos moradores da região ao empreendimento tem sido criticado por moradores de Belém Novo contrários aos projeto.

“É mais uma mentira que está sendo espalhada por aí”, afirma Mateus Gus, integrante do coletivo Ambiente Crítico. Para ele, se o DMAE tiver que concretizar a compra da área, o valor do terreno será irrisório em comparação com o investimento total no novo sistema de abastecimento. “É uma total mentira, não existe um avanço na ETA por causa do empreendimento”, sentencia.

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