Sergio Araujo (*)
“Lá vem o Brasil descendo a ladeira…”
Moraes Moreira (in memoriam)
É inacreditável que em meio a um esforço mundial de combate a pandemia provocada pelo novo coronavírus, que já contaminou dois milhões de pessoas (128 mil no Brasil) e matou outras 128 mil (1.555 no Brasil), tenhamos que lidar com os maus exemplos gerados pelo presidente brasileiro, que classifica a epidemia como uma gripezinha e incentiva a população a deixar o isolamento, e pelos seus ensandecidos seguidores, que promovem carreatas e passeatas, incluindo desfile com caixões, desdenhando da gravidade da Covid-19.
Na contramão da maioria dos presidentes do planeta, incluindo o seu ídolo capitalista, Donald Trump, que se renderam às recomendações científicas e à realidade dos fatos e dos números, Jair Bolsonaro preferiu integral o restrito rol de presidentes negacionistas da pandemia que, curiosamente, possuem perfil ditatorial, respectivamente, os presidentes da Nicarágua, Daniel Ortega, do Turquemenistão, Gurbanguly Berdymukhamedov e do Belarus (outrora Bielo-Rússia), Aleksandr Lukashenko.
Em meio a tudo isto, o mundo ainda tem o desprazer de observar, escandalizado, Jair Bolsonaro fritando publicamente seu ministro da Saúde; desmerecendo orientação técnica da Organização Mundial da Saúde e de especialistas em saúde pública; condenando iniciativas de prevenção tomadas por governadores e prefeitos; adotando discurso ideológico para tudo; depreciando a importância social do papel da imprensa; e, acima de tudo, sobrepondo o discurso de candidato ao de gestor dos destinos da nação.
Como se não bastasse, para espanto generalizado, o presidente brasileiro não consegue sequer frear o ímpeto dos filhos, que de forma tutelada, agem como se tivessem a representação paterna para se imiscuir nos assuntos afetos ao Palácio do Planalto. No episódio mais recente, em meio a pandemia do novo vírus, Eduardo Bolsonaro resolveu aplicar o patrolamento ideológico do pai contra o governo chinês, responsabilizando-o pela proliferação do Covid-19.
Ocorre que a China, além de ser um dos principais parceiros comerciais do Brasil, é também o maior fornecedor mundial de equipamentos e insumos médicos, dentre eles respiradores e máscaras cirúrgicas, imprescindíveis para o combate do novo coronavírus. E para agravar ainda mais a situação, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araujo, entrou em cena endossando o posicionamento de Eduardo Bolsonaro.
Assim, em meio a solavancos, trombadas e despropósitos, os brasileiros observam, enclausurados, atônitos e incrédulos, o desenrolar desse circo dos horrores em que se transformou o governo Bolsonaro & Filhos e Cia. Mas quem sabe esse tempo adicional de isolamento forçado não sirva para que os adoradores do falso mito caiam na real, nem que seja a custa das milhares de vítimas da Covid-19, e se convençam de que embarcaram numa canoa furada.
Até que isso aconteça, fica cada vez fica mais transparente que a nação está sendo comandada pelos militares palacianos e pelos banqueiros e empresários oportunistas, que usam o ex-capitão e ignoto deputado como procurador de seus interesses e das suas pretensões. Embora não reconheça essa subserviência, o fato de ter que repetir constantemente que ele é o presidente, que ele é que tem a caneta e que é ele quem manda, torna Bolsonaro uma sombra do personagem irrelevante e aventureiro em que ele se transformou e que a cada dia que passa se aproxima mais da beira do precipício que ele próprio cavou. A dúvida que fica é se a inevitável queda será livre ou atabalhoada, como é do seu estilo.
(*) Jornalista
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