Opinião
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22 de fevereiro de 2024
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20:37

Daniel Alves foi condenado! E agora? (por Clarananda da Silva Barreira)

Mulheres defendem união e pedem fim da cultura do estupro em ato em Porto Alegre, em junho de 2016. Foto: Joana Berwanger/Sul21
Mulheres defendem união e pedem fim da cultura do estupro em ato em Porto Alegre, em junho de 2016. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Clarananda da Silva Barreira (*)

Daniel Alves foi condenado. Esta, enfim, é a manchete. Não tem nenhum “porém” a ser acrescentado. Você pode questionar e até minimizar o fato, afirmando que ele ainda tem direito a recorrer, ou que a pena pareceu pequena, ou até mesmo que o poder aquisitivo fez com que fosse diminuída a pena. Mas nada apagará a condenação em si que acaba por ser nosso grito de justiça.

Para além da condenação de prisão em regime fechado por 4 anos e 6 meses, é importante observarmos as demais punições. Após cumprida a prisão, ele ainda terá a sua liberdade vigiada por cinco anos, e a pena por “inabilitação especial por exercício de emprego”, que significa que ele está impedido de exercer qualquer cargo público, profissão ou comércio relacionado a pessoas com menos de 18 anos de idade, por também cinco anos.

Nesse sentido, destaco essa última punição como educativa, a importância que tem um jogador de futebol de tal relevância ter, além da pena de prisão, uma punição que discute a figura pública que ele é, ele não pode ser cultuado como um exemplo. O futebol no Brasil e no mundo é um esporte de referência para as crianças, adolescentes e jovens que olham para seus jogadores e jogadoras como exemplos do que querem ser um dia. Essa última punição afirma a importância de rompermos com o ciclo da cultura do estupro.

Por fim, quero ressaltar a relevância que esse caso tem para o Brasil. Em dezembro de 2023 entrou em vigor o protocolo e o selo “Não é Não”. A Lei nº 14.786/23 foi inspirada na lei espanhola que contribuiu para que Daniel Alves fosse condenado. Vimos na prática como essa lei pode auxiliar para que: 1) a vítima seja acolhida imediatamente; 2) a vítima não passe por todo o processo sozinha e seja assim desacreditada; 3) as provas sejam preservadas, e aqui não se trata somente do protocolo para pronta realização do exame de corpo de delito, mas ao seguir o protocolo foram proporcionadas condições decisivas para que os relatos das testemunhas e outros elementos fossem levados em consideração durante o julgamento.

A Lei nº 14.786/23 quando promulgada, não foi divulgada como deveria, as matérias que saíram sobre ela se referiam apenas aos que não queriam que ela entrasse em vigor. É necessário apresentarmos a todo o conjunto da sociedade a lei do protocolo “Não é não”! Precisamos não apenas falar dessa lei, mas principalmente aplicá-la. E para ser aplicada, ela precisará de formação para as nossas polícias realizarem o atendimento adequado às vítimas, e de formação para os próprios estabelecimentos que aderirem ao protocolo. Para essa lei ser aplicada na prática, precisamos aprofundar o entendimento de que a sociedade tem que ser parte da solução e que a cultura do estupro precisa ser rompida no seu ciclo. Assim, as mulheres poderão viver uma vida sem violência.

(*) Socióloga, Mestra em Gênero de Desenvolvimento e doutoranda em Sociologia na UFRGS

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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