Opinião
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7 de outubro de 2022
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21:28

O tsunami neonazista no Brasil (por Milton Pomar)

Integralistas fazem a saudação do movimento. Plínio Salgado é o terceiro da esquerda para direita (Reprodução)
Integralistas fazem a saudação do movimento. Plínio Salgado é o terceiro da esquerda para direita (Reprodução)

Milton Pomar (*)

Completou 90 anos, no dia 7 de outubro, o “Manifesto de Outubro”, com o qual surgiu, em 1932, a Ação Integralista Brasileira (AIB), a primeira organização política no Brasil assumidamente de extrema-direita, liderada por Plínio Salgado. Ela espelhou-se na movimentação dos nazistas na Alemanha naquele ano, que haviam saltado, nas eleições de junho de 1932, para a condição de maior partido no Parlamento (Reichstag). 

Dado o risco do Brasil ser devastado por um tsunami neonazista, como ocorreu na Alemanha a partir de 1933, é importante pesquisarmos sobre o movimento de massas ideologicamente de extrema-direita no Brasil conhecido como “Integralismo”. Há bons livros a respeito: o recém-lançado “O fascismo em camisas verdes: Do integralismo ao neointegralismo” (Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, Rio de Janeiro, FGV Editora, 2020); “Integralismo – ideologia e organização de um partido de massas no Brasil (1932-1937)”, de Rosa Maria Feiteiro Cavalari (Bauru-SP, Edusc, 1999); e o já clássico “Integralismo – o fascismo brasileiro na década de 30” (Hélgio Trindade, São Paulo, Difel, 1979). 

Estudar o movimento integralista brasileiro leva inevitavelmente à pesquisa também sobre a ascensão do Partido Nazista – e do seu líder maior – na Alemanha naquele período, realizada combinando a propaganda ideológica de massas com violência física, fraude e mentira. Para os nazistas, era pouco a obtenção da maioria do Parlamento, em 1932, e a nomeação de Hitler, em janeiro de 1933, como chanceler da Alemanha. Criaram então um fato político de grandes proporções, para justificar suas ações seguintes: o incêndio do Reichstag, em 27 de fevereiro, que serviu para prenderem socialistas, social-democratas, anarquistas e comunistas, no recém-inaugurado campo de concentração de Dachau, próximo a Munique. Dessa forma, livraram-se de milhares de opositores políticos, apenas dois meses após a chegada de Hitler ao poder. 

Começou pelo Reichstag e por Dachau o tsunami nazista na Alemanha, no início de 1933, e avançou pelo Parlamento (com a aprovação em maio, do Ato de Autorização, que transmitia as funções legislativas para o executivo, leia-se Hitler), e pelos partidos políticos, com a proibição, em junho, do partido social-democrata (SPD), e a dissolução de outros partidos. Em 14 de julho, o golpe fatal: por decreto-lei, o país passou a ser “Estado de Partido Único”, e o Partido Nazista se tornou o único partido político permitido. Em outubro, a Alemanha saiu da Sociedade das Nações, antecessora da Organização das Nações Unidas. Evidentemente, o Judiciário alemão foi também aniquilado, ficando a serviço dos nazistas, como se comprovou nos anos seguintes. 

Devastados os partidos políticos e o legislativo em 1933, faltavam somente os militares para o controle absoluto do Estado alemão, golpe concretizado em agosto de 1934, quando Hitler finalmente assumiu a condição de líder máximo (“Fuhrer”), com direito inclusive a juramento de fidelidade a ele por parte dos integrantes das Forças Armadas. A partir daí, com a cumplicidade do grande empresariado e de parte do povo alemão e dos cientistas, os nazistas desenvolveram poderosa indústria bélica, decisiva para seus planos de dominação mundial (o “III Reich”). Em 1939-1945, os nazistas mostraram ao mundo a que vieram. 

A ascensão dos nazistas na Alemanha e dos integralistas no Brasil, nos anos 1930, teve algumas semelhanças e uma diferença fundamental – aqui o movimento foi liquidado no início, em 1937, por Getúlio Vargas, o que obrigou seu líder Plínio Salgado a se exilar. (Quando voltou para o Brasil, foi candidato a presidente, em 1955, obtendo menos de 10% dos votos, e depois, com a ditadura de 1964, foi eleito e reeleito deputado federal pela Arena.) 

Liquidado o movimento, mas não a ideologia de extrema-direita, como atestam os resultados das eleições de 2 de outubro de 2022, para os legislativos estaduais e o federal: 90 anos depois, o integralismo está com a força toda no Brasil. Se reelegerem seu líder, se sentirão liberados para fazer tudo o que ainda não puderam, a começar pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e o próprio Parlamento. Quem não era adulto durante a ditadura militar (1964-1985) no Brasil não pode imaginar o que será esse tsunami neonazista. 

(*) Geógrafo, mestre em Políticas Públicas.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


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