Política
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9 de março de 2022
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14:27

Nagelstein é condenado por declarações racistas sobre a bancada negra da Câmara

Por
Luís Gomes
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Foto: Débora Ercolani/CMPA
Foto: Débora Ercolani/CMPA

O ex-vereador de Porto Alegre e atual presidente do Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores Municipais de Canoas (Canoasprev), Valter Nagelstein, foi condenado em primeira instância a dois anos em regime de reclusão pelo crime de racismo.

A condenação é referente a declarações dadas por Nagelstein, ainda enquanto vereador de Porto Alegre, logo após a apuração dos resultados das eleições de 2020, em que cinco vereadores negros foram eleitos por partidos de esquerda.

Em mensagem de áudio que circulou nas redes sociais em novembro de 2020, Nagelstein afirma que os vereadores eleitos pelo PSOL para a Câmara Municipal são pessoas “sem nenhuma tradição política, sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal” e ainda “muitos deles jovens, negros, quer dizer, o eco àquele discurso que o PSOL foi incutindo na cabeça das pessoas”. Nagelstein também atribui o resultado da eleição “à ocupação que a esquerda promoveu nos últimos 40 anos, da universidade, das escolas, do jornalismo e da cultura”.

Em 15 de abril de 2021, o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) denunciou Nagelstein por praticar, induzir e incitar discriminação e preconceito de raça, cor e etnia.

Em sua decisão, assinada em 4 de março, o juiz Sidinei Jose Brzuska, da 3ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, considerou que a “enumeração de negros em um contexto de expressões pejorativas” incorre em conduta tipificada como preconceito de raça ou de cor e que, portanto, merecia sanções penal.

A defesa de Nagelstein argumentou que a mensagem tinha o sentido de ressaltar a inexperiência dos eleitos, e não discriminar os vereadores pela sua raça. O argumento não foi aceito pelo juiz.

Brzuska reconheceu em sua decisão que a “reflexão” de Nagelstein foi feita em um contexto de análise do resultado eleitoral. Contudo, considerou que a conduta se tornou penalmente reprovável ao disparar uma fala que agrediu a população negra na adjetivação pejorativa dos vereadores eleitos.

“Veja-se que não existem quaisquer elementos idôneos, ou seja, que não estejam embebidos em racismo estrutural e em ideias eugênicas, que permitam que a expressão ‘negros’ possam demonstrar inexperiência”, disse Brzuska. “Logo, ao que se percebe, o qualificativo ‘negro’ empregado não se prestou à identificação da etnia dos vereadores eleitos – o que seria até mesmo desnecessário -, mas sim, integrou o contexto de uma ‘reflexão’ degradante a respeito dos indivíduos atingidos, tendo em vista as circunstâncias em que foi inserido”.

Para o juiz, o “pensamento ideológico do réu excedeu o limite do debate político” e também não é possível considerar como uma declaração restrita ao foro privado, pois foi feita em um grupo com cerca de 35 pessoas. “Em se tratando de uma pessoa pública, bastante conhecida nesta seara, quando lança uma voz dessa magnitude dentro de um grupo de pessoas, é razoável que tome essa proporção, tanto que tomou”, afirmou o juiz.

Apesar da condenação, Brzuska determinou que a pena poderá ser substituída por outras alternativas: prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária no valor de 20 salários mínimos. Além disso, ele também foi condenado a pagar 20 dias-multa, o que é convertido a um salário mínimo equivalente à época em que o episódio ocorreu.

Em nota à imprensa divulgada na tarde desta quarta, o ex-vereador anunciou que irá recorrer da decisão. Ele classifica o processo como absurdo e diz que a sentença é um exemplo do que tem denunciado, de que o judiciário foi tomado “por ideologia”.

“Sou neto de uma negra e de um judeu fugido da guerra, circunstâncias que jamais omiti e que trago como partes de mim, com orgulho, como mostra um poema que fiz aos meus avós em 2009 – e que foi publicado na minhas redes sociais então, e trazido a esse absurdo processo. Recebo a sentença com profunda tristeza, porque mostra exatamente o que tenho denunciado, o judiciário e a educação tomados por ideologia. Isto sim põe a democracia em risco, porque criminalizam a nossa forma de pensar e impõem aos nossos filhos o que é certo ou errado segundo a visão de militantes. Recorrerei junto com meus advogados e sigo acreditando na justiça imparcial, aquela que aprendi a ver o meu pai, como magistrado, perseguir e aplicar”, diz a nota de Nagelstein.


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