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14 de julho de 2020
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21:49

Projeto prevê construção de 11 mil banheiros para melhorar moradias e enfrentar coronavírus

Por
Sul 21
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Condições de moradia influenciam diretamente na saúde da população. “O médico tem remédio pra doença, mas quem tem remédio pra casa, é o arquiteto”, diz presidente do CAU-RS. Foto: Léu Britto/DiCampana/Foto Coletivo

Luciano Velleda

Não é de hoje que arquitetos e urbanistas se referem à Lei de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social (ATHIS) como “o SUS da habitação”. Em vigor desde 2008, a lei permite às famílias de baixa renda auxílio público e gratuito para moradia própria ou projeto e construção de habitações de interesse social. A lei estipula o acompanhamento e a execução da obra por arquitetos, urbanistas e engenheiros, com a assistência técnica podendo ser oferecida diretamente às famílias ou por meio de cooperativas e associações de moradores.

É com isso em mente que, desde 2015, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) investe 2% de sua renda para divulgar a lei e propor ações e políticas públicas. Assim nasceu o projeto “Casa Saudável”, com o objetivo de incluir um arquiteto junto às equipes de atenção básica de saúde do SUS.

Tiago Holzmann da Silva, presidente do CAU/RS, destaca que várias doenças podem ser evitadas se houver atenção com determinados aspectos da moradia. “O médico tem remédio pra doença, mas, quem tem remédio pra casa é o arquiteto.” Como exemplo de fatores habitacionais que têm impacto positivo na saúde, ele cita uma melhor iluminação e ventilação da casa, além de um bom banheiro.

O CAU/RS estava planejando a implementação do projeto “Casa Saudável”, quando chegou a pandemia do novo coronavírus. A urgência causada pela mais grave crise de saúde dos últimos 100 anos fez o conselho adaptar uma parte do projeto e criar outro: o “Nenhuma Casa sem Banheiro”. A razão é simples e prática. Se para enfrentar o coronavírus a principal orientação é ficar em casa e lavar bem as mãos, como famílias de baixa renda podem ter esse cuidado com a higiene sem condições adequadas?

“O que já era grave antes da pandemia, agora ficou gravíssimo”, afirma Tiago Holzmann. Com a constatação da urgência do momento, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) decidiu investir R$ 540 mil para dar o passo inicial no projeto, “romper a inércia”, como define o presidente do órgão, consciente da morosidade que costuma haver nas administrações públicas.

A meta é construir 11 mil banheiros até 2021. Os valores variam, mas, em média, o custo de um banheiro fica em torno de R$ 1 mil pelo projeto e mais R$ 7 mil ou R$ 8 mil pela obra. “Cada caso é um caso, cada família tem sua peculiaridade. Há casos que serão mais baratos que outros”, explica o presidente do CAU/RS, animado com apoios que o projeto tem recebido de municípios e da iniciativa privada. “Cada recurso que a gente receber, é um banheiro que ficará pronto.”

Ainda que não tenha todo o recurso necessário para construir os 11 mil banheiros, Tiago Holzmann da Silva acredita que a urgência impõe começar logo, com os valores disponíveis, e ao mesmo tempo ir atrás de novas fontes. Até o momento, diz ele, mais de 10 municípios gaúchos mostraram interesse no projeto. O mais adiantado é Santa Cruz do Sul, onde 30 famílias receberão banheiros novos em breve. Os detalhes do convênio e contratação de arquitetos estão em fase final e as obras devem começar daqui um mês. A previsão são duas semanas de trabalho — uma para o projeto e outra para executar a obra. O projeto de cada banheiro inclui também a pia da cozinha, tanque, caixa d’água e destino do esgoto. Para agilizar as obras, o conselho irá trabalhar por meio de convênios com entidades e contratação de arquitetos locais.

Holzmann não tem dúvida da importância da união da arquitetura com a saúde. Ele enfatiza que a moradia é um direito constitucional, mas, ao contrário da educação, com as escolas públicas, e da própria saúde, com o SUS, a habitação nunca teve um órgão definido para implementar políticas públicas e costuma ficar à mercê de programas eventuais de governos. Isso até a criação da Lei de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social (ATHIS).

“Muitas vezes, é explícito o problema da casa na saúde da família. A presença do arquiteto nas equipes de saúde pode, inclusive, poupar dinheiro da saúde”, explica o presidente do CAU/RS. “É preciso romper a inércia”, ele repete.   

O exemplo de Santa Rosa

Na cidade localizada no noroeste do Estado, a implementação do projeto “Casa Saudável” foi firmada entre a Associação Profissional dos Engenheiros e Arquitetos de Santa Rosa (APEA-SR) e a Prefeitura no final de 2019. Entretanto, em março deste ano, durante a etapa de contratação dos arquitetos, o início da pandemia no Rio Grande do Sul obrigou a paralisação temporária do projeto. O trabalho está sendo retomado agora, novamente a partir da contratação dos profissionais que trabalharão no escritório encarregado da Lei de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social (ATHIS). “Esses profissionais farão os projetos de melhoria das casas que serão beneficiadas em Santa Rosa”, explica Giofranco Saggin, presidente da APEA-SR.

Saggin diz que um dos principais desafios do projeto é levá-lo ao conhecimento dos gestores públicos e fazer com que o governo local entenda e se torne parceiro da execução. Isso porque ao escritório cabe a realização dos projetos, enquanto a contrapartida da Prefeitura é realizá-lo. “Às vezes, fazer esse entendimento com o poder público, não é uma tarefa muito fácil”, pondera, destacando que, em Santa Rosa, essa etapa já foi superada. “Aqui, a Prefeitura é bem alinhada com a questão da habitação.”

O presidente da Associação Profissional dos Engenheiros e Arquitetos de Santa Rosa enfatiza que grande parte da população não tem acesso ao básico para uma vida saudável. O problema habitacional faz com que haja muitas casas sem banheiro ou com banheiro inadequado, além da falta de esgoto e água potável. A melhoria da moradia, diz Saggin, traz benefícios à cidade toda, influenciando positivamente na qualidade de vida da comunidade. “Se tu tens uma casa saudável, o custo com a saúde pública também diminuiu, a cidade fica mais bonita.”

 


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