Opinião
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16 de novembro de 2021
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09:08

Coleta Seletiva e a COP26 (por Milton Pomar)

Cada brasileiro gera, em média, 1kg de resíduo por dia. Foto: Luiza Castro/Sul21
Cada brasileiro gera, em média, 1kg de resíduo por dia. Foto: Luiza Castro/Sul21

Milton Pomar (*)

Qual é a lógica de se continuar recolhendo lixo que não é lixo, gastando (muito) para jogar fora o que é aproveitável? Vereadores e vereadoras dos 5.570 municípios do Brasil não sabem do recolhimento de Lixo, Coleta Seletiva e Reciclagem – com raríssimas exceções. Continua-se gastando muito para jogar fora o que é aproveitável, aumentando assim a poluição em todos os municípios, com os fedorentos “lixões” e os caros aterros sanitários. 

Quando se sabe que 90% ou mais do que é recolhido como “lixo” pode ser aproveitado, se houver a separação dos resíduos antes, fica fácil imaginar quanto se desperdiça de dinheiro jogando fora tudo o que é recolhido. Do ponto de vista ambiental o prejuízo é de 100%, e o desperdício econômico com o que se deixa de reciclar ainda está por ser calculado.

Há interesses financeiros envolvidos, evidentemente, porque os valores pagos às empresas de recolhimento de lixo são significativos, e o tamanho e poder de muitas delas hoje são causa e efeito dessa situação absurda. Se você não acredita que haja tanto desperdício, pesquise no Orçamento do seu município quanto foi gasto com o recolhimento e destinação do lixo em 2020 e anos anteriores e quanto está previsto para 2021.

Quem cuida do “lixo” e da limpeza municipal normalmente é a Secretaria de Obras, e não a do Meio Ambiente – pasta que não costuma existir nas prefeituras dos 4.890 municípios com menos de 50 mil habitantes. E as obras em um município – principalmente o asfalto – costumam ajudar a reeleger prefeitos(as), não o Lixo ou a Coleta Seletiva.

Por isso, quando há Coleta Seletiva no município, ela não chega a cinco por cento (5%) do total recolhido. Existe em geral para o governo poder dizer que há essa prática ambientalmente correta no município. Mas não é significativa na maioria dos municípios, inclusive dos grandes. 

Essa realidade em 2021 é mais chocante porque a maioria da população brasileira horroriza-se (com razão) com a devastação ambiental na Amazônia, Pantanal, Cerrado, Semiárido, Mata Atlântica e Pampa, e comenta sobre “créditos de carbono” e a poluição causada por combustíveis fósseis em outros países – temas em alta com a COP26 –, mas não se importa com a prefeitura da sua cidade continuar desperdiçando dinheiro público para jogar lixo que não é lixo no lixo. 

Coleta Seletiva tem que ser obrigatória por lei federal, uma Lei de Responsabilidade Ambiental que estipule metas, prazos e penas – até 2026, metade do que é recolhido como lixo hoje terá que ser Coleta Seletiva, e no máximo até 2030, pelo menos 80%. Quem não cumprir essa lei e quem não fiscalizar a sua aplicação ficará inelegível. Tipo cinto de segurança: só virou hábito nacional depois que começou a ser cobrada multa pela não-utilização.

Coleta Seletiva só acontece se o prefeito ou prefeita decidir fazer, e colocar como meta para as secretarias da Educação e Saúde, por razões óbvias: existem em 100% dos municípios, trata-se de saúde pública, e são as crianças que conseguirão mudar hábitos em casa, que é onde é feita a separação dos resíduos. Para motivar muita gente a separar resíduos, a propaganda da Coleta Seletiva precisa focar no dinheiro que é desperdiçado com recolhimento de lixo que não é lixo, e que poderá ser melhor utilizado no que falta em sua rua. Coleta Seletiva é COP26 na sua cidade.

(*) Geógrafo e mestre em Políticas Públicas

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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