Política
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18 de setembro de 2023
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19:49

Melo promete destinar prédio no Centro à habitação social, mas exige desocupação

Por
Sul 21
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MNLM se reúne com o prefeito Sebastião Melo para discutir futuro da Ocupação Rexistência. Foto: Joana Berwanger/Sul21
MNLM se reúne com o prefeito Sebastião Melo para discutir futuro da Ocupação Rexistência. Foto: Joana Berwanger/Sul21

No final da tarde desta segunda-feira (18), representantes do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) que organizam ocupação ReXistência POA foram recebidos pelo prefeito Sebastião Melo (MDB). A reunião contou com a presença do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) e de parlamentares, como a deputada estadual Laura Sito (PT), que foi agredida pela Guarda Municipal durante uma visita ao prédio ocupado no último sábado (16), junto a apoiadores que pretendiam entregar marmitas de almoço aos integrantes da ocupação.

Na reunião, Melo disse que, para que houvesse qualquer negociação, seria necessário realizar a reintegração de posse e se referiu à ocupação como “invasão”. Segundo Cristiano Schumacher, dirigente do MNLM, foi estabelecido um acordo com a Prefeitura de que o imóvel seja destinado para a habitação de interesse social, com o estabelecimento de um grupo de trabalho que se reunirá na quinta-feira (21) com o movimento. Um edital deve ser feito para que entidades enviem propostas para a utilização do prédio.

 

Foto: Joana Berwanger/Sul21

De acordo com a coordenadora do MNLM-RS, Ceniriani Vargas da Silva, já foram realizadas compras de imóveis para habitação via cooperativas de movimentos sociais, com experiência por meio do programa Minha Casa, Minha Vida. Porém, na reunião, o prefeito não concordou com a compra pelo movimento e optou pelo edital público.

Leia mais: Guarda Municipal agride deputada e Melo desiste de vender prédio ocupado por movimento social

O secretário municipal de Habitação e Regularização Fundiária, André Machado, que iniciou as negociações com os manifestantes, ficou responsável por fazer contato com o governo federal. “A gente sempre confiou no bom senso de parte a parte e temos certeza que, daqui para frente, vamos construir junto com a participação popular em Porto Alegre um encaminhamento para esse processo. Que será o melhor para a cidade, mas sobretudo, para famílias que ainda aguardam o atendimento habitacional”, observou o secretário.

 

Foto: Joana Berwanger/Sul21

Durante a tarde, integrantes de movimentos sociais realizaram um ato em frente à ocupação reivindicando o direito à moradia. Ceniriani explica que a ocupação do prédio também tem o objetivo de chamar atenção para as transformações promovidas pelo governo Melo no centro da Capital e que, diz ela, visam favorecer a especulação imobiliária. A liderança lembra que o edifício foi fechado em 2020, no começo da pandemia do novo coronavírus. Na ocasião, houve a perspectiva de o imóvel ser reformado e reaberto, o que acabou não ocorrendo, terminando por ser incluído na lista de 92 imóveis a serem alienados pela Prefeitura.

 

Foto: Joana Berwanger/Sul21

Originalmente pertencente à Caixa Econômica, o prédio passou a funcionar como centro cultural em 1997 e, após mobilização da comunidade artística, foi comprado pela Prefeitura no final dos anos 1990. O local passou a sediar entidades de diversos segmentos do setor cultural e suas salas se tornaram um espaço de acesso para ensaios e montagem de espetáculos teatrais, de dança e de música. Em 2004, a Prefeitura firmou um Termo de Cessão de Uso com a Associação do Centro Cultural Cia de Arte, que passou a ocupar oficialmente o edifício.

Ex-presidente da Cia de Arte, o ator e produtor cultural Fábio Cunha disse ao Sul21, em maio de 2022, que o espaço sempre foi muito vibrante e importante para a cidade do ponto de vista cultural, mas que encontrava há anos dificuldade para sustentação financeira. Pelo termo de cessão de uso, a Prefeitura cedia o espaço e pagava a luz, mas a manutenção era de responsabilidade da associação.

Fábio contou que assumiu a presidência da entidade em dezembro de 2019, com o objetivo justamente de tentar reorganizar o espaço e resgatar uma relação com a Prefeitura. Contudo, em março de 2020 veio a pandemia, o que dificultou a ideia do resgate do prédio, que acabou fechado. Sem sucesso nas negociações com a Prefeitura para manutenção do uso, a Cia de Arte acabou entregando formalmente as chaves do imóvel ao poder público em fevereiro de 2021.

Na ocasião, a Secretaria Municipal de Administração e Patrimônio (Smap) argumentou que o prédio estava desocupado após ter sido retomado judicialmente em razão de “ter sido desvirtuada a finalidade do termo de permissão de uso, que era não oneroso e impedia a utilização do bem próprio do município para fins comerciais”.

 

Prédio está localizado na Rua dos Andradas. Foto: Joana Berwanger/Sul21

“O imóvel foi recebido da Cia de Arte em alto estágio de depreciação, com os elevadores estragados, problemas de vazamentos e infiltrações, ambos fatores que danificaram a estrutura, com infestação interna de pombos e proliferação de zoonoses, entre outros problemas”, afirmou a nota da Smap.

Segundo Fábio, um dos fatores que levou a Prefeitura a considerar que o espaço estava sendo usado irregularmente foi a exploração comercial de algumas salas. Por exemplo, por uma cafeteria. “Não poderia ter uma cafeteria, mas nós tínhamos lá na Cia de Arte um restaurante, que era o que mantinha financeiramente. Agora, com o novo marco regulatório, poderia se regularizar essas relações do uso do espaço”, comentou.

Ele reconheceu que ocorreram irregularidades em relação ao que era autorizado no Termo de Cessão de Uso, mas avaliou a Prefeitura não teve o interesse em formar parceiras com as entidades que estavam no local para regularizar a situação, pois o foco da gestão estaria nos grandes grupos do setor.

“O que eles fizeram no Araújo Viana? Passaram para produtora, que resgata o prédio, que recebe uma verba do município, uma estrutura. Ela pode comercializar lá dentro bebida, pode comercializar alimentos. Lá, para uma entidade como a Opus e o Opinião, se tem uma compreensão e uma flexibilização para repassar. Agora, por outro lado, para o produtor cultural, o trabalhador, a pequena produtora que não vai ter o espaço próprio, me parece que há resistência de compreensão desse governo. O lado empresarial, o lado do grande, eles até dão um jeito”, disse.


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