Geral
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5 de agosto de 2021
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18:13

Jovem kaingang de 14 anos é morta e tem o corpo dilacerado na Terra Indígena do Guarita

Por
Marco Weissheimer
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Área da Terra Indígena Guarita é tensionada por atividades econômicas e presença de não indígenas. Foto: Ministério Público do RS
Área da Terra Indígena Guarita é tensionada por atividades econômicas e presença de não indígenas. Foto: Ministério Público do RS

O corpo de Daiane Griá Sales, jovem indígena kaingang, de 14 anos, foi encontrado, na tarde de quarta-feira (4), no Setor Estiva, da Terra Indígena do Guarita, no município de Redentora, localizada na região noroeste do Rio Grande do Sul. Moradora do Setor Bananeiras da Terra Indígena do Guarita, Daiane foi encontrada em uma lavoura próxima a um mato, nua, e com as partes do corpo da cintura para baixo arrancadas e dilaceradas, com pedaços ao lado dela.

A Polícia Civil da região está investigando o caso. O delegado Vilmar Alaídes Schaefer disse ao site Portela Online que não descarta nenhuma hipótese, incluindo a da possível ocorrência de violência sexual, seguida de morte e mutilação do corpo. Há relatos de outros casos de ataques contra mulheres indígenas que estariam acontecendo na região. Localizada em uma área de 23,4 mil hectares, a Terra Indígena do Guarita abriga cerca de 6 mil pessoas e é a maior terra indígena do Estado, abrangendo os municípios de Tenente Portela, Redentora e Herval Seco, no Noroeste gaúcho.

Uma fonte que trabalhou por muitos anos na região e que pediu para não ser identificada por razões de segurança disse ao Sul21 que crianças e jovens indígenas que vivem na região enfrentam uma realidade muito difícil, convivendo com casos de estupro, raptos, encarceramentos e outras situações de violência. Segundo ela, 90% da comunidade, de aproximadamente 6 mil pessoas, é muito sofrida e crianças, adolescentes e jovens não têm a proteção necessária diante dessa realidade. 

O aumento da presença de não índios dentro da comunidade seria outro fator que estaria agravando essa situação de insegurança. As famílias de Daiane e de outras meninas que teriam sofrido casos de abuso estariam amedrontadas. 

Ela também aponta uma grande omissão por parte das autoridades. Segundo ela, passou da hora de o Ministério Público, a Funai e a Polícia Federal enfrentarem essa situação.

A Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) divulgou uma nota denunciando o crime de barbárie cometido contra a jovem kaingang. A nota afirma:

“Temos visto dia após dia o assassinato de indígenas. Mas, parece que não é suficiente matar. O requinte de crueldade é o que dilacera nossa alma, assim como literalmente dilaceraram o jovem corpo de Daiane, de apenas 14 anos. Esquartejam corpos jovens, de mulheres, de povos. Entendemos que os conjuntos de violência cometida a nós, mulheres indígenas, desde a invasão do Brasil é uma fria tentativa de nos exterminar, com crimes hediondos que sangram nossa alma. A desumanidade exposta em corpos femininos indígenas precisa parar!”

A entidade assegura que não deixará esse crime passar impune e que as mulheres indígenas não serão silenciadas. E acrescenta: As violências praticadas por uma sociedade doente não podem continuar sendo banalizadas, naturalizadas, repleta de homens sem respeito e compostura humana, selvageria, repugnância e macabrismo. Quem comete uma atrocidade desta com mulheres filhas da terra, mata igualmente a si mesmo, mata também o Brasil.  Nossos corpos já não suportam mais ser dilacerados, tombado há 521 anos. Que o projeto esquartejador empunhado pela colonização, violenta todas nós, mulheres indígenas há mais de cinco séculos. Somos 448 mil Mulheres Indígenas no Brasil que o estrupo da colonização não conseguiu matar e não permitiremos que a pandemia da violência do ódio passe por cima de nós”.

Para Roberto Liebgott, coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi-Sul), a violência contra indígenas se intensifica na medida em que se proliferam os discursos de ódio e intolerância contra os povos em âmbito nacional. “Lamentavelmente, os jovens, especialmente meninas, têm sido vítimas preferenciais de homens perversos, assassinos e estupradores. Exige-se justiça e medidas de proteção aos territórios e aos direitos dos povos indígenas”.

O Cimi Sul, acrescenta Roberto, espera que a Funai e os órgãos de investigação Federal promovam ações no sentido de coibir as violências e responsabilizem os agressores e criminosos, bem como averiguem e identifiquem se os crimes estão vinculados com a intolerância e o racismo contra os povos indígenas.


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