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15 de agosto de 2017
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10:00

Os 40 anos da morte de Rodolfo Walsh

Por
Sul 21
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Os 40 anos da morte de Rodolfo Walsh
Os 40 anos da morte de Rodolfo Walsh

O jornalismo é livre ou é uma farsa.
O jornalista deve manipular a linguagem como um objeto e empunhá-la como um martelo.

Rodolfo Walsh

Relendo estas epígrafes nos indagamos que outro fim poderia esperar esse jornalista argentino senão o seu assassinato em 27 de março de 1977 em plena rua por sicários da ditadura cívico-militar da Argentina? Walsh é lembrado por sua luta contra o terrorismo de Estado e por seu pioneirismo em escrever histórias de acontecimentos reais como” Operação Massacre “ e “Quem Matou Rosendo”.

Especialmente conhecido como opositor da ditadura que governou a Argentina entre 1976 e 1983, integrou o grupo dos Montoneros. Não querendo sair do país e assistindo o massacre generalizado de seus companheiros passou a difundir uma série de “ Cartas Polêmicas “. Uma  delas foi  a famosa “ Carta aberta de um escritor à Junta Militar “ . Em 25 de março de 1977 enquanto colocava cópias da carta em caixas de correio, foi emboscado e crivado de balas por uma organização anticomunista que operava (e assassinava) livremente com apoio integral  do Estado. Seu corpo nunca foi encontrado e é um dos 30 mil jovens que desapareceram nas mãos das matilhas genocidas  a serviço da ditadura  argentina daquela época sombria.

Como jornalista e escritor Walsh dizia que naquele momento da história era impossível fazer literatura desvinculada da política. E o problema que enfrentava na sua atividade de escritor e de militante era conseguir fazer uma literatura a serviço da causa revolucionária. Mas esta literatura, segundo ele, necessitava de uma forma inédita que revelasse fielmente o conteúdo tão importante e grave no qual viviam os argentinos, isto é, o compromisso feito com  uma forma literária cujas relações  com a verdade se baseasse na apresentação documentada dos fatos.

Por apresentá-los e não representá-los. Porém esta variação deveria revisar a própria estrutura da ficção, o vínculo não entre literatura e política – embora não seja possível se afastar dele – mas entre a ficção e a verdade.

O ano de 1976 representou um alteração na vida de Walsh . Depois do assassinato de sua filha Victoria e de seu amigo, o poeta e militante Paco Urondo, o jornalista que às claras combatia com as palavras, passou para a clandestinidade armada. Em dezembro desse ano Walsh  publicou uma mensagem chamada “Carta a meus amigos”  na qual relata os fatos que resultaram na morte de sua filha. Em 29 de setembro de 1976 sua filha María Victoria – um dia após fazer 26 anos – morreu ao enfrentar  um pelotão do Exército. Ao se ver cercada  e sem possibilidade de fugir do terraço de um edifício, ela e seu amigo Alberto Molina levantaram os braços  e depois de um breve discurso que terminou com a frase: “ Vocês não nos matarão, nós decidimos morrer”, ambos se suicidaram.

A referida carta termina com uma reflexão.

“Com o tempo tenho pensado e me perguntado se minha filha , se todos os que morreram como ela,  teriam outro caminho. A reflexão brota do mais fundo de meu coração e quero meus amigos a conheçam. Vicki poderia ter escolhido outros caminhos sem ser desonrosos ? Penso que ela escolheu o mais justo, mais generoso e mais razoável. Sua lúcida morte foi uma síntese     de sua curta mas formosa vida. Não viveu apara ela mas para os outros e esses outros são milhões. Sua morte foi gloriosamente sua, esse orgulho eu tenho e sou eu quem renasce dela”.

Sua outra filha Patricia é uma dirigente política, foi deputada pela Coalisão da Esquerda Unida e desde  2007 é vereadora em Buenos Aires.

Com os emergentes esgares nazifascistas que se observam atualmente em nosso país e em varias partes da Europa e dos EEUU, pensamos que os exemplos dos bravos combatentes antifascistas argentinos e particularmente tendo em mente a história de Rodolfo Walsh, intelectuais e jornalistas autênticos e independentes  devem participar lucidamente no momento histórico em que vivemos, se manifestar politicamente com veemência e se dar conta de que “ numa hora dessas “, poesia e futebol não são as prioridades vitais e urgentes do Brasil e dos brasileiros.

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Franklin Cunha é médico.


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