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2 de agosto de 2015
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21:54

Márcia Tiburi e a #partidA: “A única democracia concreta e radical é feminista, é negra, é trabalhadora”

Por
Sul 21
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Criada há dois meses, a "partidA já está presente em 15 capitais brasileira. | Foto: Facebook PartidA/Divulgação
Criada há dois meses, a “partidA  já está presente em 15 capitais brasileiras | Foto: Facebook PartidA/Divulgação

Fernanda Canofre

Márcia tinha 9 anos quando foi com a turma da escola ao cinema para assistir Alien (1979). A subtenente Ripley, interpretada por Sigourney Weaver, não chamou muito sua atenção. A menina que gostava de brincar na rua ficou fascinada mesmo pelo Alien, a criatura extraterrestre que mata misteriosamente os tripulantes da nave Nostromo. Ela nunca gostou de heróis.

Na infância longe da televisão e com pouco cinema, a filósofa Márcia Tiburi cresceu inspirada nas mulheres de sua família. Mais tarde, na faculdade, encontrou entre escritoras e filósofas uma nova fonte de inspiração naquelas “que não se ressentiram”. Mesmo assim, ainda levaria um tempo até que ela se dissesse feminista. Foi trabalhando na televisão, como uma das integrantes do programa de conversas Saia Justa, no canal pago GNT, que Márcia se tornou o que tinha de ser. O mundo acadêmico já havia lhe apresentado a misoginia, mas a TV lhe apresentou à necessidade de falar sobre a questão.

A filósofa Márcia Tiburi. | Foto: Divulgação
A filósofa Márcia Tiburi | Foto: Divulgação

Há pouco mais de dois meses, Márcia encontrou na política o caminho para isso. Junto a um grupo de mulheres, ela criou a partidA, movimento que pretende ser o primeiro partido feminista do Brasil. Entre outros pontos em seu manifesto, a partidA se assume como “mudança de paradigma na lógica do poder rumo a uma radical democracia feminista”. Ou seja, movimento com a intenção de ser o primeiro a colocar a pauta da questão de gênero no centro da mesa. A página oficial no Facebook já passou de 7 mil curtidas.

O grupo está presente em 15 capitais brasileiras. Através de rodas de conversa, mulheres que não compreendiam o que é ser feminista ou andavam a parte da política, a maioria delas na faixa dos 40 anos, encontram na partidA o meio de debater o feminismo e o dia-a-dia. Segundo Márcia, as pautas do movimento são a democracia feminista com tudo o que ela inclui, desde legalização do aborto e combate ao racismo até reforma política, urbana e agrária. Tudo que é problema de mulher. “Sobretudo pensamos em mudar o sentido do poder e cremos que o feminismo é essa potência de transformação”, afirma.

Em Porto Alegre, a partidA chegou no final de junho e já se tornou uma roda periódica de conversas. Trabalhando com assessoria empresarial há anos, Mila Milani, uma das coordenadoras na Capital, nem consegue lembrar quantas vezes ela e a sócia foram dispensadas por clientes, na primeira reunião, assim que  descobriam que teriam de trabalhar “só com mulheres”. Agora, como assessora da deputada estadual Any Ortiz (PPS), ela passou a conhecer de perto também o lado machista dos corredores do Legislativo. Escuta quase todos os dias alguém chamando Any de “musa” e creditando seus 22.553 votos apenas a um rosto bonito. A partidA para Mila surgiu como meio de quebrar todos esses paradigmas.

“O feminismo que nós queremos na partidA, ele é mais à esquerda do que a própria esquerda do Brasil”, explica ela. “O feminismo não é uma briga da esquerda, primeiro que não é uma briga, é um diálogo. As feministas conseguem dialogar com os partidos, os partidos não conseguem dialogar com as feministas. Porque para eles é mulher-homem, 8-80, capitalismo-comunismo. O que a gente quer é chamar para que venham participar de pleitos, para que sejam empoderadas no sistema de governo, todas as pessoas que são parte de comunidades, mães solteiras, pessoas que já têm uma força, chamada pela partidA de potencial”.

Apesar de ter aumentado o número de mulheres na Assembleia Legislativa, o Rio Grande do Sul baixou a representação feminina na Câmara, elegendo Maria do Rosário (PT) como a única representante mulher entre 30 homens. Por aqui, uma das principais pautas na qual a partidA já está envolvida é a volta da Secretaria de Políticas para Mulheres.

Márcia esteve presente no primeiro encontro da partidA em Porto Alegre, no final de julho. | Foto: Jaqueline Borba/Divulgação
Márcia esteve presente no primeiro encontro da partidA em Porto Alegre, no final de junho. | Foto: Jaqueline Borba/Divulgação

Para compreender melhor a história da partidA e como ela pretende se aproximar de partidos políticos já existentes e das tomadas de decisão no Legislativo, o Sul21 conversou por email com a filósofa gaúcha Márcia Tiburi. Confira abaixo a entrevista:

Sul 21 – Tu te tornaste ou te descobristes feminista?

Márcia Tiburi – Essa sua pergunta me leva a pensar que cada um de nós se torna aquilo que é. Estamos, para falar filosoficamente, em pleno devir. Isso quer dizer, que quem se descobre feminista, por exemplo, é porque veio a ser, tornou-se aquilo que estava se tornando. Parece apenas uma redundância, mas não é só isso. Quero dizer que o que a gente chama de devir é mais profundo do que uma pura decisão. Isso pode parecer que dificulta a compreensão desse “ser feminista”, mas fica mais simples se entendermos que somos efeitos do inconsciente, o nosso inconsciente pessoal e também o partilhado pelas pessoas em geral no âmbito da cultura (na verdade, um não se separa do outro). Hoje em dia, percebemos que há muita gente que tem posturas feministas, mas não gosta de se dizer feminista. O nome ainda assusta porque há por trás desse nome uma história longa de discurso misógino. Mas que postura é essa? A postura crítica que desmonta com estereótipos de gênero,  que luta contra a discriminação, o preconceito e a desigualdade econômica e política, que defende a inclusão de pessoas historicamente excluídas da sociedade e da política por questões de gênero e sexualidade. Hoje em dia, os feminismos mais críticos, trabalham também com classe e raça. Para contribuir com a crítica, eu levanto também o padrão de normalidade plástica que inclui também a desigualdade por idade.

Sul 21 – Houve algum momento específico onde tu viste que eras feminista?

Márcia – Tentando responder essa tua pergunta complicada: eu estudava filosofia e me dei conta de que quase não tinha colegas mulheres na pós-graduação. No caso do doutorado eu não tinha nenhuma. Tampouco tive professoras de filosofia. Comecei a estudar o tema “mulheres” nos textos clássicos e fiquei estarrecida com o discurso misógino dos filósofos. Organizei congressos e livros. Mas ainda não dizia “eu sou feminista”. Eu só estudava. No entanto, quando fui fazer televisão, eu percebi que era preciso tomar uma atitude política em relação à misoginia. Então, eu me afirmei como feminista. Acho que ninguém na historia da TV fala assim de si mesma. Porque ser feminista parece algo perigoso.

Sul 21 – E o que ser feminista mudou na tua vida?

Márcia – Revisei tudo o que eu estudava de filosofia. Repensei todas as minhas próprias teorias. Aprendi que tudo é político e que é preciso fazer política em todos os âmbitos da vida.

Sul 21 – Como surgiu a ideia de criar a #partidA?

Márcia – Primeiro pensei com algumas pessoas na ideia de um partido político feminista. Chegamos a chamar de Partido Feminista Democrático. Em diálogo com feministas chegamos à conclusão de que podemos manter a hipótese do “partido” como uma questão que nos provoca e nos estimula a pensar e a agir. Percebemos que já estávamos, independentemente de qualquer outra questão, sendo um movimento. A qualidade desse movimento é que ele se organiza como um partido. Essa é uma inovação em termos de militância política bastante arrojada. Chamei a nossa iniciativa de #partidA quando, na primeira reunião pública em 25 de maio no Rio de Janeiro, dialogávamos criticando a noção de partido. Eu disse “não somos um partido, somos uma partida”. Eu tentava mostrar que a nossa diferença era o feminismo e, ao mesmo tempo, nosso objetivo era outro em relação à governabilidade e ao poder. O ponto de partida e o ponto de chegada eram outros. Do meu ponto de vista, o feminismo quando chega ao poder muda a direção e o sentido do poder. Por isso, escrevi um texto chamado partidA. Um texto que jogava com o significado e o significante da palavra partido provocando sua inversão em termos de gênero. Gênero é um problema nosso. Um problema que a #partidA toma como seu ponto crucial, um ponto de partida que implica outras proposições teóricas e práticas em termos políticos.

“O feminismo não é apenas uma teoria, ou uma visão de mundo, mas a posição política que, por excelência, é autocrítica da política tradicional. A política tradicional é masculinista”.

Sul 21 – O que é uma política feminista?

Márcia – Há dois planos políticos em vigência na sociedade. Um diz respeito à política em seu sentido cotidiano, das relações entre pessoas e instituições. É a política em seu sentido vivo. E há uma política que é o regime de governo, que tende à burocracia. Essas duas instâncias em geral são definidas como esfera da vida privada e pública, mas esta é uma definição bastante restrita.

A política em seu sentido mais adequado é necessariamente feminista. Isso não é uma exagero. O feminismo não é apenas uma teoria, ou uma visão de mundo, mas a posição política que, por excelência, é autocrítica da política tradicional. A política tradicional é masculinista. Esse masculinismo da política advém de uma machismo estrutural. Ao mesmo tempo, vivemos em uma época altamente anti-política, pois é o machismo estrutural que destrói a política em todos os âmbitos. Ou seja, em que muitas práticas destrutivas da política se fantasiam de políticas. Isso quer dizer que há muito de antipolítica imiscuída na política. O feminismo é a prática de reconstrução da política naqueles dois âmbitos. Podemos pensar em termos de democracia, a única democracia concreta e radical é feminista, é negra e  é trabalhadora. Isso porque contempla as questões de gênero e sexualidade, raça e classe social. Uma democracia feminista se faz de modo participativo, colaborativo, dialógico. Ou seja, se faz de forma miúda, com o mais próxima. Reconstrói auto-poéticamente a política de dentro para fora, na esfera da vida ética, ou seja, das instâncias mínimas, para as instâncias macroestruturais. Nesse sentido, o feminismo é uma revolução profunda porque afeta o metabolismo social.

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Sul 21 – Tu tens ligação com o PSOL, acompanhaste Luciana Genro em alguns momentos da campanha de 2014. O que a #partidA pode fazer de diferente dos partidos que já existem?

Márcia – Eu sou filiada ao PSOL. Não creio que o PSOL e outros partidos não estão “conseguindo” fazer alguma coisa. Gosto muito de Luciana Genro e de uma coisa que ela disse sobre o feminismo adaptando Simone de Beauvoir: “ninguém nasce feminista, a pessoa se torna feminista”. Isso tem a ver com a historia recente do PSOL que está cada vez mais feminista. Isso é muito bom. Conversei com Luciana sobre a ideia do partido feminista logo no começo, ela foi bem crítica quando às dificuldades de criar um partido. E quanto à sua pertinência. Mas é muito aberta ao nosso movimento. Enquanto movimento acreditamos que é importante apoiar feministas que já estão nos partidos e feministas que podem vir a se filiar. Nossa intenção como movimento é apoiar candidaturas a partir de uma plataforma feminista. O que há de diferente entre nosso movimento que funcionará como partido e os partidos tradicionais é justamente a nossa horizontalidade feminista. Outro aspecto ainda mais fundamental é que pensamos o feminismo como uma superação da dicotomia entre direita e esquerda. Portanto, o feminismo não pode ser secundário em relação ao que se chama de esquerda. Verdade que não acreditamos que seja possível um feminismo de direita, mas direita e esquerda não são a parte fundamental da nossa epistemologia. Em termos bem práticos, creio que não houve até hoje partido que priorizasse as pautas feministas e de diversidade de gênero em seu contato com raça e classe social. Nossa prioridade são questões de inclusão e direitos que contemplam o mundo dos excluídos, sobretudo, mulheres. Então, legalização do aborto, trabalho em geral, desigualdade salarial, desigualdade e violência doméstica, feminismo negro, ecologia, por exemplo, são assuntos nossos.

“O feminismo não pode ser secundário em relação ao que se chama de esquerda. Verdade que não acreditamos que seja possível um feminismo de direita, mas direita e esquerda não são a parte fundamental da nossa epistemologia”.

Sul 21 – Como a #partidA vai funcionar na prática na relação com os partidos que ocupam Legislativo e Executivo?

Márcia – Na prática, vamos apoiar candidata e candidatos feministas. Esperamos trazer para a política agentes que nunca se ocuparam dela. Nossa ideia é repolitizar o cotidiano para poder mudar o cenário a política institucional. Vamos ocupar partidos e ocupar o governo. Nosso plano é de ocupação. Pretendemos filiar mulheres e sujeitos marcados por gênero, raça, classe e sexualidade, incentivando que façam parte, que partam para a política. Que pensem a política em seu sentido amplo.

Sul 21 – Há uma discussão sobre a possibilidade de com o tempo transformar a #partidA em um partido de fato. Quais seriam as vantagens disso?

Márcia – A grande vantagem atual é termos esta questão. Ela mobiliza as pessoas politicamente em termos teóricos e práticos. Falar de um partido feminista é uma grande provocação em nossa época. A partir da experiência com outros partidos, esperamos saber se haverá ou não necessidade de criar um partido feminista. Ou seja, só o tempo e a experiência nos dirão o caminho a seguir.

Márcia em reunião de Goiânia. Ela tem participado dos eventos nas capitais que já formaram suas partidAs. | Foto: Facebook PartidA/Divulgação
Márcia em reunião de Goiânia. Ela tem participado dos eventos nas capitais que já formaram suas partidAs. | Foto: Facebook PartidA/Divulgação

Sul 21 – Em questão de poucos meses, a #partidA ganhou grupos em várias capitais. Isso demonstra uma carência de um debate entre mulheres sobre direitos de mulheres?

Márcia – Meses no nosso caso são pouco mais de dois meses. Se considerarmos o nosso marco que é 25 de maio de 2015, estamos há pouco tempo em ação. Aliás,  a ação do momento é a reflexão, junto do diálogo e do encontro. O que nos move é desejo. Estamos nesse âmbito. Carência de debate? Sim, carência de política de um modo geral. Vivemos subjugados pela antipolítica fascista de nossa época. Queremos politizar e para isso precisamos conversar, dialogar, pensar juntas. É isso o que tem acontecido. A #partidA é democracia feminista em progresso. Gosto de dizer ético-política feminista para valorizar o momento singular e o momento conjunto da criação política. Estamos em plena invenção da vida política. Estamos nos inventando e quem chega é convidada a inventar junto. Outro aspecto importante é que as mulheres conversam pouco sobre seu lugar políticos e seus direitos, mas é um fato também que aquelas que falam e sabem agir são tolhidas pelo machismo estrutural. Uma coisa importante é trabalhar para mudar isso nas microestruturas das relações e da vida social.

Sul 21 – Um dos desafios a que a #partidA se propõe é o de integrar ao debate político mulheres que estão à margem dele. Como fazer isso?

Márcia – Creio que mulheres e sujeitos excluídos perceberão que é a sua vez. Que a questão da representação política é fundamental em nossos dias. Que os excluídos nunca foram representados. A #partidA tem trabalhado na acolhida e na chegada das pessoas que quiserem fazer a #partidA. Está aberta a todas. Muitas pessoas que nunca se ocuparam de politica querem um lugar para praticá-la. Há em nosso cenário um desejo de política, de ativismo, de militância. Em que pese o clima fascitóide dos meios de comunicacão e do dia a dia, há também os que resistem e não se curvam a essa tendência. Esses querem um mundo melhor e desejam agir em seu nome. Essas pessoas estão percebendo que podem chegar e produzir algo de comum com a outras.

“Gosto de dizer ético-política feminista para valorizar o momento singular e o momento conjunto da criação política. Estamos em plena invenção da vida política. Estamos nos inventando e quem chega é convidada a inventar junto”.

Sul 21 – Uma das propostas da #partidA pode ter críticas dentro de algumas linhas feministas, que é a ideia da “cota para homens”. Muitas feministas acreditam que homens não podem ser feministas. O que tu achas disso? E qual a ideia desta cota?

Márcia – Se chegarmos a ser um partido teremos que nos ocupar com a lei de cotas que implica 30% de candidaturas de outro gênero. Por enquanto, somos um movimento e não precisamos colocar essa questão como prioritária. A presença dos homens é problema para umas, para outras correntes não é. Eu não vejo nenhum problema na participação dos homens que possam se dizer ou apoiar as causas feministas. Maior problema seria pensar na presença de mulheres machistas. A condição de gênero não é garantia de consciência política. Se a marcação sofrida garantisse isso o mundo seria diferente. Ao mesmo tempo, não vejo que, neste momento, os homens sejam questão para nós em um sentido mais complexo. O protagonismo dos homens é incontestável em muitos cenários. Acredito que a #partidA pode colaborar com o protagonismo de mulheres (as pessoas que, independentemente de seus corpos biológicos, se autorrepresentam dessa forma são mulheres porque assim se representam) e de todos os excluídos dos protagonismos políticos, sejam eles negros, indígenas, líderes populares, pessoas pobres. O nosso feminismo conversa com todos os feminismos porque ele é dialógico. Acreditamos que essa postura garante o sentido prático de nosso movimento rumo à governabilidade.

Márcia Tiburi | Foto: Divulgação
Márcia Tiburi | Foto: Divulgação

Sul 21 – Numa das raras vezes em que apareceu na televisão, Simone de Beauvoir deu uma entrevista falando sobre feminismo. Quando foi perguntada pelo apresentador sobre o papel da questão econômica, ela respondeu: “Uma das chaves da condição imposta às mulheres é o tipo de trabalho forçado. É um trabalho assalariado, não-remunerado, que lhes permite se manter mais ou menos no luxo ou na pobreza, por seus maridos. Mas que não produz ganhos econômicos”. Quarenta e oito anos depois dessa entrevista, as mulheres podem ter conquistado mais espaço no mercado de trabalho, mas ele ainda está longe de ser igualitário. Como tu vês o papel da economia num debate de direitos das mulheres?

Márcia – O papel da economia em um debate de direitos das mulheres implica, de um lado, a necessidade de pensar na desigualdade econômica e na violência que a acompanha. De outro, o questionamento da própria economia que suplanta as outras esferas da vida. O questionamento do capitalismo é uma questão feminista, a transformação do todo da vida em questão econômica é um problema que apenas a crítica feminista consegue postular para alterar. Quando Marx apontava que a mulher é o proletário do proletário ele queria dizer que dominação econômica continuava na forma de dominação de gênero. Sabemos que uma ético-política feminista é a continuação dessa constatação e produção de meio para sua superação.

Sul 21 – A política institucional é um ambiente permeado de machismo. Desde gestos “sutis” – como Aécio Neves apontando o dedo para Luciana Genro, durante os debates presidenciais – passando por desrespeito – Bolsonaro atacando Maria do Rosário, usando estupro como piada e aplaudido na internet – ao extremo absurdo, como os adesivos da presidente Dilma. Há uma dificuldade histórica em inserir a questão de gênero na política. Como romper esses processos?

Márcia – Novamente não podemos sugerir mágicas. Mas políticas. Política que envolvam desde campanhas de conscientização nos meios de comunicação e escolas, até alterações curriculares, inserção de tópicos de gênero e respeito à diversidade sexual, que possam dar conta do fascismo atuante e que cresce cada vez mais também por conta do machismo. Notemos que um alimenta o outro.

Sul 21 – Tu tens uma filha adolescente. Como tu abordas o feminismo com ela?

Márcia – Assim como a filosofia não creio que o “feminismo” seja um conteúdo transmissível. Trato o feminismo como uma filosofia prática, tentando fazer dos meus gestos o efeito do meu pensamento. Certamente eu erro, sou, como todo mundo, feita do meu inconsciente, mas eu tento ir além dele. A minha filha é bastante feminista, mas as garotas de sua geração são de um modo geral. O senso crítico entre as meninas e jovens é imenso.

Sul 21 – A revolução feminista já aconteceu ou deu a partida agora?

Márcia – A revolução feminista tem história. Ela foi feita aos poucos e continua acontecendo, não sem o esforço e a generosidade das mulheres, as protagonistas do feminismo. A #partidA é parte desse processo histórico. A parte que nos cabe, que nos faz seguir desejando tempos não violentos, tempos em que o feminismo ensine tudo o que aprendeu para a política.

 

Reunião da partidA em Porto Alegre. | Foto: partidA POA Facebook/Divulgação
Reunião da partidA em Porto Alegre. | Foto: PartidA Porto Alegre Facebook/Divulgação

 

 


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