Opinião
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12 de maio de 2023
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18:18

Bifurcações x livre arbítrio (por Domingos Alexandre)

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Domingos Alexandre (*)

Dia desses o jornalista Octavio Guedes afirmou em um programa da Globonews que há duas Forças Armadas de Duque de Caxias. Uma do patrono Duque de Caxias e a outra constituída daquela fração que vai ao município de Duque de Caxias para falsificar atestados de vacina e sabe-se lá o que mais. A conversa era sobre se “as Instituições estão funcionando no Brasil”. Também sobre este tema e por aqueles dias o jornalista Moises Mendes fez nas redes sociais duras críticas ao presidente do Banco Central pela manutenção da taxa de juros em 13,75%. Disse que Campos Neto teria rebaixado o nível do avô, a quem deu o nickname Bob Fiels Grandson.

Somando-se à multidão que com veemência afirma que “as instituições não estão funcionando” a cientista política Céli Pinto, professora emérita da UFRGS, publicou no dia oito de maio último, no jornal eletrônico Sul21 o brilhante artigo: Governar para o povo é preciso. Naquele artigo aquela cientista vai além e garante que nem nossa democracia está assegurada e que não só o Banco Central, mas também o Congresso não está funcionando como deveria. Referindo-se ao “centrão”, diz que ele “pode ser qualquer coisa, desde que obtenha vantagem para si e para sua parentela” e recomenda que o Presidente percorra o País e “se volte para o povo”. Num País onde um almirante se presta a acobertar contrabando de diamantes, onde oficiais militares possuem mansões no exterior, onde o ex-ministro da economia foi pego com milhões em paraísos fiscais, onde foram feitas privatizações escandalosas, onde a família do ex-presidente possui patrimônio sem origem, onde fazem quebra-quebra nas sedes dos três poderes, onde agem na tentativa de dar golpe de estado e tudo ameaça ficar por isto mesmo é de se perguntar: “será que basta mobilizar a população”?

A coisa vai de mal a pior em escala planetária, mas para ficar no suplício dos brasileiros, mesmo sabendo dos méritos e da competência do Lula e de seu entourage, talvez sejam necessárias medidas ainda mais difíceis do que mobilizar o povo e enquadrar o centrão. Os pensadores do Iluminismo já sabiam da inconveniência de legislador botar a mão em dinheiro. Mas como explicar para um prefeito que seria melhor para seu município se as famigeradas Emendas Parlamentares deixassem de existir? Que seria melhor para o seu município que todos os recursos tão necessários para todas as despesas viessem diretamente do Tesouro Nacional obedecendo a Legislação vigente? Nem os legisladores mais éticos e progressistas concordariam com tal mudança. Em compensação teríamos legisladores dedicados exclusivamente com o aperfeiçoamento da Lei Federal. Todo o mal resultante da corrente de dependência que vai do pequeno e distante município até a Capital Federal, passando por todos os agentes políticos, seria cortado pela raiz. O Legislador legislando, o Executivo executando e o Judiciário arbitrando, teria o mérito de possibilitar uma inflexão na trajetória da maioria dos nossos problemas.

Quem desconhece que com as tais Emendas Parlamentares cada Deputado Federal precisa dispor de uma enorme estrutura de pessoal na sua base eleitoral com o propósito único de aliciar apoio em troca de uma emenda parlamentar? Isso faz com que se chega ao absurdo de se eleger legislador sem o menor conhecimento da Constituição Federal e que ficam quase três décadas na Câmara Federal tendo tido apenas dois PL aprovados como o Presidente anterior.

No início deste arrazoado citei jornalistas e/ou intelectuais preocupados com o “funcionamento das instituições”. Em 1977 o intelectual Jefferson Barros fez publicar pela Editora Movimento uma sucinta e instigante obra intitulada Função dos Intelectuais numa Sociedade de Classes. Na página 33 daquele opúsculo Jefferson Barros ensina que se a Democracia está ameaçada e se das lideranças políticas e econômicas de quem seria de se esperar que apontassem o caminho da virtude, se dali nada sai, então: “se já não há força (…) capaz de assumir com coragem e racionalidade a legitimidade do sistema democrático, essa força deve surgir dos trabalhadores e, sobretudo, dos trabalhadores intelectuais.

Na origem de todos os mais cruciais problemas da humanidade, segundo atestam pensadores da estatura de Jessé Souza, Thomas Piketty e Noam Chomski, está a ganância, o lucro a qualquer preço e a injusta concentração da riqueza. A única alternativa seria a depreciação do individualismo em favor de Leis que contemplem o coletivo, que considere e leve em conta todos os seres humanos. Aqui no Brasil, da maneira como está arraigado o egoísmo e, considerando a gravidade do estágio que estamos, talvez já não sejam suficientes a palavra e o texto do intelectual para nos salvar. Quando o Estado admite impotência no enfrentamento do crime organizado, quando um estado importante como o Rio de Janeiro é perdido para milicianos, há motivos para supor que as ações do intelectual e do legislador já não sejam ferramentas eficazes. Se ao Brasil já não é dada a oportunidade de se desenvolver com justiça e harmonia, se aos brasileiros, geração após geração, lhes é negada a oportunidade de viverem com dignidade e de serem felizes, temos que considerar a possibilidade de termos ultrapassado o ponto de não retorno e, nesse caso, alguém tem que pagar por isso.

(*) Bacharel em História

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


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