Opinião
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9 de março de 2022
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18:55

Tóquio, 9 e 10 de março de 1945 (por Milton Pomar)

Bombardeio sobre Tóquio matou cerca de 100 mil pessoas (Reprodução/Domínio Público)
Bombardeio sobre Tóquio matou cerca de 100 mil pessoas (Reprodução/Domínio Público)

Milton Pomar (*)

Centenas de aviões B-29 teriam despejado 1.700 toneladas de napalm sobre a capital do Japão na noite do dia 9 de março de 1945 e na manhã do dia seguinte, incinerando e matando mais de 100 mil pessoas durante o ataque. Assim Tóquio tornou-se o recorde de mortes por bombardeios norte-americanos, muito mais que todas as outras grandes cidades japonesas também atingidas no início de 1945: Yokohama, Osaka, Kobe, Nagoya, Kawasaki. Em junho e julho daquele ano foram as pequenas cidades, e no início de agosto, Hiroshima (80 mil mortos) e Nagasaki (70 mil), com bombas atômicas. No total, 64 cidades japonesas teriam sido bombardeadas – e incendiadas – pelos Estados Unidos (EUA), com 14 mil toneladas de napalm, que teria resultado em 400 mil pessoas carbonizadas (há estimativas de até 800 mil mortos nesses ataques). A quantidade de vítimas fatais sempre foi muito maior, tais as quantidades de pessoas queimadas e feridas, mais as atingidas por radiação, que morreram nos dias e meses seguintes.

Em Tóquio e demais cidades japonesas os EUA inovaram com bombas de napalm, arma química recém-criada (1942), com grande poder incendiário. Com o “sucesso” do napalm no Japão, em 1945, a aviação militar dos EUA passou a utilizar o produto após o final da II Guerra Mundial em todas as suas invasões e guerras (Coreia, Vietnã, Iraque e Afeganistão), mais as muitas guerras nas quais ajudou financeira e militarmente um dos lados. 

A reação pública mundial à utilização do napalm pelos norte-americanos começou mais de 20 anos depois dele ter incinerado boa parte do Japão em 1945. Ela se tornou politicamente significativa somente no início de 1970, graças à divulgação do que causava nas suas vítimas no Vietnã, país com mais de dois milhões de mortos com a invasão militar dos EUA. Ainda assim, somente em 2001 os EUA anunciaram ter parado de utilizar o produto, o que comprovou-se ser uma meia verdade, porque continuaram usando, só que com outro nome, no Iraque e Afeganistão, até 2011. 

Guerras são realmente um horror e não resolvem nada, a não ser o consumo de armamentos, munições, tanques, mísseis, aviões etc., fabricados todos os dias em quantidades milionárias, e que, portanto, precisam ser comprados, usados e destruídos todos os anos, para manter a muito lucrativa atividade – as vendas do setor bélico teriam atingido US$361 bilhões em 2019, segundo levantamento do Instituto de Pesquisas da Paz (https://www.sipri.org/yearbook/2021) da Suécia.

O Anuário 2021 do Sipri informa ainda que os EUA estão em primeiro lugar no mundo em exportações de armamentos, com 37% do total no período 2016-2020 (15% mais altas que no período 2011-2015), e que são norte-americanas as cinco empresas mais importantes do setor. As exportações da Rússia teriam caído 22% no mesmo período, e a sua participação no comércio mundial de armas também, de 26% (2011-2015), para 20% em 2016-2020. E subiram as vendas da França (mais 44%), e as da Alemanha (mais 21%).

A invasão da Ucrânia pela Rússia no final de fevereiro, o noticiário a respeito dos bombardeios, os discursos dos presidentes da França e dos EUA, mais toda a propaganda que está sendo feita, inevitavelmente nos lembra também outras invasões recentes, como a do Iraque, em 19 de março de 2003, com a falsa acusação que o país teria “armas de destruição em massa”. Teriam morrido na invasão norte-americana 15 mil pessoas, a grande maioria civis, e até o final da guerra estima-se que o total tenha chegado a 200 mil pessoas, a maior parte civis. 

(*) Geógrafo e mestre em Políticas Públicas

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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