Meio Ambiente
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14 de novembro de 2021
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13:25

Especialistas apontam contradições entre o discurso e a prática de Leite na agenda ambiental

Por
Sul 21
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O Pampa é o bioma brasileiro que mais perde sua área com cobertura natural. Foto: Arquivo Pessoal/Valerio Pillar
O Pampa é o bioma brasileiro que mais perde sua área com cobertura natural. Foto: Arquivo Pessoal/Valerio Pillar

Sob o título Sem clima para a agenda de Eduardo Leite, quatro presidentes de associações gaúchas ligadas à preservação do meio ambiente publicaram um duro artigo no jornal O Globo apontando as contradições do governador em sua passagem pela COP26, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, realizada em Glasgow, na Escócia.

Os autores afirmam que a sociedade gaúcha foi surpreendida pela manifestação de Leite, preocupado com a agenda climática global, em artigo publicado no mesmo jornal carioca no último dia 7. Na ocasião, o governador enalteceu a adesão de 22 governadores brasileiros ao “Consórcio Brasil Verde”, com metas de redução e neutralidade de Carbono, para controle do desmatamento, especialmente da Amazônia, entre outras responsabilidades com o clima.

“Louvável como discurso. Contudo, nos chama a atenção que em nenhum momento o governador aborda ações concretas de seus três anos de governo no Rio Grande do Sul. Infelizmente, ”, destacam Pablo Tadeu Pereira da Silva, Nilo Sérgio Fernandes Barbosa, Jan Karel Felix Mähler Jr e Joelsio Luiz Barbosa dos Santos, respectivamente presidentes da Associação dos Servidores da Secretaria do Estado de Meio Ambiente e Infraestrutura (ASSEMA/RS), da Associação dos Servidores da FEPAM (ASFEPAM/RS), Associação dos Funcionários da Fundação Zoobotânica (AFFZB/RS) e da Associação dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e PECMA – Rio Grande do Sul (ASIBAMA/RS).

“Eduardo Leite herdou uma situação de desmonte da capacidade técnico-científica do Estado, com a extinção de diversas fundações, o que poderia ter sido revisto, e, em parte ainda pode, mas nada fez. Servidores estaduais responsáveis pela condução de boa parte das pesquisas científicas sobre meio ambiente e que têm papel fundamental nas políticas de gestão, conservação e uso sustentável da biodiversidade no RS continuam sob ameaça iminente de demissão por uma decisão unicamente política, que o atual Governador optou por manter. Tal negligência compromete diversas ações de conservação ambiental nos Biomas Pampa e Mata Atlântica, inclusive custeadas com recursos nacionais e internacionais; compromete as avaliações de risco de extinção e ações de conservação da fauna e da flora ameaçadas no Estado e políticas de controle de espécies exóticas invasoras, e, ameaça a manutenção de acervos científicos e coleções biológicas de valor inestimável, como o caso do abandono do Jardim Botânico de Porto Alegre, recentemente denunciado por entidades ambientalistas”, criticam os autores do artigo.

Eles lembram que, logo no começo do mandato, Leite revisou o Código do Meio Ambiente, a principal lei ambiental do RS, votado em caráter de urgência na Assembleia Legislativa e sem debate com a sociedade. Os ambientalistas destacam que a nova lei tem diversos retrocessos, já denunciados e alguns judicializados, como é o caso do licenciamento automático de atividades poluidoras. Citam também que na legislação estadual de controle de agrotóxicos, o governo Leite derrubou restrições para produtos banidos em seus países de origem, favorecendo assim a entrada no RS de produtos que não são aceitos em vários países Europeus e da América do Norte.

“Mas, em matéria de controle de desmatamento e diminuição das emissões de gases estufa, foi onde mais surpreendeu o suposto compromisso do governador Leite com pautas climáticas globais. Isso porque, já em fim de governo, até o momento, Eduardo Leite sequer implementou o Programa de Regularização Ambiental (PRA) previsto em lei desde 2012, e que tem objetivo de recuperar passivos ambientais de imóveis rurais, um dos pilares de sequestro de carbono do país. Com isso, o RS não analisa o Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades rurais de forma ampla, e consequentemente não exige a recuperação ambiental dos extensos passivos de vegetação a recuperar nos biomas Pampa e Mata Atlântica”, enfatizam.

Os autores do artigo também fazem referência ao fato do governo Leite não ter tido iniciativa na criação de novas unidades de conservação, consideradas uma das principais estratégias para a conservação da biodiversidade – tema indissociável da política climática, segundo a ONU.

“Nenhuma unidade de conservação foi criada! Pelo contrário: o governo Leite conduz política de concessão de parques estaduais à iniciativa privada sem nenhum debate com os próprios técnicos da SEMA (Secretaria Estadual do Ambiente e Infraestrutura). Tais projetos vêm sendo duramente criticados pela comunidade científica, pelos ambientalistas e pela sociedade em geral”, afirmam.

A dramática situação do Pampa é igualmente ressaltada. O bioma típico do RS sofre com a maior redução de área natural no país, perdendo mais de 100 mil hectares de vegetação nativa por ano, segundo o Mapbiomas. Apesar da gravidade do quadro, os ambientalistas recordam que Leite sancionou legislação que, “num passe de mágica”, transformou os campos nativos do Pampa em área rural consolidada. Na prática, eles alertam, a medida condena o Pampa a ser o único bioma do Brasil onde não haverá reservas legais. Depois de denunciada, a nova legislação está suspensa pelo Tribunal de Justiça do RS em decisão liminar.

Dado o cenário, a sociedade gaúcha merece esclarecimentos e maior coerência entre o discurso apresentado pelo governador e a política ambiental em curso no RS”, finaliza o artigo.


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