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20 de novembro de 2023
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16:11

Poeta Oliveira Silveira é reconhecido como Doutor Honoris Causa pela UFRGS

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Sul 21
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Naiara, filha do poeta, recebeu o diploma de Doutor Honoris Causa do pai. Foto: Gustavo Diehl
Naiara, filha do poeta, recebeu o diploma de Doutor Honoris Causa do pai. Foto: Gustavo Diehl

Um dos intelectuais negros de maior destaque no Rio Grande do Sul e no Brasil, o poeta Oliveira Silveira recebeu o título de Doutor Honoris Causa (in memoriam), nesta segunda-feira (20), Dia Nacional da Consciência Negra, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

Nascido em Touro Passo, distrito de Rosário do Sul (RS), em 16 de agosto de 1941, Oliveira Silveira diplomou-se no Instituto de Letras da UFRGS, foi professor em Porto Alegre e um dos criadores e incentivadores do 20 de Novembro como data comemorativa da identidade, da cultura e da resistência afro-brasileiras. O primeiro ato evocativo da data ocorreu em 1971, em celebração realizada pelo Grupo Palmares na Capital gaúcha, movimento do qual ele participou até 1978. O 20 de novembro foi escolhido em homenagem a data da morte de Zumbi dos Palmares, líder do quilombo mais importante do Brasil, em 1695. 

Segundo a universidade, a sessão solene de outorga do título de Doutor Honoris Causa, marcada por versos do poeta, buscou registrar na história da UFRGS a contribuição de Oliveira Silveira. A solenidade foi marcada por dois oradores: a docente aposentada Maria da Graça Gomes Paiva e o aluno Wellington Porto, representante do Conselho do Instituto de Letras. 

Maria da Graça abordou aspectos da vida, da obra literária e da atuação de Oliveira na mobilização para ampliação da consciência social sobre a questão do negro no Brasil. Ela enfatizou o legado do homenageado que se perpetua, como no exemplo do “Sopapo Poético”, que surgiu em 2012, após a morte de Oliveira. A professora disse considerar como uma constante na obra do autor a identidade afro-gaúcha. Maria citou, ainda, um trecho da tese de doutorado de Zila Bern, defendida na USP em 1987, em que a autora afirma sobre Oliveira Silveira: “A emergência de uma consciência negra no Brasil que se expressava, sobretudo, através da poesia”. 

A professora ainda fez um chamado à obra de Oliveira Silveira. “Cabe a todos nós conhecermos a sua obra para darmos continuidade a sua aspiração ou sonho maior: acabar com as desigualdades étnico-raciais e culturais no Brasil no mundo”, afirmou. 

Pela primeira vez em muitos anos, a sessão solene do Conselho Universitário teve um aluno na posição de orador. Estudante do Instituto de Letras, Wellington Porto saudou os presentes enfatizando a presença de pessoas pretas na plateia, ocupando um espaço que anos atrás seria inacessível. 

“Ao conferir esse título, estamos não apenas homenageando um indivíduo notável, mas também fazendo uma afirmação sobre a importância da representatividade e da promoção da diversidade em todos os níveis da academia. É imperativo reconhecer que as conquistas de Oliveira Silveira não se limitam apenas às suas realizações profissionais, mas também servem como um exemplo inspirador para futuras gerações”, afirmou o estudante, dando ênfase à jornada do poeta, marcada pela determinação, a excelência acadêmica e a paixão pelo conhecimento como impulso a superar obstáculos e abrir caminhos.

Wellington citou o poema “Encontrei Minhas Origens” como texto que sintetiza o que o poeta representa para os estudantes negros da Universidade. 

“Encontrei minhas origens
em velhos arquivos
……. livros
encontrei
em malditos objetos
troncos e grilhetas
encontrei minhas origens
no leste
no mar em imundos tumbeiros
encontrei
em doces palavras
…… cantos
em furiosos tambores
……. ritos
encontrei minhas origens
na cor de minha pele
nos lanhos de minha alma
em mim
em minha gente escura
em meus heróis altivos
encontrei
encontrei-as enfim
me encontrei”

Estudante de Letras Wellington Porto foi um dos oradores da cerimônia. Foto: Gustavo Diehl/UFRGS

Coube à filha do homenageado, Naiara Oliveira Silveira, receber o diploma em homenagem ao pai. E também com um poema discursou após receber o diploma. 

“Vamos juntos!
Me dá a mão e vamos juntos!
Tua disposição e vamos juntos!
Vamos correr nas campinas, vamos lerdear nas areias.
Mas juntos, juntos, juntos” 

Naiara abordou os diferentes significados que a poesia carrega, destacando aspectos da trajetória de seu pai, que contribuiu, aconselhou e ajudou a tantas pessoas. “Me dá a mão e vamos juntos: quem o conheceu sabe o significado desse verso. Ele deu a mão, preparou, aconselhou. Nós seguramos o legado dele e fizemos que a história não acabasse em janeiro de 2009”, afirmou, em referência à data de falecimento do poeta.

Ainda antes da solenidade, ela considerou a homenagem como um reconhecimento ao trabalho e à dedicação de Oliveira Silveira durante toda a vida. “Eu cresci vendo a participação dele em tudo que se tratava das questões do negro. E em relação a temática antirracista, ele é uma de nossas referências, um pesquisador nato, incansável nos seus objetivos”, lembrou Naiara, destacando que a produção poética do pai sempre esteve conectada com a história, o seu papel de professor e a atuação nos grupos negros. 

Naiara já havia reforçado a relevância que Oliveira Silveira tem na história do movimento negro do RS. “O resgate de Oliveira Silveira é importante pelo seu papel desenvolvido na história do movimento negro no RS, junto a diversos grupos que formou ou participou, sendo ativista e, ao mesmo tempo, ao seu trabalho na literatura negra gaúcha, seu reconhecimento como um importante poeta, negro”, avaliou.

A vice-reitora Patricia Pranke relembrou a relação da UFRGS com o homenageado, destacando a guarda do acervo pessoal de Oliveira Silveira, com mais de 21 mil itens, que está armazenado e disponível para consultadas na Faculdade de Educação. “Oliveira Silveira se distinguiu por sua produção poética e por ter sido idealizador de uma sociedade mais inclusiva.”


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