Na manhã desta quarta-feira (4), a ocupação Kasa Okupa Cultural Jiboia foi surpreendida com uma escavadeira derrubando o muro que separa o seu terreno do Museu Joaquim José Felizardo, na rua João Alfredo, no bairro Cidade Baixa. A ação foi coordenada pela Prefeitura de Porto Alegre, que afirma que o muro precisa ser demolido porque corre risco de cair.
Entretanto, a moradia das pessoas acolhidas pela ocupação, em grande parte mulheres, pessoas LGBTQIAP+ e crianças, tem parede junto ao muro. Para tentar barrar a demolição, foram subindo na estrutura, o que obrigou o cessar das máquinas.
Uma das pessoas moradoras do local conta que foi acordada pela Guarda Municipal informando sobre a demolição cerca de 10 minutos antes dela acontecer. “Comentaram que não tem nenhum interesse em reconstruir o muro. Planejam colocar uma tela para separar, sendo que o museu é frequentado por muitas pessoas, não garantiram nenhum tipo de segurança para nós, nem nossos pertences”, relata.
Uma equipe jurídica foi ao local para auxiliar a ocupação. A advogada Stéphani Fleck da Rosa explica que uma liminar em segunda instância autorizou que a estrutura fosse demolida ou passasse por manutenção, mas que a comunidade não foi avisada ou intimada. “Não teve uma defesa, inclusive depois a gente contestou, colocou os laudos e agora está entrando com mandado de segurança no Tribunal para tentar reverter essa decisão”, afirma.
Um recurso foi protocolado na tarde de hoje. A comunidade da ocupação se reuniu com a Prefeitura para negociar a permanência, mas não há desfecho ainda. Segundo a advogada, a Prefeitura deve aguardar nova decisão para prosseguir ou não com a demolição. Ela relata que a ação já causou perdas, como a exposição de bens das pessoas moradoras da ocupação à chuva. Com o que conseguiram, as pessoas moradoras reconstruíram partes do muro ao longo da tarde.
Stéphani também explica que, caso seja mantida a demolição, é necessária uma reparação. “As pessoas querem ter um prazo para poderem se reestruturar, inclusive com comprometimento do próprio Município em refazer o muro e de todas as outras edificações aqui do espaço que também irão abaixo.”
Há preocupação com a privacidade e segurança das pessoas moradoras, que já sofrem com ataques homofóbicos. No início deste ano, um homem entrou na ocupação portando um facão, quando não havia ninguém na casa, e cortou plantas da horta comunitária que era cultivada. Ao sair, deixou o local trancado com cadeados.
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Em nota, a Prefeitura de Porto Alegre, por meio da Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa (SMC), alegou que a ação procura a segurança dos moradores, em razão de o muro correr risco de desabamento, e informou que a derrubada parou após a resistência dos ocupantes. Ao contrário do que dizem as pessoas moradoras, a administração afirma que residentes da casa foram alertados da derrubada pelos autos do processo.
“Por determinação da 17ª Câmara Cível do TJ, nesta quarta-feira, 4, a Prefeitura iniciou o trabalho de demolição do muro do imóvel localizado na rua João Alfredo, 568 – Cidade Baixa, vizinho ao Museu Joaquim Felizardo, este, de propriedade do município. A demolição foi autorizada pela Justiça baseada em laudo da Defesa Civil atestando que, devido às rachaduras, o muro estava prestes a cair. O imóvel é inventariado e encontra-se invadido. As posseiras foram notificadas há mais de quarenta dias a respeito da demolição pela Justiça”, diz a nota.
Em comunicado à Prefeitura, as pessoas moradoras da Kasa Okupa Cultural Jiboia pedem à administração que reconsidere a continuidade da demolição e garanta a segurança de todos os envolvidos.
“Solicitamos respeitosamente que o Município: auspenda imediatamente todas as atividades de demolição do muro em questão; realize uma avaliação completa da integridade estrutural remanescente do muro, com a assistência de profissionais qualificados; implemente medidas de segurança adequadas para proteger não apenas as pessoas diretamente envolvidas na obra, mas também os residentes e a propriedade circundante; comunique de forma transparente e regular a comunidade afetada, mantendo-a informada e em decisão concertada entre ambos sejam tomadas as ações, bem como planejado de forma segura, se necessário o muro, sem comprometer o direito à moradia das lindeiras”.