Opinião
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16 de março de 2023
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08:24

Ocupação para Melo só se feita com contêineres (por Daiana Santos)

Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Daiana Santos (*)

A Porto Alegre de Sebastião Melo, prefeito mais bolsonarista do Brasil, tem uma regra: se não dá dinheiro, não serve. E só vai servir se der dinheiro. É assim que Melo constrói a sua própria ocupação. Uma ocupação composta por contêineres por todos os lados, prédios espelhados como sinal de desenvolvimento, invenção de um Quarto Distrito que quer varrer a população preta e pobre para os cantos da cidade e um projeto de Roda Gigante, enquanto as linhas de ônibus que vem da periferia pegam fogo.

Há poucas semanas, a Kasa Ocupa Cultural Jibóia, uma ocupação urbana que acolhe mulheres e pessoas dissidentes de gênero e sexualidade, na R. João Alfredo, 568, na Cidade Baixa, foi atacada por um homem com um facão de tarde, quando não havia ninguém na casa. Com a arma, o agressor decepou as hortas comunitárias e árvores frutíferas cultivadas há quase dois anos pela comunidade. Na saída, colocou um cadeado e duas placas escritas “Alta Tensão: Risco de Morte”, ameaçando retornar no dia seguinte. De acordo com as pessoas moradoras, a invasão se deu por um buraco na parede que liga a ocupação ao Museu Joaquim Felizardo, patrimônio público de Porto Alegre, com permissão da segurança.

O ataque sofrido pela Jibóia é a cara do descaso de uma Porto Alegre que não é pensada para as mulheres, para o povo negro, para a periferia e para as LGBTI+. É uma vergonha que a cidade com a maior população LGBTI+ das capitais brasileiras, com 5,1% segundo o IBGE,  não tenha sequer uma casa de acolhimento para a comunidade. E, pior, ainda invisibiliza a existência dos espaços de acolhimento autogeridos por essas pessoas. Espaços formados como resposta à ausência do poder público, que falha no combate a violência, preconceito e discriminação contra esses corpos. Em Porto Alegre, a Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância (DPCI) encerrou o ano com um aumento de 22% dos casos, impulsionado pelo crescimento dos crimes de injúria discriminatória, homofobia e transfobia.

Há seis quilômetros da Jibóia, no bairro São João, a Casa Mulheres Mirabal, referência no auxílio e acolhimento de mulheres vítimas da violência e seus filhos, ainda não é reconhecida pela Prefeitura. Com um trabalho social realizado desde 2016 e apesar de ter recebido um alvará de funcionamento, Melo se recusou a tirar o pedido de reintegração de posse contra Mirabal na Justiça. Estamos falando da capital de um estado onde pelo menos 106 mulheres foram assassinadas por serem mulheres, representando um aumento de 10,4% nos casos de feminicídio em 2022.

É essa política que  vamos combater. A política do descaso, do contêiner e do concreto. Queremos uma Porto Alegre inclusiva e digna para as mulheres, crianças, negras e negros, trabalhadoras e trabalhadores, para a juventude, para as LGBTI+, para toda a população que vive na capital gaúcha sofrendo pelo descaso do poder público municipal. 

(*) Deputada federal (PCdoB-RS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


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