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25 de junho de 2023
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12:14

Livro do Observatório das Metrópoles debate reforma urbana em tempos de agenda ultra liberal

Por
Luís Gomes
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4º Distrito é um dos focos da atual gestão. Foto: Luiza Castro/Sul21
4º Distrito é um dos focos da atual gestão. Foto: Luiza Castro/Sul21

Em um evento marcado para a próxima sexta-feira (30), na Livraria Cirkula, o Observatório das Metrópoles lança a versão impressa do livro “Reforma urbana e direito à cidade”, coletânea de artigos produzidos por professores e pesquisadores de diversas universidades do Rio Grande do Sul. Lançada no final do ano passado em versão online (disponível aqui), a obra busca fazer um retrato da atual agenda política urbana de Porto Alegre, relacionando as discussões promovidas por movimentos sociais com a política neoliberal instalada pelas últimas gestões na Capital.

Os autores destacam que a plataforma da Reforma Urbana foi construída a partir dos anos 1980 com o objetivo de transformar as metrópoles brasileiras em cidades mais justas, democráticas e sustentáveis. Este movimento conseguiu, por exemplo, garantir artigos da Constituição de 1988 que tratam da função social da cidade e da propriedade, posteriormente regulamentados pelo Estatuto da Cidade (2001).

Uma das organizadoras do livro, a professora Vanessa Marx, do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFRGS e coordenadora do Núcleo de Porto Alegre do Observatório das Metrópoles, explica que, mais do que um resgate histórico dos processos que envolvem a temática, é um esforço de compreensão dos temas que estão sendo discutidos na cidade e também têm relevância nacional atualmente.

Vanessa conta que a Coordenação Nacional do Observatório das Metrópoles incentivou que os núcleos regionais fizessem, de forma autônoma, a impressão da publicação. Para tal, contaram com o apoio dos programas de pós-graduação em Sociologia e Geografia da UFRGS. “A expectativa é que a versão impressa alcance um público maior”, diz, destacando que o livro será disponibilizado, de forma gratuita, na sala que o Observatório das Metrópoles ocupa no Instituto Latino Americano de Estudos Avançados (ILEA), no Campus do Vale da UFRGS.

Foto: Reprodução

O livro é dividido em 10 capítulos, escritos por diferentes autores. São eles:

— Capítulo 1: Como estão as desigualdades e o bem-estar urbano? Desemprego e pobreza em Porto Alegre [André Salata (PUC/RS), Judite Sanson de Bem (UNILASALLE) e Daiane Menezes (DEE/SPGG)]

— Capítulo 2: Habitação em Porto Alegre: Situação e perspectivas [Mario Leal Lahorgue (UFRGS), Lucimar Fátima Siqueira (UFRGS), Heleniza Avila Campos (UFRGS), Geisa Zanini Rorato (UFRGS), Karla Moroso (CDES), Maria Paloma Bernardi (UFRGS) e Carolina Rezende Faccin (UFRGS)]

— Capítulo 3: A crise da mobilidade urbana em Porto Alegre [André Coutinho Augustin (DEE/SPGG)]

— Capítulo 4: Para quem se governa em Porto Alegre? Uma análise do financiamento de campanha nas eleições municipais de 2020 [André Coutinho Augustin (DEE/SPGG) e Luciano Fedozzi (UFRGS)]

— Capítulo 5: O retrocesso da participação e a contrarreforma urbana [Luciano Fedozzi (UFRGS)]

— Capítulo 6: Ajustes regulatórios e projetos pró-mercado: os grandes projetos e reestruturação da metrópole [Paulo Roberto Rodrigues Soares (UFRGS), Pedro Azeredo de Ugalde (UFRGS), Henrique Dorneles De Castro (UFRGS), Vanessa Marx (UFRGS), Joana de Oliveira Winckler (UFRGS) e Julia Ribes Fagundes (UFRGS)]

— Capítulo 7: O Plano Diretor de Porto Alegre: Entre alterações e resistências [Mario Leal Lahorgue (UFRGS), Vanessa Marx (UFRGS) e Betânia de Moraes Alfonsin (FMP/RS)]

— Capítulo 8: Reivindicações e as lutas urbanas em Porto Alegre [Vanessa Marx (UFRGS), Karla Moroso (CDES) e Luciano Fedozzi (UFRGS)]

— Capítulo 9: Os sistemas alimentares – mobilizações comunitárias e políticas públicas ante à fome em Porto Alegre [Lucimar Siqueira (UFRGS) e Nicole Leal de Almeida (UFRGS)]

— Capítulo 10: Reforma Urbana e o Direito à Cidade em Porto Alegre: Reflexões para o futuro

Um dos artigos publicados no livro, que discute o financiamento de campanha nas eleições municipais de 2020, foi a base de uma matéria publicada pelo Sul21 em maio deste ano. A reportagem detalhou como os maiores doadores de oito vereadores da Comissão do Plano Diretor estabelecida na Câmara eram ligados ao mercado imobiliário.

Vanessa pontua que os temas apresentados nos diferentes artigos têm relações entre si, como por exemplo a discussão da habitação com os processos de lutas urbanas promovidas por movimentos sociais. Outra conexão é entre as mudanças de legislação que têm beneficiado o mercado da construção civil, o processo de revitalização do Centro Histórico promovido pela Prefeitura e a discussão do Plano Diretor.

“No Observatório, a gente vem produzindo artigos sobre essa inflexão ultra liberal na cidade e dessa questão que está retratada por uma fragmentação. A problemática que está acontecendo em Porto Alegre é uma cidade que está sendo completamente fragmentada em planos especiais e onde a gente não consegue ver a situação da cidade em sua totalidade com participação social. Então, por exemplo, a gente vê que a cidade está feita em planos, muitos desses planos foram aprovados durante a pandemia e de forma virtual, em audiências virtuais, de forma participativa virtual, o que na verdade, não representa, as vozes daqueles que sofrem as desigualdades na cidade. Então, a gente está vendo uma cidade que está sendo fragmentada e ao mesmo tempo está acontecendo a revisão de Plano Diretor, que seria esse instrumento que daria essa visão de totalidade da cidade, mas está sendo atravessado por esses planos. É isso que estamos considerando problemático na cidade”, diz.

A professora destaca que, por outro lado, houve um forte movimento na cidade nos últimos anos que pontuou a necessidade de uma outra política urbana. Por exemplo, a campanha Despejo Zero durante a pandemia de convid-19. Contudo, ressalta que estas ações, da Prefeitura e dos movimentos, não conversam.

“A questão das lutas acontecendo e da resistência acontecendo na questão das desigualdades e na questão das lutas urbanas, mesmo por moradia, por saneamento. A campanha Despejo Zero aparece. Ao mesmo tempo, parece que as coisas não conversam, de forma muito rápida, estão ocorrendo esses planos especiais, com pouca participação social. Porque isso não conversa com a questão de participação, o que é um pouco do que a gente trata no artigo de revisão do Plano Diretor”, diz. “É isso que a gente está considerando problemático na cidade”, complementa.

Ela acrescenta ainda que há uma série de outras temáticas atuais que não são aprofundadas neste volume, que também se articulam com o momento que a cidade vive, como a questão ambiental, cuja necessidade de discussão foi evidenciada pela passagem do ciclone extratropical pela Região Metropolitana de Porto Alegre nos dias 15 e 16 de junho. “A gente não toca muito na questão ambiental, que fica para o próximo livro que vamos organizar”, diz.


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