Agenda Clandestina
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9 de outubro de 2020
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17:10

Agenda Clandestina: 50 anos sem Janis Joplin

Por
Sul 21
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Revista Clandestina

Em 4 de outubro de 1970, o mundo se despedia de uma das figuras mais emblemáticas do rock: Janis Joplin. Mesmo 50 anos após sua morte, o legado de liberdade, intensidade e qualidade musical permanecem e se perpetuam na história. Nesta sexta-feira, a Agenda Clandestina homenageia e revisita a carreira e obra musical da cantora.

Foto: Zeta Filmes/Divulgação

Quem via a mulher dos cabelos rebeldes, com os grandes casacos de pele, os óculos redondos e os chapéus extravagantes dificilmente associaria Joplin à cidade de Port Arthur, no Texas. Município ao sul dos Estados Unidos, a Port Arthur de 1943, ano em que Janis nasceu, era marcada pelo conservadorismo e pela segregação racial. Foi nessa cidade que Janis cresceu e viveu a maior parte de sua adolescência. Durante a infância, Joplin já se mostrava diferente das outras crianças, com seu jeito moleca e contestador. Mas foi na adolescência que os problemas chegaram. Por não se enquadrar no padrão estético de suas colegas de classe – Janis tinha um corpo robusto e o rosto com traços marcantes -, Joplin foi constante alvo de piadas durante o colégio, episódios que a marcaram profundamente. “Janis ficou surpresa e depois oprimida por perceber a incapacidade de atingir o ideal social. Sempre tivera um ego forte e uma grande autoconfiança, mas no colegial começou a se questionar”, lembra Laura Joplin, irmã da artista, na biografia Com Amor, Janis.

Foi na arte que Janis encontrou o seu lugar de pertencimento. Ao entrar no grupo de teatro Little Theatre, ainda na adolescência, Joplin teve contato com mentes que compartilhavam as mesmas ideias, começando, assim, a se desenvolver como artista. Nessa época, Janis assumiu seu não-pertencimento e respondeu a todos incorporando o estilo beatnik e adotando uma postura de rebeldia, inconformada com os padrões da sociedade e valores convencionais. Em busca das referências que não encontrava na pacata Port Arthur, aos 18 anos, Janis se muda para São Francisco. Na Califórnia, Joplin inicia a carreira musical, se apresentando em pequenos bares e cafés. No entanto, os desafios de morar sozinha e os problemas com droga a fizeram retornar para o Texas um tempo depois.

Nessa ocasião, a artista se matriculou no curso de Belas Artes da Universidade do Texas, principalmente na tentativa de atender as expectativas dos seus pais. No entanto, a universidade se mostrou uma extensão do colégio, e Janis passou novamente a sofrer perseguições e bullying. O episódio mais marcante foi quando a universidade foi coberta com cartazes onde se lia “Vote no homem mais feio”, acompanhados de uma foto de Joplin. A situação a magoou de forma profunda. Depois disso, Janis decidiu largar o curso e investir na música. Assim, em 1963, Janis deixou o Texas e partiu novamente rumo a São Francisco. “Eu tinha que sair do Texas, baby. Cara, este lugar me deixa deprimida. Eu estive viajando pelo mundo, mas Port Arthur é o pior lugar que eu já estive. Eu acho que as pessoas daquele lugar não entendem, querido, eles riem da minha cara nas ruas”, cantava Joplin na letra de “Ego Rock”.

Foto: Zeta Filmes/Divulgação

Janis voltou a São Francisco no ápice do movimento hippie e da contracultura, encontrando seu lugar na cena musical dos anos 60. Em 1966, ela passou a integrar a banda Big Brother and the Holding Company, como vocalista. Influenciada por grandes nomes do jazz e do blues, como Billie Holiday, Etta James, Big Mama Thornton e Bessie Smith, a rouquidão e emoção da voz de Janis hipnotizava e seduzia a todos, assim como sua entrega nos palcos. “No palco faço amor com mais de 25.000 pessoas; depois vou para casa sozinha”, dizia a cantora. Em 67, a banda atingiu seu auge com a participação no Festival Pop de Monterey. A versão da canção “Ball and Chain” nos marcantes vocais de Janis foi um dos momentos mais memoráveis do festival.

Após o evento, a banda e Janis ganharam vida pública e reconhecimento, sendo noticiados em diversos jornais locais e nacionais. “Querida, mãe, enfim um dia tranquilo e tempo para escrever as boas novas. Estou me mudando para o meu novo quarto, em uma linda casa no campo. Deus, não encontro outra coisa para falar. Esta banda é minha vida toda agora. Estou totalmente comprometida e estou adorando. Queria te enviar estes recortes. Desde Monterey, tudo está acontecendo. O Jornal de Port Arthur tem algum assim? Se tiver, envie. Um dia, serei uma estrela. É engraçado, agora que está mais perto e provável de acontecer, ser uma estrela perdeu seu significado. Mas o que quer isso seja, estou pronta”, disse Janis em carta escrita para a mãe, reproduzida no documentário Janis: Little Girl Blue.

Os dois discos da banda, Big Brother & The Holding Company, de 1967, e Cheap Thrills, de 1968, foram um sucesso, vendendo milhões de cópias alguns dias após as estreias. Apesar disso, Janis deixou o grupo para seguir carreira solo e, em 1969, lançou seu primeiro álbum, I Got Dem Ol’ Kozmic Blues Again Mama. Nessa época, a pressão, as expectativas e as críticas se intensificaram sobre Janis. Foi nesse período que o consumo de álcool e drogas também se acentuou – vícios que já acompanhavam Joplin há algum tempo.

Foto: Zeta Filmes/Divulgação

No auge de sua carreira, Janis já se consolidava como um símbolo para sua geração. Em um gênero musical extremamente dominado por homens, o rock, e em meio a uma sociedade ainda mais machista e patriarcal que a atual, Joplin foi abrindo espaço para as mulheres que a sucederam. Com sua postura transgressora e livre, Janis aproveitou cada segundo da sua vida e cantou com tamanha intensidade e sentimento que sua voz ressoa até os dias de hoje. Janis morreu um pouco antes de ver o seu último álbum, Pearl, nas lojas. Em 1970, a cantora foi encontrada morta em um quarto de hotel de Los Angeles, vítima de uma overdose causada por uma heroína com índice de pureza acima do normal. “Foram poucos anos de produção musical, mas que deixaram uma obra muito forte. Eu atribuo o fato de ela ter se tornado uma das artistas mais emblemáticas a uma espécie de paixão muito transbordante. Nas canções, nas letras, nas composições, nas performances. Até hoje quando ouço Janis, eu sinto essa intensidade que transborda. Isso faz com que ela seja uma artista muito memorável para mim, muito presente para além do tempo dela”, ressalta Diogo Liberano, autor da dramaturgia Janis.

A atemporalidade de Janis Joplin é marcada por suas letras e melodias intensas e apaixonadas. Relembre alguns dos grandes sucessos conhecidos ou não —  da carreira da artista:

Piece Of My Heart

Little Girl Blue

A Woman Left Lonely

Cry Baby

Me and Bobby McGee


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