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20 de julho de 2012
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17:10

MPF denuncia militar por sequestro durante a guerrilha do Araguaia

Por
Sul 21
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Zenco Heshiki
Major da reserva Lício Augusto Maciel sequestrou Divino Ferreira dos Santos em 1973 | Foto: Zenco Heshiki

Da Redação

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou à Justiça Federal mais um militar acusado de ser responsável por crimes contra a humanidade durante a guerrilha do Araguaia, na década de 70, no sul do Pará. O major da reserva Lício Augusto Maciel, que usava na época o codinome de doutor Asdrúbal, foi denunciado pelo sequestro de Divino Ferreira de Sousa, o Nunes, capturado pelo Exército durante a repressão à guerrilha em 1973. A ação tramita na 2ª Vara da Justiça Federal de Marabá.

De acordo com as investigações do MPF, Divino foi emboscado no dia 14 de outubro de 1973 por militares chefiados por Lício, quando estava ao lado de outros integrantes da guerrilha. Ao avistarem os militantes, Lício e seus homens abriram fogo. Os outros três guerrilheiros foram executados e Divino foi sequestrado e levado com vida para a base militar da Casa Azul, em Marabá. Apesar de ferido, Divino foi interrogado e submetido a grave sofrimento físico em razão da natureza da detenção. Após isso, não mais foi visto.

O MPF afirma que a responsabilização penal de Lício Augusto Maciel decorre de participação inequívoca dele nos crimes relatados na denúncia, o que inclusive teria sido reconhecido por ele em depoimento prestado na Justiça Federal do Rio de Janeiro, em 2010. O sequestro de Divino aconteceu durante a denominada Operação Marajoara, última fase dos combates entre Exército e militantes.

A denúncia contra Lício é assinada pelos procuradores da República Tiago Modesto Rabelo, André Casagrande Raupp, Melina Alves Tostes e Luana Vargas Macedo, de Marabá, Ubiratan Cazetta e Felício Pontes Jr., de Belém, Ivan Cláudio Marx, de Uruguaiana, Andrey Borges de Mendonça, de Santos e Sergio Gardenghi Suiama e Marlon Alberto Weichert, de São Paulo.

“Especialmente nos casos de sequestro, além da perpetração de sevícias às vítimas para obter informação sobre o paradeiro dos demais dissidentes (tortura), seguiram-se atos de ocultação das condutas anteriores visando assegurar a impunidade e manter o sigilo sobre as violações a direitos humanos. Ou seja, ao sequestro clandestino segue a negativa estatal de sua própria ocorrência”, relataram os procuradores da República.

Primeiro denunciado pelo MPF foi Curió

Esta é a segunda ação penal movida pelo MPF contra militares envolvidos em crimes contra a humanidade e graves violações a direitos humanos durante a repressão violenta à guerrilha do Araguaia. O primeiro denunciado foi Sebastião Curió. A denúncia não foi aceita pela primeira instância – a Justiça Federal de Marabá – mas o MPF vai recorrer. Para o MPF, os crimes de sequestro praticados durante o regime militar não estão prescritos ou cobertos pelo manto da anistia por serem crimes permanentes, de acordo com decisões do próprio STF brasileiro e também da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

O MPF aponta que o STF decidiu, em dois casos de extradição de militares ligados a ditaduras latino-americanas, que a extradição deveria acontecer por se tratarem de casos de desaparecimento forçado, que o direito internacional considera como violações graves de direitos humanos sobre as quais não se aplica anistia ou nenhuma disposição análoga, seja prescrição, irretroatividade da lei penal, coisa julgada ou qualquer excludente similar.

Além disto, há a sentença que condenou o Brasil pelos crimes do Araguaia pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). A Corte ordenou que “o Estado deve conduzir eficazmente, perante a jurisdição ordinária, a investigação penal dos fatos do presente, a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja”.

Para o MPF, a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos deve ser obedecida a não ser que o país declare inconstitucional sua adesão ao sistema interamericano de direitos humanos. Para recusar a autoridade da Corte Interamericana, o Brasil teria que abdicar do sistema como um todo. “Decisão esta que esbarraria no óbice da vedação do retrocesso em matéria de direitos humanos fundamentais, além de importar claramente em violação do princípio da proibição da tutela deficiente dos direitos humanos”, defendem os procuradores.


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