Últimas Notícias>Política
|
24 de agosto de 2010
|
09:00

O legado midiático de Getúlio Vargas 56 anos depois

Por
Sul 21
[email protected]

Luciano Klöckner *

SUICÍDIO DE VARGAS

E atenção, atenção ouvintes do Repórter Esso.//
Rio.// O jornalista Carlos Lacerda foi ferido na madrugada de hoje num atentado à bala em frente à sua residência na rua Toneleros, em Copacabana./ No atentado, perdeu a vida o major aviador Rubens Florentino Vaz que acompanhava o diretor da Tribuna da Imprensa./ Um elemento da polícia de vigilância, que tentou perseguir os agressores, foi ferido.// (O Repórter Esso, 5 de agosto de 1954).

E atenção, atenção ouvintes do Repórter Esso.//
O Palácio do Catete acaba de informar oficialmente que o senhor Getúlio Vargas deixará o governo./ Todos os ministros de Estado encontram-se reunidos no palácio presidencial e a informação oficial é de que o presidente da República vai se licenciar por tempo indeterminado./ O vice-presidente, Café Filho, assumirá o governo.//  (O Repórter Esso, 24 de agosto de 1954).

E atenção.// Acaba de suicidar-se em seus aposentos no Palácio do Catete o presidente Getúlio Vargas.// (O Repórter Esso, 24 de agosto de 1954, edição extraordinária)

Atenção./ Aqui fala o Repórter Esso em edição extraordinária//.
RIO.// Conhecem-se agora mais alguns pormenores da morte do senhor Getúlio Vargas, que se suicidou esta manhã, às 8 horas e 26 minutos, em seus aposentos no Catete, com um tiro no coração./ Depois da dramática reunião, nesta madrugada, com o Ministério e numerosas outras autoridades, o senhor Getúlio Vargas retirou-se aos seus aposentos, com a fórmula já assentada de que entraria em licença do Governo espontaneamente até que se apurassem cabalmente as responsabilidades relativas ao crime da Rua Toneleros./ Uma vez aprovada sua nenhuma culpa, retornaria ao poder./ Eram então 3,30 horas./ Antes de retirar-se, recebeu abraços pelos que se encontravam na sala./ Já em seus aposentos, o senhor Getúlio Vargas mandou chamar o senhor João Goulart./ Este, antes de atender, chamou a um canto o senhor Hugo Farie, ministro do Trabalho, com o qual conferenciou a meia voz, acenando o titular do Trabalho com a cabeça, dizendo que sim./ Enquanto isso, os jardins do Catete estavam transformados em verdadeira praça de guerra desde as primeiras horas da noite de ontem./ As tropas do Exército eram reforçadas e colocadas em pontos estratégicos, enquanto os próprios civis eram recrutados para a defesa, inclusive as mulheres./ Notava-se por todos os lados um certo ‘ frisson’, semelhante a uma angústia indefinível.// (O Repórter Esso, 24 de agosto de 1954, edição extraordinária).

56 anos após o suicídio que abalou boa parte da população brasileira, Getúlio Dornelles Vargas permanece muito vivo nas notícias da mídia que tão bem soube utilizar. 56 anos após a morte do revolucionário, do estadista, do ditador e do suicida, o legado de Vargas ainda é dividido por aliados e opositores, especialmente próximo às eleições. Talvez poucos presidentes tenham aproveitado de maneira tão eficaz as informações divulgadas pela imprensa. Primeiro foram as charges, muitas ridicularizando-o, que invariavelmente eram recebidas com um sorriso largo por Vargas. Depois, o rádio, sua grande paixão midiática, centrada no principal noticiário da época: O Repórter Esso. Em depoimento prestado ao autor, o filho do locutor Heron Domingues, Heron Domingues Júnior, disse que, durante a Segunda Guerra Mundial, o presidente e o locutor se encontraram no Palácio do Catete, ocorrendo o seguinte diálogo:

– Heron, por que O Repórter Esso não transmite notícias sobre a Força Expedicionária Brasileira?

Ao que o locutor Heron Domingues respondera:

– Ora, senhor presidente, há uma lei que impede a veiculação de notícias locais…

O presidente, dirigindo-se ao seu chefe de gabinete, ordenou:

– Vamos corrigir essa lei imediatamente!

E foi mesmo alterada, propiciando a divulgação de notícias da FEB. Nas Américas Central e do Sul, o Esso chegou a reboque da Política da Boa Vizinhança, nos anos 30. Na realidade, nem o termo e nem a ideia eram novos. Alguns anos antes, o presidente dos Estados Unidos, Herbert Hoover, em viagem à América Latina, havia usado a expressão good neighbor nos discursos, que seria adotada, em 1933, por Franklin Delano Roosevelt. Era comum, na época, que a colônia alemã, localizada, em especial, no extremo sul da América Latina, se informasse do avanço das forças nazi-fascistas na Europa, a partir das ondas da Rádio Berlim. Dessa forma, as emissões dos Estados Unidos, via Voice of América (VOA), não deixaram de apresentar um certo contraponto a uma situação existente nas Américas, e que preocupava, sobremaneira, os países aliados, uma vez que existia a simpatia, de parte de governantes americanos, pela política nazi-fascista, representando um ideal de governo.

“Na Segunda Guerra, as nações
do Terceiro Mundo foram
pressionadas a optar por uma facção”

Durante a Segunda Guerra Mundial, de 1939 a 1945, as nações do Terceiro Mundo foram pressionadas a optar por uma das facções. De um lado, o eixo, formado por Alemanha, Itália e Japão. No outro extremo, os aliados, liderados por Grã-Bretanha, França e União Soviética; e, a partir de 1941, pelos Estados Unidos. Nestes seis anos de conflito, destacou-se a Política da Boa Vizinhança, visando a aproximar os países da América Latina da cultura e da ideologia norte-americana. O objetivo era único: que o Brasil defendesse os interesses dos aliados na Segunda Guerra, o que, de forma efetiva, ocorreu em 1942.

Antes de a primeira edição do Esso ir ao ar, no mesmo ano de 1941, desembarcaram, no Brasil, os representantes do Birô Interamericano, criado pelo presidente Franklin Delano Roosevelt, para aproximar os Estados Unidos dos países da América Latina. A tática, denominada de Política da Boa Vizinhança (Good Neighbor Policy), tinha por objetivo estreitar as relações econômicas e culturais. O Office for the Coordination of Commerce and Cultural Relations between the American Republics começou a atuar em 16 de agosto de 1940, nos Estados Unidos, em resposta à propaganda nazista na América Latina. Através de programas radiofônicos, transmissões da Voice of America e revistas do porte da Time, Life e Seleções Reader’s Digest, eram divulgadas mensagens do governo norte-americano, visando a neutralizar a forte presença alemã, italiana e japonesa nesta parte da América. Mais tarde, a agência estimularia a criação de histórias e de filmes de Walt Disney, com personagens dos países latino-americanos, auxiliando no convencimento das populações em relação à boa vontade dos Estados Unidos (TOTA, 2000, p 50).

O avanço do exército alemão na Europa Ocidental animava algumas autoridades brasileiras e mundiais, preocupando os Estados Unidos, que redobraram a atenção sobre a América Latina. O Brasil era presidido por Getúlio Dornelles Vargas e atravessava um momento político delicado, com a instituição de um regime arbitrário, o Estado Novo (1937-1945), de inspiração nazi-fascista.

GETÚLIO DORNELLES VARGAS

Vargas era filho de uma família de estancieiros gaúchos da fronteira com a Argentina, com raízes caudilhistas. Entrou para a carreira militar e destacou-se na política estudantil, demonstrando desde cedo muita astúcia e habilidade para negociar. Líder da maioria na Assembléia do Rio Grande do Sul, foi deputado federal, em 1923, lutou contra os libertadores no mesmo ano e virou ministro da Fazenda em 1926.

Herdeiro político de Borges de Medeiros, Vargas disputou, pela Aliança Liberal (MG, RS e PB), em 1º de março de 1930, a eleição direta para a presidência da República, tendo como vice o paraibano João Pessoa. No pleito, perdeu por diferença de 300 mil votos para o paulista Júlio Prestes, que fez 1 milhão de votos. Alguns meses depois, em 31 de outubro de 1930, Vargas entrou de forma triunfante no Rio de Janeiro, impedindo a posse de Júlio Prestes, marcada para novembro: era a Revolução de 30. Com uniforme militar, lenço vermelho no pescoço e chapéu de aba larga, em três de novembro, foi nomeado chefe do governo provisório, substituindo o paulista Washington Luís (BUENO, 1998, p. 224 e 225). Era o fim da República Velha, da política café-com-leite, alternando no poder, presidentes mineiros e paulistas.

Em 10 de novembro de 1937, Vargas instaurou o Estado Novo, com feições ditatoriais, contrariando a própria plataforma de governo, anunciada sete anos antes, de “restituir a democracia e a liberdade do povo, recuperando a economia.” Aos poucos, foi rompendo com aliados, como Borges de Medeiros, Osvaldo Aranha, Flores da Cunha, entre outros, e mostrando uma personalidade mais autoritária. Apesar disso, com uma legislação tutelar e paternalista, o governo do Estado Novo ganhava popularidade, o que valeu a Getúlio a alcunha de “pai do povo”. Destituído em 1945, depois da vitória aliada na Segunda Guerra, Vargas ainda voltaria ao poder em eleições diretas, em 1950, para o terceiro governo. Nele, se envolveria em outra questão polêmica: a exploração nacional do petróleo e a criação da Petrobrás em 1953 (BUENO, 1998, p. 229 e 233).

“O rádio exercia fascínio
no povo e mobilizava
as massas, no Brasil”

Na época, apesar do grande e eficaz poderio dos jornais impressos, era o rádio que exercia fascínio no povo e mobilizava as massas. O despertar, para essa novidade, ocorreu em 7 de setembro de 1922, quando 80 rádios-galena foram distribuídos, para captar o discurso do Presidente Epitácio Pessoa na abertura da Exposição-Feira Mundial, no Rio de Janeiro. O número de emissoras e de aparelhos receptores cresceu rapidamente. Nos anos 20, existiam 19 emissoras; em 1940, elas já somavam 78; em 1944, 106; em 1945, 111; em 1946, 136; em 1947, 178; em 1948, 227; em 1949, 253, chegando a 1950 com 300 emissoras (HAUSSEN, 2001, p. 56).  Do mesmo modo, o número de radiorreceptores, que era de 30 mil em 1926, chegou a 659.762 em 1942 (WAINBERG, 1997, p. 43 e 44).

Trinta e três anos depois da primeira transmissão existiam, no Brasil, 477 emissoras de rádio, e o total de aparelhos receptores atingia quase 1 milhão (O DIA…, 1994, p. 14). Os números atestam a importância da recepção radiofônica na primeira metade do século passado, situação somente ameaçada, alguns anos depois, com a televisão, onde a imagem e o som se uniram, num único aparelho, que, hoje, é quase tão portátil quanto o rádio. Até essa situação se inverter, o rádio recebeu todos os investimentos possíveis e fez experiências de programas que estão aplicadas em outras mídias e suportes, como a própria Internet.

UTILIZAÇÃO DO RÁDIO COMO INSTRUMENTO POLÍTICO

A radioescuta desempenhou papel fundamental nas duas guerras mundiais, utilizada para os comunicados na frente de batalha e nas atividades de contra-informação. Os países, envolvidos nos conflitos, através de setores específicos e das agências de notícias, designavam tradutores, para acompanhar as irradiações em língua estrangeira.  Com isso, a radioescuta se tornou primordial, visando a identificar o que realmente ocorria, suprindo as deficiências do noticiário oficial, sujeito à censura parcial ou total.

Nos anos 30, na Alemanha, os nazistas fizeram do rádio o ideal de propagação ideológica. Cerca de 70% das famílias alemãs possuíam aparelhos em casa. A importância do rádio era tamanha que o governo patrocinou a fabricação de receptores e estimulou a instalação em fábricas, escritórios, bares, restaurantes e praças para audições coletivas (WYKES, 1975, p. 94).

Na mesma época, o presidente dos Estados Unidos, Franklin Delano Roosevelt (1932-1945), utilizou-se de transmissões radiofônicas, para atingir a população. Por isso, ele recebeu o título de “Presidente do Rádio”. Partiu dele a iniciativa de realizar o programa fire side chats (conversa ao lado da lareira ou ao pé do fogo, segundo a tradução literal), divulgando as ações contidas na política do New Deal, de incentivo ao desenvolvimento econômico e maior justiça social (MOREIRA, 1998, p. 11; TOTA, 2000, p. 38).

“A preferência dos brasileiros,
a partir de 1930, recaiu sobre o
noticiário político e esportivo”

O Brasil percorria o mesmo caminho. Logo, a preferência do público, especialmente a partir de 1930, recaiu sobre o noticiário político e esportivo. Em 1932, o radiojornalismo das emissoras de São Paulo e do Rio de Janeiro mostra a luta entre legalistas e rebeldes paulistas, em especial, o lado que o Governo Provisório de Vargas não quer revelar. Três anos depois, ciente da dimensão que o veículo rádio obtivera, ao criar o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (absorvido, mais tarde, pelo Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP), o Governo Vargas põe no ar a Hora do Brasil, programa obrigatório, retransmitido por todas as emissoras.

Em 1937, a notícia do golpe de Estado de 10 de novembro – o Estado Novo – chega ao conhecimento público em cadeia radiofônica. Em 1940, cerca de um ano depois do início da Segunda Guerra Mundial, a Rádio Tupi lança o Boletim de Guerra. Antes disso, os brasileiros tinham conhecimento das informações do conflito, através das transmissões em ondas curtas das emissoras CBS e NBC, dos Estados Unidos, e BBC, da Grã-Bretanha. Todas transmitiam programas em português.

Em 1940, três agências de notícias forneciam o noticiário de rádio no País: a Agência Nacional – produtora de a Hora do Brasil e depois Voz do Brasil e de programas especiais cívicos –, a Meridional, dos Diários Associados, e a Asa Press. Na época, a lei vetava às agências estrangeiras – como era o caso da United Press, produtora de O Repórter Esso – o direito de distribuir dentro do território nacional as notícias, feitas aqui. Elas podiam fornecer notícias do exterior e transmitir para os outros países as notícias coletadas no Brasil.

Em 27 de dezembro de 1939, Vargas cria o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), ligado diretamente à Presidência da República. No artigo 2º, alínea “i”, sobre os fins do DIP, está o de “colaborar com a imprensa estrangeira no sentido de evitar que se divulguem informações nocivas ao crédito e à cultura do País”, e no “n”, “proibir a entrada no Brasil de publicações estrangeiras nocivas aos  interesses  brasileiros,  e  interditar, dentro  do  território nacional, a edição de quaisquer publicações que ofendam  ou  prejudiquem  o  crédito  do  País e suas instituições ou a moral” (CARONE, 1976, p. 32).

“O rádio foi a ferramenta de
resistência ao nazismo. A BBC
era ouvida por 16 milhões de pessoas”

No período da Segunda Guerra, foi através do rádio que a BBC ofereceu resistência aos territórios europeus, ocupados pelos nazistas. A emissora britânica irradiava noticiosos em francês, italiano, alemão, português e espanhol para um público calculado em cerca de 16 milhões de pessoas. Ainda nos anos 50, na Argentina, Juan Domingo Perón utilizou-se do rádio como instrumento de propaganda política. Na mesma década, a Rádio Rebelde, de Cuba, sob o comando de Fidel Castro e Ernesto Che Guevara realizou transmissões a partir de Sierra Maestra (MOREIRA, 1998, p. 13; HAUSSEN, 2001, p. 81). Entre agosto e setembro de 1961, a partir de Porto Alegre, é formada a Cadeia da Legalidade, com mais de 100 emissoras. O governador gaúcho Leonel Brizola defendeu a posse do vice-presidente João Goulart no lugar de Jânio Quadros, que renunciara à presidência. A pressão deu resultado: João Goulart assumiu a presidência, mas em regime parlamentarista (FELIZARDO, 1988, p. 29).

Três anos depois, outra rede é composta: a Rede da Democracia. Ela se opõe a outra cadeia nacional de inspiração legalista, mas de tendência esquerdizante. A Rede da Democracia, conservadora, desempenha papel fundamental no desfecho do movimento militar que dá o golpe de 1964, com a deposição do presidente João Goulart. Também, é pelos meios eletrônicos que o País toma conhecimento, em 1968, do Ato Institucional número 5. Uma rede nacional de rádio e televisão, convocada pela Agência Nacional, comunica a edição do AI – 5, que consolida a ditadura militar, cancelando as últimas franquias, dissolvendo os partidos e instaurando a censura fato.

Em todo o mundo, o rádio é o meio de comunicação mais difundido, conforme dados da UNESCO (1983, p. 94). Até 1987, a UNESCO calculava que existissem mais de 5 bilhões de receptores no planeta, 50 milhões dos quais na América do Sul.  De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1999, o Brasil tinha 39,4 milhões de lares com rádio e 38,4 milhões com TV. Dois anos mais tarde, o quadro se inverteu e a televisão passou a estar presente em 41,4 milhões de domicílios, ante 40,9 milhões em rádios (acessocom.com.br, 2002, setembro, “número de aparelhos de TV já supera o de rádios”). No entanto, o rádio permanece com o magnetismo original e junto com a internet, conforme pesquisa do Vox Populi, do final de 2009, mantém-se na liderança no item credibilidade.

DISSEMINAÇÃO IDEOLÓGICA E AS NOTÍCIAS DA GUERRA

Paralelamente à evolução do rádio, como Meio de Comunicação de Massa, ocorreu, nos anos 30-40, a disseminação da ideologia norte-americana, estimulada pela instalação, no Brasil, das primeiras multinacionais (indústrias em geral, agências de publicidade e propaganda, e agências de notícias). Com isso, se estabeleceu uma polarização de interesses: de um lado, os defensores dos valores dos Estados Unidos e da internalização de capitais estrangeiros no País; de outro, os nacionalistas, opostos a qualquer ingerência externa.

A luta passou pelos meios de comunicação, pois havia a intenção de conquistar a opinião pública e, se possível, influenciá-la. Assim, muitas vezes, a notícia mais importante podia não ir ao ar, suprimida pela censura ou por interesses políticos específicos ou, ainda, se transformar numa espécie de notícia dirigida, cujo propósito era o de fazer propaganda.

Ao longo da história, a informação, transformada em notícia, passou por várias fases e conceituações.  Joseph Goebbels, nos anos 30, era categórico, ao afirmar que “a notícia se constituía em uma arma de guerra”. No livro Mein Kampf, de Adolph Hitler, uma das citações sugeria que: “a verdade tem de ser sempre adaptada para ajustar-se à necessidade e que a propaganda é um meio utilizado para fazer alguém aceitar um princípio, uma teoria, uma doutrina através das emoções. Os propagandistas apelam não para a razão, mas sempre para a emoção e o instinto. O objetivo da propaganda não é tentar julgar direitos conflitantes, dando a cada um o que merece, e sim salientar exclusivamente o direito que estamos defendendo (WYKES, 1975, p. 39 e 40)”.

Como parte da propaganda, a notícia seria influenciada por esses princípios, em especial nas revoltas populares e durante os conflitos bélicos (Primeira e Segunda Guerra Mundial, Guerra Fria e Guerra da Coréia). Na Primeira Guerra (1914-1918), por exemplo, os Estados Unidos criaram o Committee on Public Information, ligado diretamente à presidência. O organismo não só tinha por objetivo “vender a guerra ao público norte-americano” como também funcionava como um serviço de censura. Os jornalistas foram impedidos de fazer qualquer crítica em relação à política governamental. O processo se repetiu, aparentemente de maneira mais branda na Segunda Guerra (1939-1945), mas voltou a recrudescer em conflitos mais recentes como na intervenção dos marines na Ilha de Granada, em 1983, na Guerra do Vietnã (1962-1975 ) e na Guerra do Golfo (1990-1991/2) (MATTELART, 1994, p. 62).

” Vargas utilixou o rádio
para consolidar o poder,
em seus dois governos”

Durante e depois da Primeira Guerra, vários países fundam organismos específicos para propaganda e controle da informação.  A França  criou a Maison de la presse, a  Grã-Bretanha  o Empire Marketing Board, a Alemanha o Escritório de Notícias e os Estados Unidos o Office of Inter-American Affairs (OIAA). Todas as iniciativas, através de notícias em jornais, filmes-documentários, emissões radiofônicas intercontinentais e outras ações procuravam publicizar os atos do governo e atrair a simpatia dos públicos interno e externo. No Brasil, o governo Vargas (1930-1945, 1950-1954), também se utilizou de jornais e emissões radiofônicas, entre outros artifícios, para consolidar o poder.

Temendo uma possível adesão do Estado brasileiro ao nazismo, os Estados Unidos demonstraram interesse particular pelo Brasil durante a Segunda Guerra. Numa ação fulminante e eficaz, as autoridades americanas aproximaram-se do Governo Vargas e ofereceram benefícios econômicos e culturais da Política de Boa Vizinhança.

OS ANOS 40 E O MONOPÓLIO DA RÁDIO NACIONAL

Os anos 40 foram caracterizados, basicamente, pela Segunda Guerra Mundial e pela organização dos governos dos continentes entre os países do eixo e os aliados. A Alemanha avançava pela Europa e os Estados Unidos, em princípio, demonstrando neutralidade no conflito que se desenrolava na Europa, se preparavam para entrar na guerra. O período é conhecido como a Época de Ouro do rádio, com a consolidação do veículo como Meio de Comunicação de Massa e a audiência em constante ascensão.

Durante o conflito, houve várias batalhas no campo dos veículos de comunicação. O radiojornalismo vivia a sua infância e concorria com os jornais matutinos e vespertinos. Entretanto, o vespertino começa a vencer essa escaramuça, com várias edições, inclusive, durante o dia, quando os noticiosos eletrônicos entram na fase adulta (BAHIA, 1990b, p. 77 e 86). Os jornais se adaptam à presença do rádio e, depois da Segunda Guerra, as mudanças são inevitáveis, com uma sistematização interna e externa das redações, os textos diminuem e o lide (originário do lead) é adotado como primeiro parágrafo das notícias.

“A partir dos anos 30, o rádio
se firmou, no Brasil, como
meio de comunicação de massa”

O rádio no mundo e também no Brasil ainda era objeto de curiosidade nos anos 20. Em 1922, durante a Exposição do Centenário da Independência, foram realizadas as primeiras transmissões no Rio de Janeiro. De forma efetiva, a partir dos anos 30 é que o rádio se firmou como meio de comunicação de massa: abandonou características elitistas e começou a se massificar, visando à conquista da classe média urbana do Brasil.

A partir de 1939, o Brasil recebia emissões estrangeiras de várias emissoras, através das ondas curtas (SW – short waves): o rádio estava globalizado. As ondas da Rádio Berlim, da BBC, da Voz da América, entre outras, privilegiavam audições em português. As populações de outros países também ouviam as programações especiais na língua nativa (TOTA, 2000, p. 144).

Nessa época, surgiram várias emissoras no Rio de Janeiro: a Mayrink Veiga, ligada à família do mesmo nome, a Cruzeiro do Sul, dos Byngton, proprietários de grandes casas comerciais e importadoras, e a Rádio Phillips do Brasil, pertencente ao grupo holandês, fabricante de aparelhos elétricos e rádios da mesma marca, que depois se transformaria na Rádio Nacional. As empresas jornalísticas, também, perceberam a importância do meio e fundaram as rádios Jornal do Brasil e Tupi, do Rio e de São Paulo, as duas últimas, ligadas aos Diários Associados.

Em fins dos anos 30, a Nacional era a segunda maior emissora em audiência no Rio de Janeiro, sendo superada apenas pela Mayrink Veiga – posições que se invertem na década seguinte, ainda durante o primeiro Governo Vargas. A emissora permaneceu na liderança da audiência durante o período do Presidente Eurico Gaspar Dutra, no segundo Governo Vargas e no início do período de Juscelino Kubischek, somente perdendo espaço nos anos seguintes.

A possibilidade de levar a mensagem a vários pontos do País conferia ao rádio um poder difusor, sem precedentes na história mundial. A partir deste conceito, é que nasceu, no Rio de Janeiro, uma emissora que se constituiria na maior do Brasil: a Rádio Nacional, PRE-8. A iniciativa partiu dos proprietários do jornal A Noite, com sede no edifício da Praça Mauá. Do grupo, faziam parte as revistas Carioca, Noite Ilustrada e Vamos Ler, além da Editora A Noite. A Rádio Nacional começou a se destacar pela programação e pela potência.

“Na primeira metade do século 20,
a Rádio Nacional se constitui
num fenômeno de comunicação”

Inaugurada em 12 de setembro de 1936, às 21 horas, a Nacional se constituiu num fenômeno de comunicação de massa da primeira metade do século, um dos mais eficazes instrumentos de propagação cultural verificado até então. No entanto, até 1939, a Rádio Nacional enfrentou crises. Ela fazia parte do grupo empresarial que abrangia a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, o jornal A Noite, e a Rio Editora, detentora de uma dívida de três milhões de libras esterlinas.

A situação melhorou a partir de 8 de março de 1940, quando o governo de Getúlio Vargas encampou todas as organizações do grupo, através do  Decreto-Lei nº 2.073, criando as Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União. Houve, no início, incerteza de parte dos funcionários da rádio, pois o novo diretor era Gilberto de Andrade, conhecido censor de teatro, durante os anos 20, e, promotor do Tribunal de Segurança do Estado Novo, condenando vários profissionais à prisão. No entanto, ele fortaleceu a emissora, colocou-a na liderança da audiência, incentivou profissionais e aperfeiçoou a programação.

Em 1943, a Nacional recebia cartas de vários países, conseqüência da instalação, um ano antes, de uma estação de ondas curtas de 50 quilowatts de potência e oito antenas, sendo duas voltadas para os Estados Unidos, duas para a Europa e uma para a Ásia. As outras três foram dirigidas para as principais regiões do território nacional. Com uma programação padronizada, a emissora atingiu, em 1952, no Rio de Janeiro, 50,2% de audiência média. Foi considerada, por muito tempo, a melhor do Brasil. Os destaques da programação eram os musicais e as radionovelas (GOLDFEDER, 1980, p. 39). A primeira novela no rádio, Em Busca da Felicidade, do autor cubano Leandro Blanco, adaptada por Gilberto Martins, estreou na Nacional em 12 de julho de 1941. Ao todo, a Rádio Nacional veiculava, diariamente, mais de 20 programas entre radionovelas e radioteatros.

A Rádio Nacional não serviu apenas à integração nacional, “mas sim a um modelo mais definido de ação política posto em prática no período de 1930-1945” (SAROLDI e MOREIRA, 1988), reforçando a autoridade política do governo e divulgando a ideologia desenvolvimentista em que a indústria era o principal foco. A adoção do modelo desenvolvimentista trouxe ao Brasil vários investidores internacionais, e, com eles, as primeiras agências de publicidade e de notícias estrangeiras nos anos 30, ligadas aos principais clientes e interessadas na comercialização de produtos no grande mercado consumidor da América Latina, entre elas, a J. W. Thompson e a McCann-Erickson.

AS RADIOSNOVELAS E AS NOTÍCIAS

A publicidade, no rádio, foi liberada em 1º de março de 1932, através do Decreto-Lei no 21.111, do Governo Federal. Até esta data, somente eram permitidos os patrocínios a horários de programas. Com a nova lei, os anúncios ou “reclames” se multiplicaram rapidamente (CASÉ, 1995, p. 47). Era comum até os anos 60, especialmente no rádio e depois na TV, associar os nomes dos programas aos de empresas nacionais e estrangeiras. No jornal, isso não era possível. Nesses, a publicidade se limitava às páginas internas, reduzindo, de forma aparente, a influência direta no conteúdo da informação. Os norte-americanos foram os que melhor souberam explorar esta tendência.

Uma das preocupações era a de oferecer programas jornalísticos, transmitidos pelas emissoras locais. Em 1939, a Esso já patrocinava, na Rádio Nacional, o programa radiofônico Variedades Esso e, em 1940, a narração de jogos de futebol, denominados, na época, de matches. Com tão fortes predicados, o patrocinador e os produtores do Repórter Esso não tiveram dúvida ao escolher a Rádio Nacional para a transmissão do noticioso. Além de grandes astros e estrelas da música e do teatro, a emissora detinha, também, o melhor quadro de locutores do País, entre eles, Rubens Amaral, Celso Guimarães, Romeu Fernandes, Saint-Clair Lopes e Heron Domingues, que ficaria famoso ao ler de forma exclusiva o Repórter Esso.

“O Repórter Esso acompanhou
a viagem do presidente
Gaspar Dutra aos Estados Unidos”

Entre as notícias que receberam destaque nos Anos 40, estão a internalização de 16 navios do Eixo, que estavam em portos brasileiro em 28 de agosto de 1941 (1ª edição de O Repórter Esso), o ataque de aviões japoneses à base norte-americana de Pearl Harbor, em  sete de dezembro de 1941; a declaração de guerra do governo brasileiro aos países do eixo em 22 de agosto de 1942; o envio da Força Expedicionária Brasileira à Itália em 1943; o desembarque das forças aliadas na costa normanda da França em seis de junho de 1944; a conquista da fortaleza nazista de Monte Castelo pela FEB em 21 de fevereiro de 1945, a rendição da Alemanha em nove de maio; o lançamento da bomba atômica sobre Hiroshima e Nagasaki, respectivamente, em seis e nove de agosto de 1945, a rendição do Japão em 14 de agosto de 1945, a renúncia do presidente brasileiro Getúlio Vargas em 29 de outubro de 1945, a divulgação dos resultados da eleição para a Presidência da República a partir de dois de dezembro de 1945 e o início da Guerra Fria. Ainda, em nível nacional, o Partido Comunista do Brasil é colocado fora da lei e o Brasil rompe relações com a, então, União Soviética, em 1948. Um ano depois, em 1949, O Repórter Esso realiza um feito sem precedentes, para a época: acompanha o presidente Eurico Gaspar Dutra aos Estados Unidos, transmitindo edições de todos os pontos do território visitado pelo Presidente brasileiro.

As notícias dos anos 40 apresentaram como característica o conflito mundial: a Segunda Guerra. Das edições localizadas na pesquisa, os assuntos principais concentram-se na Segunda Guerra, no Pós-Guerra, na luta do Capitalismo X Comunismo e o posicionamento dos países em relação a uma Política Internacional.

Até 1945, as notícias se restringem à guerra (ataque dos japoneses a Pearl Harbor e a rendição da Alemanha, da Itália e do Japão). Os discursos, com muitos adjetivos, valorizavam o feito das tropas aliadas (inclusive da Força Expedicionária Brasileira), a Política de Boa Vizinhança e preconizam a união definitiva das Américas contra os agressores mundiais.  Também o lançamento da bomba atômica sobre Hiroshima e Nagasaki confere um certo tom de mistério a essa nova e poderosa arma, capaz de varrer cidades do mapa múndi.

No Pós-Guerra (fim de 1945 até 1950), os assuntos do noticioso versam sobre a queda dos ditadores e o restabelecimento da democracia (renúncia de Getúlio Vargas), a criação de Israel e a possibilidade dos Estados Unidos terem feito conchavos com ditadores da América Latina. Com a Guerra Fria, o Comunismo e o Capitalismo passam a freqüentar os discursos, sempre em tom de desafio ou de denúncia (Perón acusa os consórcios capitalistas internacionais de atentarem contra a vida dele e da esposa).

Renunciou o Presidente Getúlio Vargas./ A decisão presidencial foi anunciada depois que forças da vila militar, sob o comando do General Renato Paquet, avançaram pela rua Paissandu, rumo ao Palácio Guanabara./ Assumiu o governo, o Ministro José Linhares, Presidente do Supremo Tribunal Federal.// (O Repórter Esso, 29 de outubro de 1945).

Em meio à nova reorganização geográfica do mundo do Pós-Guerra, a Política Internacional ocupa boa parte das notícias, preconizando a defesa conjunta e ajuda mútua dos países americanos (Tratado do Rio de Janeiro, 1947). Até mesmo o Papa Pio XII se manifesta, falando em francês, que “o mundo se encontra ante uma verdadeira encruzilhada e que 1948 será um ano de graves resoluções”.

Os anos 40 se encerram com perspectivas democráticas, especialmente nos Estados Unidos, preparando novos tempos para a década de 50. Porém uma nova guerra se inicia e as tendências entre as duas nações-pólo do mundo ficam acirradas, comprometendo as visões mais otimistas. Qualquer tema em discussão no planeta recebe diferentes versões e interpretações, aparecendo com maior nitidez a intenção de controlar as fontes de energia, em especial, das jazidas de petróleo, espalhadas pelos diferentes continentes.

Com o fim da guerra e a proposta de democracia vencendo no mundo, as ditaduras perderam força, e o desgaste político do Estado Novo afastou o Presidente Getúlio Vargas do poder em 1945. No Brasil, foram realizadas eleições diretas vencidas pelo General Eurico Gaspar Dutra, que governou de 1946 a 1951. Durante o Governo Dutra foi fechada a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) e promulgada a nova Constituição (1946). O Partido Comunista foi colocado na ilegalidade (1947) e o Brasil rompeu relações diplomáticas com a União Soviética (1948).

“Decreta de Getúlio garantia ao
Governo direito de rever as
concessões a cada três anos”

Novas eleições foram realizadas em 1950. Getúlio Vargas venceu, assumindo a Presidência da República em 1951. Ao tomar posse, Vargas baixou o Decreto nº 29.783, considerado pelos donos das emissoras um atentado à liberdade da radiodifusão. O decreto garantia ao Governo o direito de rever a cada três anos as licenças de concessões de canais, concedidas com o prazo máximo de dez anos, submetendo-os à cassação e não oferecendo garantias aos proprietários.

Começam novos conflitos nos anos 50: no mundo, a Guerra Fria entre capitalismo e comunismo, e, no Brasil, a batalha pela nacionalização na exploração do petróleo. O Presidente Getúlio Vargas defendia esta política que ia frontalmente contra o desejo das organizações e dos veículos de imprensa que defendiam a livre iniciativa.

ANOS 50 E O RETRATO DO VELHO VOLTA PARA O MESMO LUGAR

Modernização é a palavra mais falada e ouvida nos anos 50. O final da Segunda Guerra consagra um tempo político democratizante, com o fim da ditadura do Estado Novo e da censura. A liberdade política é obtida, ainda, em meados dos anos 40 com a eleição de um novo presidente. No ano seguinte, uma nova Constituição. A notícia e a opinião têm seus conceitos retificados e dão substância ao papel dos veículos no encaminhamento de questões políticas e institucionais. Nos anos 50, o Brasil  está com 50 milhões de habitantes, seis milhões de eleitores e uma taxa de analfabetismo de 70 %.

A abertura que resulta da erosão da ditadura (Vargas) propicia a formação das correntes de opinião que consolidam um breve, mas salutar período constitucional, novamente golpeado em 1964. Nesses quase 20 anos democráticos o país se revitaliza, os partidos funcionam, a industrialização se acentua, o jornalismo marca a sua contribuição histórica […] A evolução do jornalismo nos anos 50 e 60 tem muito a ver com o processo social e industrial que a experiência política demarca a partir de 1945 (BAHIA, 1990b, p. 107).

A década começa com um novo veículo de comunicação: a televisão, que associa a imagem ao som, numa dimensão reduzida em relação ao cinema, mas ampliada em relação ao rádio. Na área política, Getúlio Vargas, após um período auto-exilado na fazenda Itu, em São Borja, no Rio Grande do Sul, voltava ao poder pelo voto direto. Em pouco mais de quatro anos, saiu do auto-exílio, foi aclamado pelo povo, retornou ao poder e, pressionado, suicidou-se, em 1954.

O mundo vivia sob o clima de beligerância. Os comunistas haviam atravessado o paralelo 38, começava a Guerra da Coréia, que se estendeu até 1953. Era perceptível vislumbrar apenas dois horizontes ideológicos básicos: o livre mercado, fomentado pelo capitalismo, e o socialismo, amparado pelo comunismo. Havia uma polarização bem delineada; de um lado, os Estados Unidos; do outro, a União Soviética. Em 1956, numa demonstração de força, a União Soviética esmaga a rebelião anticomunista da Hungria e, três anos depois, Fidel Castro vence a revolução cubana.

“Nos anos 50, maioria das
notícias do Repórter Esso era
sobre a luta contra o comunismo”

A maioria das notícias do Esso se concentrava na luta contra a agressão comunista. Em um dos textos, o Vaticano, através do Papa Pio XII, se manifestava sobre a questão, com declarações contundentes. Na Alemanha Oriental, de governo comunista, se iniciava a construção do muro de Berlim, marco físico da divisão do mundo, posto abaixo por uma multidão, exigindo democracia, em 1989. No esporte, o Brasil havia perdido a Copa do Mundo, para o Uruguai, em jogo realizado no Maracanã, Rio de Janeiro. Mas a linguagem publicitária explorava a idéia de que um automóvel era que nem um team de futebol, “precisava de funcionamento uniforme, onde cada peça era importante”.
Economicamente, as superpotências se dedicavam ao controle das fontes de petróleo. Em nível nacional, as notícias tratavam da fundação da Petrobrás. No entanto alguns telegramas noticiavam a exploração petrolífera, mas somente em outros países. Ao final da década, soviéticos e norte-americanos realizaram os primeiros ensaios para a conquista do espaço, numa representação do que havia se transformado a Guerra Fria: um esquadrão de pesquisadores a desenvolver tecnologias de ponta e um batalhão de espiões a tentar descobrir os segredos do adversário. A conquista do espaço representava, entre outras coisas, o desenvolvimento de foguetes capazes de atingir, com ogivas nucleares, outros continentes, ameaçando a segurança das duas principais nações da Terra.

A então União Soviética lança o primeiro satélite artificial do mundo, em 1957: o Sputnik I. E, no mesmo ano, manda o primeiro ser vivo rumo ao espaço: a cadelinha Laika. O Repórter Esso, pela segunda vez, sai do estúdio: transmite, direto do Campo Santo, de Pistóia, na Itália, em 1951, o toque de silêncio. Naquele local, foram sepultados os pracinhas brasileiros mortos na tomada de Monte Castelo, na Segunda Guerra.
O rádio percebe que terá que disputar a audiência com a televisão. O novo veículo, numa primeira fase, transfere boa parte da programação radiofônica para o vídeo. O rádio perde e/ou compartilha profissionais com a tevê, que ainda tem uma programação incipiente e pouco ameaçadora. Para se adequar aos novos tempos, as emissoras de rádio começam a desenvolver programas de modo a aproveitar a mobilidade do veículo e o baixo custo de produção, bem superior na tevê.

Exemplo da migração do rádio para a tevê ocorreria com o próprio Repórter Esso.  Em  4 de maio de 1952, estrearia na TV Tupi do Rio de Janeiro (Canal 6), O Seu Repórter Esso, que permaneceu no vídeo até 31 de dezembro de 1970, portanto, por 18 anos. Da mesma forma que o noticioso radiofônico, o Esso, na tevê, era transmitido, além da Tupi, por outras emissoras: TV Difusora, de São Paulo; Itacolomi, de Belo Horizonte;  TV Piratini, de Porto Alegre; TV Itapoã, de Salvador; e TV Vitória, de Vitória.

A Globalização, nos anos 50, se reflete na industrialização como um todo. No jornal impresso, as linotipos, com velocidade tradicional de três linhas por minuto, saltam para 12, 30, 75, 120, 700 linhas por minuto. Nos anos 60 e 70, o aperfeiçoamento das máquinas é cada vez maior: é possível atingir até 10 mil linhas por minuto com o Linofilm, equipamento à base de válvulas de raios catódicos. Em seguida, o computador comandaria a indústria gráfica ao compor textos de maneira cada vez mais ágil, com linhas adequadamente justificadas e hifenizadas (BAHIA, 1990b, p. 188).

O modelo chegará, aos poucos, ao rádio e à televisão, quando o complexo elétrico e manual – que subsistiu até 60/70 e, em alguns casos, até os anos 80 –, começa a mudar. Os empresários da área percebem que a modernização significa economia de espaço, de tempo, de máquinas, de pessoal, de material e de modelo produtivo. É uma fase também de endividamento das empresas de comunicação, pois os equipamentos, em sua maioria, são importados. Em 1957, por exemplo, é incorporado à tevê, o videoteipe, e são realizadas as primeiras experiências com antenas de microondas para transmissões entre Rio e São Paulo, onde estavam concentradas as principais emissoras de televisão.

Um dos acontecimentos importantes da primeira década do segundo milênio foi a Guerra da Coréia (1950-1953), que recrudesceu a polarização mundial entre o livre mercado, capitaneado pelos Estados Unidos, e o socialismo, defendido pela União Soviética. Os territórios ficaram ainda mais demarcados com a divisão da Coréia. O conflito, devido à distância do Brasil, não mobilizou a audiência como a Segunda Guerra Mundial. Os tempos eram outros. Mesmo assim, boa parte do noticiário foi dedicada a ele. Outra obra que impressionou foi a construção do muro de Berlim, concluído em 1961.

Ao longo da década, as notícias denunciavam o comunismo como agressor mundial e os Estados Unidos conclamavam as “nações livres a lutar com armas, materiais e tropas”. Novamente, o Papa Pio XII defendia o cristianismo contra seu inimigo “que deseja impor à humanidade normas de vida completamente divorciadas da religião”, fazendo, possivelmente, menção ao comunismo (O Repórter Esso, s/d, 1952/53).

Havia a iminência de um Terceiro conflito mundial, pois além do erguimento do muro de Berlim, da Guerra da Coréia e da troca de acusações da diplomacia dos Estados Unidos e da União Soviética, houve o ataque de caças soviéticos a um avião britânico.  O principal assunto foi a disputa petrolífera anglo-iraniana.

Também esteve em pauta a espionagem, com legislação específica de alguns países, no sentido de punir a traição de quem não denunciasse a atividade de espiões. Em nível nacional, a questão dominante na Imprensa, nos anos 50, foi a da criação da Petrobrás, embora não apareça em nenhum dos noticiários localizados.

As edições começaram a difundir notícias Locais, de eventos com dimensões regionais e, aparentemente, de interesse relativo para a população. Porém, o tema predominante, no noticiário, em meados da década de 50, foi o suicídio do presidente Getúlio Vargas. As edições extraordinárias se multiplicaram como durante os anos da Segunda Guerra Mundial. Os acontecimentos que precederam e deram seguimento à morte de Vargas estabeleceram um clima apreensivo e de elevada tensão em todo o País.

Fontes consultadas:

BAHIA, Juarez. Jornal, História e Técnica – volume 1 – história da imprensa brasileira. São Paulo: Ática, 1990.
___. Jornal, História e Técnica – volume 2 – técnica. São Paulo: Ática, 1990.
BAUM, Ana (org.). Vargas, agosto de 54: a história contada pelas ondas do rádio. Rio de Janeiro, Garamond, 2004.
BUENO, Eduardo. História do Brasil. Porto Alegre: Zero Hora/RBS Jornal, 1996.
CARONE,  Edgar. A Terceira República (1937-1945). São Paulo/Rio de Janeiro: Difel, 1976.
___. O Estado Novo (1937-1945). São Paulo/Rio de Janeiro: Difel, 1976.
CLARK, Walter. O Campeão de audiência. São Paulo: Editora Best Seller, 1991.
FELIZARDO, Joaquim José.  A legalidade – último levante gaúcho. Porto Alegre: Editora da Universidade, 1988.
GOEBBELS, Joseph. Diário (1942-1943). Rio de Janeiro: Editora A Noite, s/d.
HAUSSEN, Doris F. Rádio e Política – tempos de Vargas e Perón. Porto Alegre: Edipucrs, 2001.
KLÖCKNER, Luciano. O Repórter Esso na História do Brasil (1941-1945 e 1950 a 1954). Dissertação de Mestrado, PUCRS. Porto Alegre, 1998.
MOREIRA, Sonia Virgínia. Rádio e Palanque. Rio de Janeiro: Mil Palavras, 1998.
SAROLDI, Luiz Carlos e MOREIRA, Sonia Virgínia. Rádio Nacional, o Brasil em sintonia.  Rio de Janeiro: Martins Fontes/Funarte, 1984.
SEVERIANO, Jairo. Getúlio Vargas e a música popular. Rio de Janeiro: FGV-Cpdoc, 1983.
TOTA, Antonio Pedro. O imperialismo sedutor: a americanização do Brasil na época da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
UNESCO. Um mundo e muitas vozes – comunicação e informação da nossa época. Relatório da Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas/Unesco, 1983.
WAINBERG, Jacques. O Império das palavras: estudo comparado dos Diários e Emissoras Associadas, de Assis Chateaubriand, e Hearst Corporation, de William Randolph Hearst. Porto Alegre: Edipucrs, 1997.
WYKES, Alan. Goebbels – História Ilustrada da 2ª Guerra. Rio de Janeiro: Editora Renes, 1975.

* Jornalista e Professor.- Doutor em Comunicação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e Pós-doutor pela Universidade de Coimbra/Portugal. Autor do livro O Repórter Esso: a síntese radiofônica mundial que fez história, editora EDIPUCRS/AGE,
2008.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora