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21 de agosto de 2020
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20:29

Comunidade se mobiliza contra mudança da escola Rio Grande do Sul para estrutura da Parobé

Por
Luís Gomes
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Comunidade se mobiliza contra mudança da escola Rio Grande do Sul para estrutura da Parobé
Comunidade se mobiliza contra mudança da escola Rio Grande do Sul para estrutura da Parobé
Escola Estado do Rio Grande do Sul já esteve ameaçada de fechamento em 2015 | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Professores, pais e estudantes da Escola Estado do Rio Grande de Sul, localizada no Centro de Porto Alegre, estão promovendo um abaixo-assinado direcionado ao secretário estadual de Educação, Faisal Karam, contra a possibilidade de transferência da instituição para as dependências da Escola Técnica Parobé, também no Centro. Oficialmente, o governo do Estado não confirma a mudança, mas a direção da escola diz que a Seduc já “pediu as chaves” do prédio e teme que a medida resulte em fechamento definitivo, o que já chegou a ser proposto em 2015.

Procurada, a Secretaria Estadual da Educação (Seduc) nega que a mudança esteja definida e alega que o prédio que abriga a Rio Grande do Sul apresenta problemas estruturais. “A Secretaria Estadual da Educação informa que está realizando estudos técnicos preliminares para transferir as atividades da Escola Rio Grande Sul, localizada em Porto Alegre, para outro endereço. A iniciativa está sendo realizada com base no laudo da 1ª Coordenadoria Regional de Obras Públicas (Crop) que identificou problemas estruturais no prédio. A Seduc reitera que não há definição sobre o caso e que todas as medidas serão realizadas juntamente com a direção da instituição de ensino e comunidade escolar”, diz resposta a questionamentos encaminhados pela reportagem.

Contudo, a diretora da Rio Grande do Sul, Elisa Santana Oliveira, diz que a direção foi comunicada pela Seduc no dia 10 de agosto de que a escola deveria se mudar para a Parobé porque as dependências da escola seriam utilizadas como casa de acolhimento de pessoas em situação de rua durante a pandemia do coronavírus, que seria administrada em parceria entre a pasta, a Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos e a Secretaria de Trabalho e Assistência Social. Em uma segunda reunião, no dia 12 de agosto, a direção já teria sido orientada a entregar as chaves da escola.

“Inicialmente, era um projeto de três meses. Mas, depois, quando a gente quis que a Secretaria de Educação nos desse um documento dizendo qual seria o período que a gente ficaria fora ou a data para a gente retornar ao nosso prédio, aí a secretaria não nos garantiu que eram três meses. Mudaram o discurso e disseram que seria enquanto a pandemia durar”, diz.

Elisa afirma que a explicação dada pela Seduc para a escolha da Rio Grande do Sul para abrigar a casa de acolhimento foi a de que a escola tinha poucos alunos — são 284, entre turmas de 1º a 9º anos e de 6º ao 9º na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA) — e se localizava em uma região central.

O temor da direção é que, caso a mudança fosse aceita, pudesse resultar no fechamento definitivo da escola. “Até porque o discurso da Seduc mudou. Inicialmente, eram três meses e depois começaram a nos falar que a gente ia para a Parobé e não ia mais querer voltar, ia gostar muito de lá. A secretária-adjunta de Educação, Ivana Flores, começou a falar assim, mas aí eu disse: ‘então eu quero um papel que diga em que data a escola Rio Grande do Sul retorna para o seu prédio’. Não quiseram nos dar esse papel e disseram que é por tempo indeterminado, enquanto durar a pandemia. O que a gente acredita é que, se a gente passasse para a Parobé, íamos perder alunos, eles iam acabar se transferindo para outras escolas e, no final das contas, a gente ia fechar de qualquer forma”, diz Elisa.

Vice-diretor do turno da noite, Pablo Girondi Kmohan também questiona a motivação do Estado para a mudança da escola e avalia que, na verdade, o objetivo seria o fechamento da escola. “Eu concordo que precisamos de acolhimento de pessoas em situação de rua, mas não entendo porque precisa desabrigar uma estrutura que é uma escola de quase 50 anos, que atende uma comunidade específica, que atende quase 300 alunos, enquanto tem prédios públicos que estão parados. Ainda mais dizendo que é por causa de uma pandemia e que sob a pandemia podem fazer o que bem entender. E praticamente no final do inverno. O mais fantástico é que o governo quer voltar às aulas, mas quer tirar o espaço dos alunos”, diz.

Ele lembra que, em dezembro de 2015, ainda no governo de José Ivo Sartori (MDB), a Seduc comunicou a direção sobre a intenção de fechamento da escola e transferência para o prédio da Leopolda Barnewitz, localizada na Cidade Baixa. No entanto, após mobilização da comunidade, o governo recuou. “A gente conseguiu que o Vieira da Cunha (então secretário da Educação) viesse aqui para dizer que foi um engano. Quer dizer, não é de agora e não seria a primeira escola a ser fechada com argumentos assim”, afirma.

Presidente da Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, a deputada estadual Sofia Cavedon (PT) diz que a Casa deve realizar uma audiência pública na próxima semana para tratar do possível fechamento da escola.

Ela avalia que a ideia de mudar o local da escola para usar o prédio para abrigamento de pessoas em situação de rua é “desvestir um santo para vestir outro” e que não há “nenhuma razão pedagógica” para fechar a Rio Grande do Sul, apenas o desejo do governo em reduzir custos.

“Tem necessidade de albergue? Tem. A política para moradores de rua em Porto Alegre é um desastre? É. Agora, vamos combinar, tem muito espaço vazio e espaços fechados. Os espaços têm que ser descentralizados, tem que ter uma política de abordagem continuada, de saúde mental, várias políticas que não existem de trabalho protegido, renda e habitação popular. E, agora, simplesmente mandar fechar uma escola para criar um albergue é uma desculpa esfarrapada”, afirma. “A escola é a única que oferece, no Centro, educação de jovens e adultos à noite. Então, já vai causar evasão escolar. Ela tem um papel importante a cumprir, poderia acolher turmas de educação infantil, que é uma demanda do Centro da cidade, através de parceria com o município”.

Mudança rejeitada pela comunidade

Elisa afirma que a direção da Rio Grande do Sul fez uma visita às dependências da Parobé e conversou com a direção da escola, onde foi constatado que não havia condições de o local abrigar as duas instituições. “Nós somos uma escola de primeiro a nono ano. Tem uma série de coisas que são apropriadas para a escola Parobé, por ser uma escola de ensino médio, como o portão ficar aberto, que não é para nós. Não teria como adaptá-la para uma escola de ensino fundamental para que eles recebessem a gente”, diz Elisa, acrescentando que a direção da Parobé também não concordou com a medida.

Pablo destaca que um dos argumentos usados pelo governo para convencer a direção era de que, com a mudança para a Parobé, a Rio Grande do Sul ganharia um pátio, o que não possui na localização atual. “Mas como é que vai ficar no pátio se é um estacionamento com carro? Se chover, não tem onde ficar. Outra coisa, eles iam nos dar um anexo da Parobé, em que as salas também são ocupadas por eles”, diz.

Elisa afirma ainda que a Seduc ofereceu a opção de transferência para outras escolas, na região da Cidade Baixa, o que considera que também não atende às necessidades da comunidade escolar, formada majoritariamente por moradores do Centro. Em reunião com o conselho escolar, surgiu a ideia do abaixo-assinado que circula nas redes sociais pedindo para que a Seduc desista da mudança da escola. Por conta da mobilização, a direção ainda não teria entregado as chaves da escola à Seduc. “A gente não fez isso [entregar as chaves] porque a comunidade não está a favor”.

A diretora afirma que protocolou junto à Seduc, em conjunto com a direção da Parobé, uma manifestação de rejeição à proposta. “A gente colocou todos os motivos para não querer essa mudança”, diz. Contudo, segundo ela, não há nenhuma conversa marcada com a secretaria para tratar do assunto.

Para a próxima segunda-feira (24), está prevista uma manifestação de pais e servidores diante da escola contra a mudança. “A comunidade não havia sido consultada, eles determinaram sem fazer uma consulta prévia. No momento que a gente consultou a comunidade, ficou muito claro que ninguém quer que a escola saia dali”, diz Elisa.


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