Opinião
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28 de dezembro de 2022
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14:15

2022, para espantar o tempo feio (por Roger Flores Ceccon)

Foto: Leandro Molina
Foto: Leandro Molina

Roger Flores Ceccon (*)

À essa mesma época do ano passado, em meio às bonanças natalinas e a euforia da virada, escrevi um texto para o jornal Sul 21 intitulado O fim do ano de 2021: fez escuro mas eu canto. Nele, discorro a catástrofe que havíamos vivenciado, entre milhares de mortos à luz de um governo genocida, e uso o filme sueco O sétimo selo, de Ingmar Bergman, como metáfora do período fatídico que se findava, em que éramos o cavaleiro que jogava xadrez com a morte. E, como sabemos, a morte nunca perde. Mas concluo aquele texto, com certo requinte de esperança, que 2022 traria impulsos, sonhos, entusiasmos e novas utopias. Pois bem, um ano depois, acertei em cheio. 

Meu lado rabugento e pessimista costumas foi para os ares. Afirmo: 2022 foi um ano importante. Não que tenha sido um conto de fadas, longe disso, até porque vivemos no Brasil e desde que esse país foi colonizado não temos trégua um dia sequer. Tivemos muitas tragédias: as práticas de violência, racismo, homofobia, machismo e ódio às populações pobres foram mais uma vez frequentes. O SUS, a educação, a ciência e a cultura foram duramente atacadas. Também perdemos Gal Costa, Erasmo Carlos e Pedro Paulo Rangel. A jogadora de vôlei Isabel Salgado nos deixou e as guerras nas periferias brasileiras e em diversas partes do mundo nos assola. Nos comovemos com as chuvas em Petrópolis e ficamos indignados com as mortes de Marcelo Arruda, tesoureiro do PT, e dos indigenistas Dom Phillips e Bruno Pereira, na Amazônia. Perdas irreparáveis. Entre tantas e tantas outras, lamentamos profundamente. 

Mas 2022 foi o ano da retomada. A pandemia foi amenizada – embora ainda se constitua como um importante problema de saúde pública – e foi possível sair do isolamento social. Foi o ano da  E foi o ano que nos deu ar para respirar, já que estávamos entubados e ligados à própria sorte. Era preciso, sob pena da destruição irreparável do Estado brasileiro, que o clã bolsonarista fosse freado. Que o ódio deixasse de governar o país, e que a tragédia administrativa desse governo abrisse passagem para políticas públicas solidárias que enfrentassem os principais problemas sociais. E só uma pessoa era capaz disso. Foi o ano de Luiz Inácio Lula da Silva. 

Lula foi maestro. Habilidoso politicamente, trabalhou como ninguém. Dialogou e criou a maior frente ampla da história recente. Renasceu. E seus incansáveis discursos situaram novamente as reais necessidades do povo brasileiro: a fome, o emprego, a educação, a saúde, a ciência, a habitação, a segurança e o meio ambiente. 

Lula foi a pessoa de 2022. Lula foi todos nós. Foi uma nação e uma história. Nos trouxe de volta as utopias. Voltamos a sonhar, a sorrir, na esperança de melhores dias. Nos tirou dos tentáculos venenosos de Bolsonaro, e só por isso já mereceria toda a veemência possível. Mas é preciso mais. É tempo de recolocar o país nos trilhos e devolver a alegria, como nos canta Chico Buarque: Que tal um samba? Puxar um samba que tal? Para espantar o tempo feio. Para remediar o estrago. Que tal um trago?

Oxalá 2023 vem aí. Já era hora.

(*) Professor da Universidade Federal de Santa Catarina

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


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