Opinião
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29 de agosto de 2022
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17:37

Cimi Sul repudia arrendamento de terras indígenas

Prática do arrendamentos de terras têm sido causa de conflitos violentos em terras indígenas (Foto: Reprodução/UFRGS)
Prática do arrendamentos de terras têm sido causa de conflitos violentos em terras indígenas (Foto: Reprodução/UFRGS)

Cimi Sul (*)

O Conselho Indigenista Missionário – Cimi Regional Sul manifesta, de forma enfática, seu repúdio às práticas de arrendamentos de terras indígenas em todo país. O Relatório Violências Contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2021, publicado pela entidade, registrou casos de arrendamento em pelo menos nove terras indígenas, cinco das quais em no estado do Rio Grande do Sul. 

Tais casos formam parte do conjunto de 305 registros de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio indígena, que atingiram quantidade dramática e inédita sob o atual governo federal.

A partir do momento em que o Cimi lançou o relatório, com denúncias a respeito de diversas violações aos direitos indígenas, entre as quais o arrendamento, missionários e missionárias da entidade passaram a receber áudios, via WhatsApp, com ameaças e manifestações depreciativas da ação missionária que a entidade desenvolve em apoio aos povos indígenas. 

O Cimi, ao longo dos seus 50 anos de atuação, jamais se omitiu e deixou de denunciar os crimes, injustiças e ameaças à vida dos povos, suas comunidades, famílias ou indivíduos. E não seria agora, num dos mais graves momentos políticos e jurídicos do Brasil, que seus missionários e missionárias fechariam os olhos, tapariam os ouvidos e calariam as vozes diante da ilegalidade denominada arrendamento de terras indígenas.

O Cimi Regional Sul expressa, de forma categórica, sua posição contrária aos arrendamentos pelas seguintes razões:

1. A Constituição Federal de 1988 assegura aos povos indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, cabendo à União demarcá-las e fazer respeitar todos os seus bens;

2. As terras indígenas são patrimônios da União, para o usufruto exclusivo dos povos e comunidades indígenas. Portanto, tão somente os indígenas podem usufruir, produzir, coletar, caçar, garimpar e plantar dentro dos limites de suas áreas;

3. A Constituição Federal, ao garantir aos indígenas o usufruto exclusivo das terras e de todos os seus bens, buscou preservar esse direito tão somente aos povos para que ninguém mais viesse a explorá-las, tornando, assim, esse direito inalienável e indisponível à terceiros;

4. As terras indígenas são, de acordo com a Constituição Federal, destinadas à sustentação e preservação da vida dos povos, de seus modos de ser, de suas culturas, costumes, crenças e tradições e do meio ambiente;

5. O arrendamento de terras indígenas é uma prática ilegal e inconstitucional, que acarreta em crimes do arrendatário e do arrendador contra as vidas indígenas, contra o meio ambiente e contra o patrimônio público da União;

6. O arrendamento desencadeado nas terras indígenas carrega consigo outras violências, tais como: a exclusão de pessoas quanto ao uso da terra; torna privado um bem que é comunitário, comum a todos; concentra riqueza nas mãos e contas bancárias de alguns em detrimento da pobreza da maioria da população;

7. O arrendamento causa conflitos internos, divisionismos, conflitos, espancamentos, expulsões, assassinatos e encarceramentos;

8. O arrendamento, por ser prática criminosa, vulnerabiliza as fronteiras das reservas e terras indígenas e acaba absorvendo outras ilegalidades como o tráfico de drogas, de armas e até exploração sexual de crianças e adolescentes;

9. O arrendamento de terras beneficia, quase que exclusivamente, o arrendatário, alguns indígenas e os comerciantes que vendem insumos, equipamentos, sementes, agrotóxicos e, por outro lado, deixa dentro das terras um rastro de destruição, poluição, violência, fome e abandono da maioria das famílias indígenas;

10. O arrendamento precisa ser combatido; por isso, calar-se diante desse fato não é uma opção. Se assim fizermos, estaremos avalizando o esbulho, a remoção forçada, os assassinatos, o sangue derramado e a submissão de vidas indígenas à miséria, à dor, ao sofrimento e à angústia;

11. O arrendatário, o arrendador e os intermediários – de órgãos públicos ou privados – precisam ser identificados, responsabilizados criminalmente, devem ter todos os seus bens confiscados e, mais que isso, as famílias indígenas devem ser ressarcidas e indenizadas pelos danos morais, materiais, culturais e ambientais.

O Cimi Regional Sul reafirma seu compromisso em defesa da vida e dos direitos indígenas e reitera que seguirá denunciando as violações e violências contra as pessoas, as comunidades e povos. O arrendamento de terras indígenas constitui um grave e profundo desvio de finalidade dos bens indígenas, por isso merece veemente repúdio.

Chapecó, SC, 26 de agosto de 2022.

(*) Conselho Indigenista Missionário Regional Sul

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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