Opinião
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2 de dezembro de 2021
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19:04

Os abates clandestinos e a falta de fiscais agropecuários (por Richard Alves)

Richard Alves, presidente da Associação dos Fiscais Agropecuários do RS (Afagro) (Arquivo pessoal)
Richard Alves, presidente da Associação dos Fiscais Agropecuários do RS (Afagro) (Arquivo pessoal)

Richard Alves (*)

A operação que desvendou esquema de abate clandestino de cavalos e comercialização de carne sem inspeção, em Caxias do Sul (RS), traz luz a um problema que tem relação direta com a saúde pública: a falta de servidores na fiscalização agropecuária. A precarização do serviço oficial é uma realidade que precisa urgentemente de atenção. Caso contrário, a população estará cada vez mais vulnerável a riscos, entre eles a transmissão de doenças de animais para humanos.

Um fato que evidencia o desmonte é a redução da quantidade de inspetorias de defesa agropecuária – local de trabalho dos servidores da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (Seapdr) no Interior. Há alguns anos, o Rio Grande do Sul tinha 250 inspetorias. Com a reestruturação para a certificação do Estado como livre de febre aftosa sem vacinação, o número caiu para 146. Isto porque a Organização Mundial da Saúde Animal determinava que todas as inspetorias deveriam ter um médico veterinário. Em vez de contratar profissionais, o governo enxugou o número de inspetorias.

O último concurso para a Seapdr foi realizado em 2014 e, de lá para cá, muitos fiscais estaduais agropecuários deixaram a função. Uma parte se aposentou, enquanto outros foram nomeados em concursos com melhores condições de trabalho ou optaram pela iniciativa privada. No dia 30 de novembro, o governo do Estado anunciou concurso com 31 vagas para 2022. Contudo, há 70 vagas abertas pelo abandono da função por colegas que pediram exoneração. E este número não contabiliza os que se aposentaram. Ou seja, o número de vagas ainda é muito inferior à real necessidade.

Os servidores públicos da categoria têm compromisso com suas tarefas diárias e se esforçam ao máximo para atender a uma demanda crescente. Mas a quantidade de trabalho, tanto na área animal quanto na vegetal, tem se mostrado imensamente maior do que a capacidade de atuação. A cada dia sobra menos tempo para que estes profissionais busquem ativamente casos semelhantes ao de Caxias e atender apenas as atividades de rotina torna a fiscalização menos eficiente.

Situações como os abates clandestinos na Serra mostram que os governantes precisam refletir sobre a falta de servidores na fiscalização. O problema não é o consumo de carne de cavalo, que faz parte do cardápio em outros países, mas a falta de inspeção. É necessário ampliar a disponibilidade de fiscais para conseguir antecipar casos como este. A clandestinidade é um crime contra a saúde pública que não pode ser combatido esporadicamente pelo poder público. É preciso aperfeiçoar a vigilância ativa no campo para direcionar esforços, intervir e evitar situações assim no futuro.

(*) Presidente da Associação dos Fiscais Agropecuários do RS (Afagro)

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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