Economia
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2 de setembro de 2021
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09:07

Estagnação, desalento, pessimismo: nada de novo no front do PIB do Governo Bolsonaro (por Flavio Fligenspan)

Jair Bolsonaro e Paulo Guedes (Foto: Alan Santos/PR)
Jair Bolsonaro e Paulo Guedes (Foto: Alan Santos/PR)

Flavio Fligenspan (*)

O IBGE divulgou na quarta feira (1º de setembro) os dados do PIB brasileiro referentes ao segundo trimestre do ano. Soube-se então que houve uma queda de 0,1% em relação ao que se produziu no trimestre anterior, o que se pode considerar uma estagnação. Alguns analistas ficaram frustrados com o resultado, já que esperavam algo levemente positivo. Convenhamos, a diferença seria muito pequena, isto é, se chegássemos a uma taxa positiva, ela seria pouco superior a zero e em nada mudaria o clima de pessimismo e de desalento das empresas e das famílias brasileiras.

O fato é que, por fatores externos – não controláveis – e, principalmente, por diversos erros de nossa responsabilidade que se acumulam há anos, chegamos neste triste ponto da nossa história econômica. Os fatores externos mais relevantes são a desorganização de cadeias produtivas pós pandemia, causando desabastecimento e alta de preços de matérias primas e de transporte, e a elevação de preços de commodities. Em relação a estes fatores, somos passivos, mas no plano doméstico a situação é bem diferente. Deveríamos ter controle da situação e aplicar corretamente os instrumentos de política econômica disponíveis para mitigar os elementos externos e proporcionar uma recuperação rápida e consistente do nível de atividade.  

Os erros internos são de várias ordens, desde o clima político de beligerância e instabilidade, o que desincentiva o consumo e afasta os investimentos externos e domésticos, passando pelo dogmatismo fiscal, e chegando ao contra senso de propor uma puxada forte na taxa de juros para combater uma inflação que todos sabem não provir de excesso de demanda, mas sim de alta da taxa de câmbio e de custos elevados de produção. Para complicar, se atrasou a reedição do Auxílio Emergencial e a vacinação segue em ritmo lento, retardando a retomada dos Serviços e dando chance ao surgimento de novas variantes do vírus.

Com tantas coisas fora do lugar, não deveria surpreender um resultado ruim do PIB, cuja expressão maior é um crescimento zero do Consumo das famílias no segundo trimestre de 2021, em comparação com o trimestre anterior. Este nível de consumo é tão baixo que sequer repõe o nível anterior à pandemia. Também pudera, a deterioração do mercado de trabalho é flagrante, com taxas elevadas de desocupação e subocupação, aumento da informalidade e rendimentos reais em baixa. Para a maioria das famílias, não há renda para consumir nem o básico; e as que têm renda se retraem diante do clima de insegurança política e econômica.

Olhando para frente, mesmo que se mantenha o atual nível morno de atividade até o final do ano, estará garantida uma taxa de crescimento de quase 5% do PIB em 2021, não pelo desempenho atual, mas pela inércia da recuperação que ocorreu no segundo semestre do ano passado. E não nos iludamos com uma taxa que parece elevada em 2021; esses quase 5% nos levariam a um nível de PIB marginalmente superior ao de pré pandemia, em 2019, e ainda cerca de 2% inferior ao de 2014, antes de começar toda débâcle do período recente: a recessão anterior (2014-2016) e o crescimento lento que a sucedeu (2017-2019). Repetindo, para não deixar dúvida sobre o tamanho da tragédia e da tarefa de reconstrução que esperamos um dia viver, o nível atual de produção é aproximadamente 2% inferior ao de sete anos atrás. Ou seja, a história está passando e nós estamos ficando para trás. Em tempos de debate sobre uma crise energética já estabelecida, pode-se imaginar o tamanho do problema, se tivéssemos crescido um pouco mais nos últimos anos. Certamente, já estaríamos em pleno “apagão”.

(*) Professor do Departamento de Economia e de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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