Opinião
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7 de agosto de 2021
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10:01

Incêndios e os vazamentos de dados (por Rosângela Benetti Almeida)

Equipes do Corpo de Bombeiros no combate às chamas na Secretaria de Segurança. (Foto: Felipe Dalla Valle / Palácio Piratini)
Equipes do Corpo de Bombeiros no combate às chamas na Secretaria de Segurança. (Foto: Felipe Dalla Valle / Palácio Piratini)

Rosângela Benetti Almeida (*)

Em 1949, o prédio inteiro do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul virou cinzas. Muitos nem sabem disso ou esqueceram aquele infortúnio.

No dia 29 de julho de 2021, o fogo levou a memória da Cinemateca Nacional.

No dia 31, reinaugura-se o Museu da Língua Portuguesa, pois anos atrás o fogo acabou com ele.

No dia 02 de setembro de 2018, o Museu Nacional foi consumido por chamas. 

Em 14 de julho/2021, quando os franceses comemoravam sua data, nós víamos o fogo consumir o prédio da Secretaria de Segurança Pública. 

O Secretário afirmou que os dados não tinham sido perdidos. No dia seguinte, soubemos que 95 mil documentos físicos queimaram, a Biblioteca e todos os documentos sobre Educação para o Trânsito também foram perdidos.

Em todos estes infortúnios temos milhares de documentos (sem possibilidade de recuperação) perdidos. Também sumiram anotações em meio digital em computadores queimados, sem o devido backup fora deles.  Houve perda e vazamento de dados pelos infortúnios, fruto de negligências.

O caso emblemático foi o do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O incêndio consumiu o edifício que abrigou aquele por mais de 56 anos, destruindo processos, documentos e uma das maiores bibliotecas jurídicas do País. Dados históricos e pessoais foram destruídos, Na época não se falava em dados pessoais, em proteção, em vazamentos.

Mais recentemente no prédio Tribunal na Borges de Medeiros houve dois incêndios e alagamentos. Sem maiores danos. Mas se repete a vulnerabilidade.

O caso mais grave foi o ataque cibernético em 2021 deixando por mais de um mês com nenhum acesso ou precário uso de informações judiciais por parte de advogados e do povo em geral.

Parte da História do Rio Grande do Sul pode ser contada pelos guardados físicos no Arquivo Judicial Centralizado do Tribunal de Justiça do RS. Documentos físicos que estão à espera de digitalização. As perdas do incêndio de 1949 nos tirou dados que fazem falta para entender melhor nosso Estado.

A mesma vulnerabilidade vemos com os documentos únicos guardados no Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul ainda não digitalizados.

Qualquer documento é mais que papel, é um registro; são dados diversos. Na sua divulgação histórica, para a pesquisa estes são imprescindíveis. Hoje em dia é obrigação guardá-los como digitalizá-los. Num processo queimado em 1949 poderiam constar dados sobre origens étnicas, nacionalidades, percursos feitos, nomes antigos etc.

Estamos sob a égide da LGPD Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709./2018) e sua necessária aplicação. Não estamos tratando de apenas de dados virtuais, mas os físicos também. Estes, regra geral, mal guarnecidos, vulneráveis a qualquer incidente.

Por isso, reiteramos a necessária atenção aos princípios legais, dentre estes, a transparência, seja com relação ao tratamento ou eventual incidente que possa ocorrer com os dados pessoais, a segurança, utilizando das técnicas necessárias e atuais, a finalidade, utilização de dados adequados, e também a prevenção.

Talvez a acuidade com o tratamento, em especial a possibilidade de anonimização dos dados e também como o correto descarte, a vulnebilidade dos incidentes poderiam estar devidamente relativizados.

Manter a história, com a preservação dos dados dos titulares é medida que se impõe na atualidade. No passado, quando a tecnologia da informação não existia, atos criminosos ou negligência nos tiraram dados. Atualmente, não tem mais desculpas.

Tirando o incêndio de 1949 do nosso Tribunal, todos os infortúnios narrados poderiam ter seguido regramentos de proteção, digitalizá-los, fotografados, portanto, salvados.

Que sirvam de lição para o futuro, que todos trabalhemos por nos adequar às normas, que todos estejamos em conformidade com a inovação, com a segurança cibernética e com o respeito ás pessoas.

(*) Advogada especializada em LGPD.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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