Opinião
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6 de agosto de 2021
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09:50

Desigualdade olímpica e motivação esportiva (por Milton Pomar)

FIVB/Divulgação/Fotos Públicas
FIVB/Divulgação/Fotos Públicas

Milton Pomar (*)

Assistir os jogos de vôlei e basquete e as competições de natação nas Olimpíadas confirma quão desigual é o mundo e, paradoxalmente, quanto a prática de esportes é desmotivada pelos nossos idolatrados gigantes, atletas com altura na faixa dos dois metros. Enquanto não forem criadas categorias por faixas de altura nesses esportes, a exemplo das que existem por peso em tantos outros, permitindo acesso às competições de pessoas de todos os portes físicos, as modalidades da natação, vôlei e basquete continuarão exclusivas, na prática, da pequeníssima elite categoria “extra grande”. 

Mulheres de 19 anos de idade têm estatura média de 1,58m a 1,63m no Brasil, China e Estados Unidos, e nesses países a altura média dos homens fica entre 1,68m e 1,76m. Nos países onde a população tem mais acesso a alimentação, essas médias são um pouco maiores, e na grande maioria dos países essas médias são um pouco – ou bastante – menores, segundo o exaustivo estudo sobre a população mundial, realizado pela universidade britânica Imperial College, e publicada na edição de dezembro de 2020 pela revista The Lancet.

Trabalhando com dados de 2.100 estudos populacionais do mundo inteiro, realizados de 1985 a 2019, com 65 milhões de homens e mulheres de cinco a 19 anos, o estudo realizado pelo Imperial College apresenta as estaturas médias de cada país. E os números não deixam margem para dúvidas: para estimular a prática mundial de natação, vôlei e basquete, as Olímpiadas e demais competições esportivas têm que permitir que centenas de milhões de crianças e jovens possam sair da categoria atual de meros espectadores para a de atletas, através da criação da categoria “normal” (entre 1,58m e 1,78m) nessas três modalidades esportivas. 

Se essa mudança realmente ocorrer, será a inclusão mais significativa da história do esporte mundial, em termos quantitativos. E será também a admissão da terrível desigualdade que existe – persiste, melhor dizendo – entre os poucos países “ricos” e os muitos países “pobres”. 

Detalhe importante: o povo chinês foi o que mais aumentou a estatura média no mundo – hoje a juventude é oito centímetros mais alta do que a geração dos seus pais. No período analisado, na faixa de 19 anos de idade, a China saiu do 150º lugar para 65º, em relação à estatura média dos homens, e de 129º para 54º, das mulheres. Na faixa de 5 anos de idade, o avanço chinês foi de 165º para 39º (mulheres) e de 157º para 89º (homens). Essa mudança tão expressiva da altura média de 1,4 bilhão de pessoas é fácil de entender: o poder aquisitivo dos trabalhadores e trabalhadoras da China foi o que mais aumentou no mundo, entre 1990 e 2019, segundo o Banco Mundial: cresceu mais de 30 vezes. A equação chinesa é bastante simples: mais renda, melhor alimentação, mais altura – para toda a população. E mais medalhas nas competições esportivas mundiais. 

(*) Geógrafo e mestre em Políticas Públicas

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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