Coronavírus
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22 de setembro de 2021
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18:01

Por que Restinga e Lomba do Pinheiro são os bairros de Porto Alegre com menos vacinados?

Por
Luís Gomes
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secretário de Mobilidade Urbana destacou que serviço também foi muito afetado pela pandemia. Foto: Filipe Castilhos/Sul21
secretário de Mobilidade Urbana destacou que serviço também foi muito afetado pela pandemia. Foto: Filipe Castilhos/Sul21

A Prefeitura de Porto Alegre divulgou na semana passada dados de um estudo inédito, feito a partir do georreferenciamento, que teve por objetivo identificar onde está localizada a população vacinável que ainda não recebeu a primeira dose ou a dose única de um dos imunizantes contra a covid-19.

Na ocasião da divulgação dos dados, Porto Alegre já tinha vacinado 95% da população vacinável até então com ao menos uma dose, isso significava, então, que 57.638 pessoas poderiam ter buscado a vacinação e não o fizeram.

O estudo identificou que 47% dos não vacinados se encontram em dez bairros da cidade, sendo que a Restinga (9% do total de não vacinados) e a Lomba do Pinheiro (6,2%), lideram o ranking, seguidos por Santana (5,2%), Sarandi (5%), Santa Tereza (4,6%), Santa Rosa de Lima (4,1%), Mário Quintana (3,4%), Bom Jesus (3,3%), Patenon (2,8%) e Morro Santana (2,8%)

Coordenador do estudo, o vice-prefeito Ricardo Gomes destacou na ocasião que, a partir do cruzamento de dados do SUS com o Cadastro Único do governo federal, a Prefeitura identificou que 66% da população vacinável não imunizada recebe algum tipo de benefício social, o que indica que a população em situação vulnerável é majoritária entre os não vacinados.

Segundo Gomes, a abstenção da primeira dose chega a 25% da população vacinável inscrita no CadÚnico. Considerada a parcela de cidadãos fora do cadastro, a abstenção é de 2%.

Em conversa com o Sul21, o secretário municipal de Saúde, Mauro Sparta, avalia que o estudo identificou que uma das razões para as pessoas não se vacinarem era a falta de oportunidade. “Nós entendemos que talvez fosse dificuldade de acesso a nossas unidades básicas, dificuldade de se ausentar do trabalho em horário comercial”, exemplifica o secretário.

Como resultado do estudo, Sparta diz que a Prefeitura criou dez ações para reduzir o número de não vacinados na cidade, com foco nestes bairros, que começaram a ser adotadas já na semana passada. Entre elas, a ampliação das unidades de saúde que participam da vacinação, a retomada dos drive-thrus, entre outras medidas (ver a lista ao final).

Complementarmente, ele diz que, no feriadão, foram feitas ações de reforço à vacinação nestes bairros, o que, segundo ele, já vem dando resultado. “Na terça-feira (21), nós vacinamos mais ou menos 10 mil pessoas. Todos os dias do feriadão teve bons números de vacinação, sobretudo nestes locais, isso nos deu uma noção muito interessante de que, na verdade, não estavam conseguindo se vacinar por falta de oportunidade, por falta de hora”, afirma.

Sparta destaca ainda que, no próximo dia 2 de outubro, serão realizadas ações especiais para marcar o Dia Nacional de Multivacinação, que busca ampliar a conscientização para a necessidade de vacinação não apenas contra a covid-19. “Nesses bairros prioritários, nós vamos colocar linhas circulares de ônibus para levar as pessoas até o local de vacinação e depois de volta às suas residências”, pontua.

Gerente Distrital de Saúde da Restinga e Extremo-Sul, Rosana Meyer Neibert diz que tem tentado avaliar o estudo desde que foi lançado. Ela pondera que a Restinga é um bairro com características de “dormitório”, o que dificulta que as pessoas encontrem tempo para se vacinar. “Muitas pessoas saem bem cedo na manhã e voltam tarde da noite. O Extremo-Sul tem essa característica por ser muito longe do Centro. O ônibus aqui leva uma hora, hora e meia, para chegar ao Centro. A gente acha que esse é um dos fatores”, diz.

Após a publicação do estudo, o perfil da TV Restinga, veículo jornalístico que atua no bairro, avaliou que um dos problemas que poderiam estar afetando a vacinação seria a disputa entre facções criminosas, que impediria a circulação de moradores entre diferentes partes do bairro, e o fato de que apenas uma unidade de saúde estar aplicando a primeira dose na chamada “Grande Restinga” seria insuficiente.

“Imaginem se ‘fulanos’ da região X resolvam ir até a Restinga Nova pra se vacinar e se encontram com ‘siclanos’ da região Y? Poderiam ocorrer confrontos mortais”, diz publicação da TV Restinga no Twitter.

Rosana Neibert avalia que a violência pode, sim, ser um fator que prejudica a vacinação. “A gente tem essa situação no nosso cotidiano, não só na questão da vacina, mas para todas as outras patologias e toda a busca de atendimento de saúde. Muitas vezes a gente tem que trocar o usuário de uma unidade para outra por ele não poder acessar. Isso acontece muito aqui no território”, diz.

No entanto, ela destaca que já estão ocorrendo ações para descentralizar a vacinação na Restinga, como as recentes em uma escola de samba e outra no Centro da Juventude do bairro, locais de referência e que, segundo a profissional de saúde, apresentaram filas de pessoas em busca de imunização.

“Quanto mais intensificarmos essas ações e adentrarmos as vilas da Restinga, pode ser que a gente consiga sair desses 9% e fazer essa cobertura. Esse é o nosso empenho direto agora”, diz.

Ela conta que, na manhã desta quarta-feira (22), por exemplo, equipes de saúde realizaram uma ação pontual para atender a população de rua da região, estimada em 150 pessoas. “É um trabalho de formiguinhas, mas, quanto mais a gente está indo, mais a gente está tendo um retorno positivo”, diz. “Esperamos que, em novembro, quando provavelmente tenha um novo cruzamento de informações, a gente consiga ter avançado um pouco mais”.

Gerente Distrital de Saúde do Partenon e da Lomba do Pinheiro, Cristiane Jovita acredita que o maior percentual de não vacinados na região em que trabalha, assim como na Restinga, resulta do fato de que são bairros com maior índice de pessoas morando em condição de vulnerabilidade na cidade. “Isso nos leva a crer que a vulnerabilidade é um dos fatores para a não vacinação”, diz.

Jovita avalia que o fato de nem todas as unidades de saúde da região estarem aplicando a vacina também pode ser um fator que contribuiu para o resultado identificado no estudo. Ela explica que a US Panorama (Rua Rômulo da Silva Pinheiro, S/N) foi escolhida para ser o local de vacinação na Lomba de Pinheiro com horário estendido, por estar em um local de fácil acesso e por ficar numa das extremidades do bairro, uma vez que a população que mora na outra extremidade poderia acessar a US São Carlos, localizada no Partenon, mas próximo da entrada do bairro.

“Pode ser que a não disponibilização em todas as unidades tenha impactado? Pode, mas a gente acabou, durante os finais de semana, fazendo muitas ações no território”, diz.

Contudo, ela pondera que, para ter uma noção correta das causas da não vacinação, seria necessário perguntar para as pessoas que poderiam ter recebido ao menos uma dose por que não haviam feito isso. “Na semana passada, nós vacinamos um idoso de 84 anos, que podia ter se vacinado há muito tempo. Quando o coordenador perguntou, ele disse que estava com medo da pandemia. Então, alguns idosos estão optando por não sair de casa”, afirma.

Jovita destaca que, no último sábado, uma unidade de saúde localizada na Vila Mapa, uma das áreas de maior vulnerabilidade do bairro, foi aberta para a vacinação, mas o número de pessoas que procuraram a primeira dose foi baixo. Segundo ela, 150 doses foram aplicadas em toda a Lomba do Pinheiro na ação. Como comparação, ela diz que ações semelhantes de busca nos bairros Tristeza e Restinga resultaram em cerca de 800 doses aplicadas em cada região.

Ela pondera que um dos motivos para essa diferença também pode ser o fato de que os dados da Prefeitura de número moradores do bairro podem estar defasados. “Outra coisa que pode acontecer é as pessoas se mudarem, não morarem mais ali. Porque, na verdade, essa pesquisa é como uma boca de urna, a gente não está entrevistando exatamente o usuário, ela é em cima de uma amostragem de onde está registrado que o usuário mora, mas a gente não tem certeza que ele mora lá ainda”, diz.

Por fim, ela afirma que percebe a existência de negacionismo e de posições antivacina, mas não acredita que seja um fator que tenha grande impacto na região.

– Ampliação da rede com vacinas D1, D2 e D3. Aumento de 11 para 57 locais de vacinação, entre elas: 25 unidades, 19 farmácias e dois drive-thrus.

– Ampliação do terceiro turno de vacinação: de quatro para 30 unidades, tendo pelo menos uma unidade em cada bairro prioritário.

– Nova unidade Mercado Público, no Largo Glênio Peres, das 13h às 19h.

– Parceria com os aplicativos de transporte: R$ 300 mil em vouchers de viagem com distribuição pelas entidades de assistência social.

– Unidade móvel nos bairros: os locais são divulgados no portal oficial e redes sociais da Prefeitura, pelo aplicativo 156+POA ou pelo telefone 156.

– Dia Nacional da Multivacinação (2 de outubro): ação especial nos bairros prioritários com linhas circulares de ônibus gratuito que irão levar os moradores aos pontos de vacinação.

– Redução no intervalo da Pfizer de dez para oito semanas.

– Vacinação de adolescentes.

– Dose 3 para 70 anos ou mais com esquema vacinal completo há pelo menos seis meses.

– Retomada dos drive-thrus: Barra Shopping Sul e Bourbon Wallig, das 9h às 17h.


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