Meio Ambiente
|
17 de setembro de 2023
|
16:23

Sob crítica de ambientalistas, Consema aprova novo Zoneamento Ambiental da Silvicultura

Por
Luciano Velleda
[email protected]
Silvicultura deve se expandir pelo RS. Foto: Fernando Dias
Silvicultura deve se expandir pelo RS. Foto: Fernando Dias

Enquanto o governo estadual e a sociedade civil se mobilizam para socorrer a população das cidades do Vale do Taquari devastadas pela enchente que já matou 48 pessoas, enquanto especialistas e ambientalistas debatem as causas e consequências da mudança climática e como isso afeta o Rio Grande do Sul, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) aprovou, na última quinta-feira (14), a atualização do Zoneamento Ambiental para a Atividade da Silvicultura (ZAS) no estado. Pela decisão, a alteração deverá ser aplicada aos novos plantios ou na renovação dos plantios florestais já existentes. 

A mudança, comemorada pela secretária estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura, Marjorie Kauffmann, é expressiva. As áreas de plantios passarão dos atuais 900 mil ou 1 milhão de hectares para 4 milhões de hectares em cada Unidade de Paisagem Natural (UPN) x Bacia Hidrográfica (BH). 

A silvicultura é o cultivo de florestas por meio do manejo agrícola. A atividade, quando realizada de maneira sustentável, utiliza métodos naturais e artificiais para regenerar e melhorar os povoamentos florestais. O principal objetivo da silvicultura é suprir o mercado de madeira e, ao mesmo tempo, aproveitar o uso racional das florestas. No RS, o eucalipto é um dos principais cultivos da silvicultura. 

A aprovação se concretizou mesmo com os alertas de perda de biodiversidade feitos pelo Grupo de Trabalho (GT) de técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). “O resultado da proposta apresentada induz a uma maior ocupação pela silvicultura das áreas onde a conversão de campos, em tese, tenha sido maior, desconsiderando outras questões de fundamental importância, quando se trata de conservação da biodiversidade, entre elas: o limite de resiliência e extinções de espécies locais nas áreas convertidas”, diz trecho do documento elaborado pelo GT de técnicos da Fepam.

Membro do Consema, o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) também emitiu parecer contrário a mudança. Concordando com o grupo técnico da Fepam, a entidade afirmou não haver informações disponíveis sobre o resultado dos monitoramentos da biodiversidade e nem o destino de grupos animais, como répteis de ambientes abertos, ameaçados de extinção e afetados pela Silvicultura no RS.

Em seu parecer sobre a proposta, a entidade afirmou que a aprovação poderá representar “uma irreversível e extraordinária perda adicional ao Pampa e aos Campos Sulinos”. Os campos nativos do Pampa são os que mais perderam remanescentes originais (29,5%) nos últimos 37 anos, desde 1985 (Mapbiomas, 2022), e o que menos percentual (3%) de Unidades de Conservação têm entre os seis biomas brasileiros, abaixo de Pantanal (4,6%), Cerrado (8,3%), Caatinga (8,8%), Mata Atlântica (9,5%) e Amazônia (28%)”.

O InGá ainda considerou que a proposta de Zoneamento Ambiental da Silvicultura (ZAS) aprovada tem vício de origem, por ter sido elaborada por empresas contratadas pelo próprio setor a ser regulado pelo governo estadual. O ZAS atual, ao contrário, foi construído a partir do setor técnico da Fepam e da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), “com equilíbrio de composição de corpo técnico independente”.

A entidade ambientalista destacou também que a Câmara Técnica de Biodiversidade do Consema teve somente 25 dias para analisar a proposta de ZAS, não tendo assim tempo hábil para uma “análise adequada e de elaboração de proposições que viessem, eventualmente, a aperfeiçoar a proposta”.  

“Por carecer de maior discussão, tratamento técnico adequado com especialistas e iniciativas de convergências, solicitamos uma análise quanto ao vício de origem da proposta, elaborada por iniciativa dos próprios interessados que serão regulados, além de reivindicarmos uma proposta de ZAS que provenha da área técnica da SEMA, sem ingerências políticas, sem predomínio de interesses econômicos e com tempo e espaço razoável para uma análise técnico científica que não comprometa ainda mais o que resta do bioma mais ameaçado do Brasil”, conclui o InGá.

Em sentido oposto, a secretária do Meio Ambiente e Infraestrutura, Marjorie Kauffmann, se mostrou satisfeita com a aprovação. “Uma etapa importante para o RS, que segue com os preceitos da preservação, aliados ao desenvolvimento econômico, que é o que geram a sustentabilidade pra população gaúcha”, afirmou.

Os estudos para a atualização do Zoneamento Ambiental da Silvicultura vêm sendo realizados desde 2018, tendo como primeira etapa a verificação da disponibilidade hídrica e, em 2019, a atualização de dados da biodiversidade.

De acordo com o governo de Eduardo Leite (PSDB), o principal objetivo da revisão foi “a atualização da base de dados utilizados e a inserção de novas ferramentas de geociências que trouxessem mais veracidade para as análises realizadas.

O ZAS é considerado um importante instrumento de orientação para a instalação dos plantios de silvicultura que precede os processos de licenciamento ambiental, compatibilizando a atividade com a conservação dos ecossistemas naturais. 

“Embora o ZAZ seja um orientador, indicando as regiões mais aptas a receberem os empreendimentos, ele não se sobrepõe aos regramentos específicos que garantem a preservação dos biomas. Seguimos trabalhando fortemente na preservação do Pampa e da Mata Atlântica, em consonância com o desenvolvimento sustentável das atividades produtivas”, disse Marcelo Camardelli, secretário adjunto da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) e presidente do conselho.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora