Meio Ambiente
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18 de julho de 2022
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18:50

Desmatamento florestal do Pampa cresceu 92,1% em 2021, aponta relatório do MapBiomas

Por
Luciano Velleda
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O Pampa é o bioma brasileiro que mais perde sua área com cobertura natural. Foto: Arquivo Pessoal/Valerio Pillar
O Pampa é o bioma brasileiro que mais perde sua área com cobertura natural. Foto: Arquivo Pessoal/Valerio Pillar

O Brasil perdeu 16.557 km2 (1.655.782 ha) de cobertura de vegetação nativa em todos seus biomas em 2021. O anúncio foi feito nesta segunda-feira (18) na mais recente edição do Relatório Anual de Desmatamento no Brasil (RAD), elaborado pelo MapBiomas. O dado representa um aumento de 20% em relação ao ano de 2020. Com isso, nos últimos três anos, o Brasil desmatou o equivalente quase ao estado do Rio de Janeiro de vegetação nativa.

Em termos de tamanho de área, a Amazônia foi o bioma mais desmatado no País, tendo concentrado 59% da área desmatada em 2021. Foram mais de 977 mil hectares de vegetação nativa destruídas no ano passado – um crescimento de quase 15% em relação aos 851 mil hectares desmatados em 2020 e que, por sua vez, já haviam representado um aumento de 10% em relação aos 771 mil hectares desmatados em 2019. 

O segundo bioma mais desmatado em termos de área foi o Cerrado, com pouco mais de meio milhão de hectares (30% do total no Pais), seguido pela Caatinga, com mais de 116 mil hectares (7%). A Mata Atlântica teve 30.155 hectares desmatados – o que representa 1,8% do total no Brasil, enquanto o Pantanal ficou com 1,7% e o Pampa com 0,1% do total de área florestal desmatada em 2021.

Juntos, Amazônia e Cerrado representaram 89,2% da área desmatada detectada em 2021. Quando somada a Caatinga, os três biomas responderam por 96,2% das perdas.

No caso do bioma típico do Rio Grande do Sul, embora tenha tido a menor área, em termos proporcionais foi o bioma mais desmatado, com um crescimento de 92,1% de perda florestal em 2021 em relação ao ano anterior. As florestas do Pampa representam 11% do bioma, com os campos nativos abrangendo a maior parte do restante.

No Pampa também houve um salto na maior área desmatada. Somente em Pedras Altas (RS), um único alerta de desmatamento teve a supressão de 464 hectares de vegetação nativa. O maior desmatamento no bioma em 2020 tinha sido de 272 hectares. Segundo a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam-RS), não houve autorização para a conversão do uso da terra e foi emitido auto de infração na área do alerta.

A Caatinga foi o segundo bioma mais desmatado em termos proporcionais, com aumento de 88,9%. No caso da Caatinga, os autores do relatório explicam que o aumento está relacionado ao aprimoramento da nova fonte de dados usada pelo MapBiomas, o SAD Caatinga, especializado na detecção de desmatamento em matas secas no bioma.

Os autores do estudo explicam que nos biomas Amazônia e Mata Atlântica, predomina o desmatamento em formações florestais. No Cerrado, na Caatinga, no Pampa e no Pantanal, o predomínio é de outras formações não florestais. Como a detecção de desmatamento em vegetação nativa não florestal ainda é deficiente, os pesquisadores destacam que os alertas nestas classes são subestimados. No caso do Pampa, o sistema utilizado pelo MapBiomas para captar o desmatamento florestal acaba abrangendo também partes de campos nativos ao redor das florestas. Por isso, dos 2.426 hectares desmatados na parte florestal do Pampa, 59,3% foram em formações campestres e 39,8% sobre formação florestal.

Pedras Altas, Herval e Encruzilhada do Sul foram os municípios com maior desmatamento florestal no bioma. Ilustração: MapBiomas/divulgação

Se comparado com os 125 mil hectares de campos nativos anualmente transformados em lavouras, silvicultura e pastagens plantadas, os 2.426 hectares desmatados na parte florestal do Pampa podem não ser tão representativos no contexto geral do bioma. Ainda assim, a tendência de alta é preocupante, na avaliação do biólogo Eduardo Vélez, pesquisador e consultor ambiental. “É quase um descontrole”, afirma.

Um dos autores do MapBiomas, Vélez diz que os indícios apontam para a ilegalidade do desmatamento, sem a autorização dos devidos órgãos. Atualmente, dentro de uma propriedade privada, 20% da área deve ser preservada como Reserva Legal, além de eventual Área de Preservação Permanente (APP), que a depender do relevo e da hidrografia, representa em média 10% da propriedade. Os outros 70%, portanto, podem ser desmatados, desde que com autorização.

“Os indícios de ilegalidade são altos, é como se ninguém estivesse pedindo autorização”, destaca o pesquisador do MapBiomas, acreditando que muito do desmatamento identificado seja em APP ou em Reserva Legal. Os 2.426 hectares desmatados representam 65 vezes o tamanho do Parque da Redenção, em Porto Alegre.

“O Pampa já tem pouca floresta, por que desmatar mais? Tínhamos que estar restaurando floresta e não desmatando. Deveríamos estar num momento de desmatamento zero”, defende Vélez.

Para ele, a tendência de crescimento verificada nos últimos anos indica uma sensação de impunidade no RS, o que pode representar uma falta de ação por parte dos órgãos públicos. Como exemplo, o consultor ambiental destaca que o principal problema do desmatamento das florestas do Pampa está localizado no quadrilátero formado pelas cidades de Encruzilhada do Sul, Herval, Pinheiro Machado e Caçapava do Sul, a chamada Serra do Sudeste. O estudo do MapBiomas ainda mostra que o pico do desmatamento acontece em outubro, na primavera.

“Por que não fazemos fiscalização nessa época do ano nesses locais?”, questiona Vélez. O MapBiomas aponta a agropecuária como a principal causa do desmatamento no Pampa e no Brasil. No caso do RS, nos últimos anos, o principal cultivo tem sido a soja.

De acordo com o MapBiomas, nos biomas Pantanal e Cerrado, a maior parte das áreas desmatadas se concentra em áreas privadas (94,1% e 75,9%, respectivamente). Nos biomas Caatinga, Mata Atlântica e Pampa, a concentração de alertas ocorre em vazios fundiários (terras devolutas ou áreas privadas ainda não cadastradas no Cadastro Ambiental Rural).

Também na Amazônia a maior porcentagem do desmatamento ocorre em áreas privadas (44,6%), seguido por assentamentos rurais (22,2%), áreas públicas (17,2%) e áreas protegidas (exceto APAs) com 8,5%. Nos últimos três anos (entre 2019 e 2021), houve crescimento do desmatamento em todas as categorias fundiárias, exceto em Terras Indígenas (TIs), o que leva os pesquisadores a destacarem a importância desses territórios para a preservação ambiental.


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