Meio Ambiente
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28 de abril de 2022
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07:41

Estudo analisa os caminhos do lobby das empresas europeias de agrotóxico no Brasil

Por
Luciano Velleda
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O "PL do Veneno" é um dos exemplos do lobby das empresas europeias para enfraquecer a legislação do Brasil. Foto: Leandro Molina

A organização Amigos da Terra lança, nesta quinta-feira (28), o estudo “Lucrando com Veneno – o lobby das empresas de agrotóxico da União Europeia no Brasil”, de autoria das pesquisadoras Audrey Changoe e Larissa Mies Bombardi. O estudo se propõe a mostrar como as empresas transnacionais, como Bayer/Monsanto e a BASF, líderes da fabricação de agrotóxicos na Europa, têm promovido o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul para vender seus produtos químicos.

De acordo com a publicação, por meio de grupos de lobby, as empresas farmacêuticas atuam para aumentar o acesso ao mercado de alguns de seus agrotóxicos mais danosos. O trabalho consiste em unir forças com associações brasileiras do agronegócio para obter vantagens comerciais. Somente em 2019, a União Europeia exportou mais de 6,5 milhões de quilos de agrotóxicos proibidos ou que nunca foram autorizados em seu território para países que formam o Mercosul.

O estudo mostra que, desde a eleição de Jair Bolsonaro (PL), Bayer e BASF tiveram 45 novos agrotóxicos aprovados nos últimos três anos, sendo que 19 deles contêm substâncias proibidas na União Europeia. No caso da BASF, desde 2016, a empresa obteve 60% de aumento em aprovações de seus produtos comerciais.

A estratégia do lobby inclui também apoiar uma agenda legislativa que visa minar direitos indígenas, remover proteções ambientais e legitimar o desmatamento.

Entre os grupos de lobby do agronegócio do Brasil citados no estudo está o CropLife Brasil, fundado pela Bayer. Conforme as pesquisadores, é por meio desses grupos que  as empresas europeias de agrotóxicos apoiam esforços que enfraquecem medidas de proteção ambiental, incluindo o “PL do Veneno”, que atinge a atual regulamentação de agrotóxicos e enfraquece o processo de aprovação para uso de agrotóxicos no Brasil.

As pesquisadoras destacam que a CropLife International, uma poderosa associação de lobby de empresas agroquímicas que inclui a BASF e a Bayer, recentemente mostrou preocupações quanto às propostas para acabar com a exportação de agrotóxicos banidos na União Europeia. A alegação das empresas é de que governos e agricultores dependem dos agrotóxicos importados para “proteger suas economias agrícolas”.

O estudo lançado nesta quinta-feira mostra ainda que grandes associações do agronegócio que representam a Bayer, a BASF e a Syngenta, contribuíram com cerca de 2 milhões de euros para apoiar as atividades de lobby do “Instituto Pensar Agro”. Plataformas como Agrosaber e o Pamagro são apoiadas por associações do agronegócio financiadas pela Bayer e pela BASF, como o grupo de lobby de agrotóxicos Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) e a Croplife Brasil, ambos apoiadores do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul.

Por outro lado, as empresas de agrotóxicos são beneficiadas com significativas isenções de impostos. Segundo o estudo “Lucrando com Veneno – o lobby das empresas de agrotóxico da União Europeia no Brasil”, o valor que o governo brasileiro deixa de coletar por conta de isenções de impostos sobre agrotóxicos é quase quatro vezes o valor total do orçamento do Ministério do Meio Ambiente em 2020.

Para Fernando Campos Costa, conselheiro da Amigos da Terra Brasil e coordenador do Programa de Soberania Alimentar e Biodiversidade, os maiores atingidos pelo lobby dos agrotóxicos são o povo brasileiro e o meio ambiente. “O caso do enfrentamento à pulverização aérea de agrotóxicos, sendo usados como arma química contra comunidades camponesas na região metropolitana de Porto Alegre (RS), é uma realidade em todo o país, exacerbada pela liberação de armas e de novos venenos e pelo desmonte da legislação ambiental, de saúde e de direitos humanos no governo Bolsonaro”, afirma.

O estudo da organização Amigos da Terra mostra ainda como pesquisadores e acadêmicos que expuseram os impactos dos agrotóxicos na saúde têm sido atacados por seu trabalho, o que inclui assédio, ameaças à carreira e ataques pessoais. Instituições que identificaram as conexões com os problemas de saúde viram seu financiamento pelo governo ser cortado.

Uma das autoras do estudo, a professora Larissa Bombardi, pesquisadora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), chegou a sair do Brasil em 2021 após receber ameaças contra sua vida.

Em nota, a CropLife Brasil defende a aprovação do PL 6299/02. Para a entidade, ele “permitirá o acesso mais rápido a tecnologias mais modernas, seguras e eficazes, que, em geral, têm sido disponibilizadas aos produtores agrícolas de países desenvolvidos de cinco a oito anos antes do que aos nossos agricultores, o que reduz a competitividade do agronegócio brasileiro”.

Em e-mail enviado ao Sul21, a associação afirma ainda que, “ao contrário do que o relatório diz, somos firmes em nosso apoio às regulamentações que favoreçam o avanço da inovação agrícola”. Ao argumentar que “tecnologia e inovação são ferramentas essenciais para a produção de alimentos seguros e saudáveis de maneira sustentável”, a CropLife Brasil defende que o critério decisivo para a avaliação e aprovação de moléculas, princípios ativos ou quaisquer outras soluções agrícolas “seja baseado em ciência, orientado por metodologias consolidadas internacionalmente e parâmetros de segurança para consumo de alimentos determinados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e Codex Alimentarius”.

A notícia foi atualizada no dia 29/04 para inclusão de posicionamento da CropLife Brasil


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