Geral
|
6 de outubro de 2023
|
17:03

Em carta aberta, Ocupação Jiboia pede que Prefeitura recue de decisão de derrubada de muro

Por
Duda Romagna
[email protected]
Foto: Luiza Castro/Sul21
Foto: Luiza Castro/Sul21

As pessoas moradoras da Kasa Okupa Cultural Jiboia decidiram escrever uma carta pública após serem surpreendidas, na última quarta-feira (4), com uma escavadeira derrubando o muro que separa o terreno da ocupação do Museu Joaquim José Felizardo, na rua João Alfredo, no bairro Cidade Baixa. A ação foi coordenada pela Prefeitura de Porto Alegre, que afirma que o muro precisa ser demolido porque corre risco de cair.

Leia também:
Prefeitura derruba muro de ocupação que acolhe mulheres e pessoas LGBTQIAP+ na Cidade Baixa

Na carta, o grupo afirma que vem sendo ameaçado e que as pessoas que vivem no espaço estão sofrendo violações de direitos. “A ameaça ao espaço e às pessoas vem se intensificando nesta semana, […] quando, alegando terem ordem judicial para assim proceder, uma equipe responsável da Prefeitura entrou com uma retroescavadeira pelo portão do museu e demoliu parte do muro que divide o território do museu com o território da ocupação, sem notificação, mandado específico, e sem garantir qualquer direito das pessoas que ali residem, ao serem acordadas na primeira hora da manhã com o muro sendo derrubado por cima do seu espaço”, diz a carta.

Segundo a advogada da ocupação, Stéphani Fleck da Rosa, uma liminar em segunda instância autorizou que a estrutura fosse demolida ou passasse por manutenção, mas a comunidade não teria sido avisada ou intimada. “Não teve uma defesa, inclusive depois a gente contestou, colocou os laudos e agora está entrando com mandado de segurança no Tribunal para tentar reverter essa decisão”, afirma.

A demolição parcial causou perdas, como a exposição de bens às chuvas e danos a estrutura da residência. Com o que conseguiram, as pessoas moradoras reconstruíram partes do muro ao longo da tarde da quarta-feira. Ainda no dia da demolição, moradores do espaço realizaram uma reunião com representantes da Secretaria Municipal de Cultura, onde dizem ter sido acordado com o secretario Henry Ventura uma pausa na derrubada.

Entretanto, nesta quinta-feira (5), o procurador do Município, André Marino Alves, protocolou um pedido para que fosse designado um Oficial de Justiça para o cumprimento da decisão judicial na manhã do dia 9 de outubro, segunda-feira. O documento pontua que o ato deve ser realizado com urgência mesmo sem que a Prefeitura pague pela ação e, ainda, que seja usada a força policial visando menor conflito com as posseiras. Para a advogada da ocupação, o pedido mostra que a administração pública derrubou parte do muro sem um mandado judicial.

Confira a carta da ocupação na íntegra:

“A Ocupação Jiboia, espaço de luta e de moradia de mulheres e pessoas LGBTQI+ em Porto Alegre, vem sendo ameaçada e as pessoas que vivem nesse espaço vêm sofrendo violação de seus direitos sistematicamente durante todo o processo que envolveu a demanda por remoção do muro lindeiro ao Museu de Porto Alegre, que está sob gestão do prefeito Sebastião Melo, um inimigo dos movimentos populares e da luta por moradia na cidade.

É importante que se diga, as pessoas que vivem na ocupação constroem uma luta que é a luta diária pela vida das mulheres e das pessoas LGBTQI+ em todo o país, uma luta pelo território e por moradia, pelo direito à cidade e à vida, à educação, saúde, transporte, uma luta pelo direito de ser quem se é numa das cidades do RS onde mais pessoas são mortas por defenderem viver como são.

Esse espaço é espaço de construção diária de política pública para parte da nossa população que, no geral, não tem acesso a políticas públicas, justamente porque se tornou território e moradia dessas pessoas que, na falta de habitação, ocuparam um espaço vazio como vários que existem na região central da cidade, para construírem um espaço coletivo seu, para terem onde viver em segurança.

A ameaça ao espaço e às pessoas vem se intensificando nesta semana, principalmente no dia de ontem (4), quando, alegando terem ordem judicial para assim proceder, uma equipe responsável da Prefeitura entrou com uma retroescavadeira pelo portão do museu e demoliu parte do muro que divide o território do museu com o território da ocupação, sem notificação, mandado específico, e sem garantir qualquer direito das pessoas que ali residem, ao serem acordadas na primeira hora da manhã com o muro sendo derrubado por cima do seu espaço.

No momento, abrir esse processo para mediação é uma saída para fazer cessar os abusos, o tensionamento com a guarda municipal que aconteceu durante todo o dia de ontem e as violações de direitos contra as pessoas que ali vivem.

Sabemos que essa é uma prática de expulsão de comunidades usada mais de uma vez contra o povo pobre e trabalhador da cidade, e que faz parte da forma como o governo Melo tem tratado as mulheres e a população LGBTQI+ durante anos. Em linhas gerais, enquanto a população luta para reconstruir cidades devastadas pelas enchentes, incluindo Porto Alegre, o prefeito avança com uma retroescavadeira contra o espaço da comunidade, que sem seu território teria ficado sem proteção contra o ciclone e as chuvas. Uma Prefeitura que não constrói política pública e expulsa dos espaços quem busca saída para essa situação.

Mas a cidade é nossa! É do povo trabalhador, das mulheres, da população LGBTQI+ que constrói seus espaços com luta e trabalho todos os dias e ainda tem seus direitos negados sistematicamente por governos que apenas conhecem a lei da especulação imobiliária e do lucro acima da vida e a todo custo.

Ocupação Jiboia resiste!”


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora