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16 de janeiro de 2023
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19:17

Justiça proíbe propaganda de armas da Taurus fora dos canais especializados

Por
Sul 21
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Arte: Matheus Leal/Sul21
Arte: Matheus Leal/Sul21

A Taurus, fabricante brasileira de armas e munições, será obrigada a retirar do seu site e dos seus perfis nas redes sociais todas as fotos e vídeos contendo armamentos e munições, além de estar proibida de fazer propaganda de seus produtos fora dos canais especializados. Em ambos os casos, se descumprir a determinação pagará multa diária de R$ 100 mil.

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A decisão é do juiz Airton Pinheiro de Castro, da 12ª Vara Cível de São Paulo, que aceitou os pedidos liminares em ação civil pública ajuizada contra a Taurus por advogadas e advogados da Rede Liberdade em nome da Comissão Arns, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e do Intervozes (Coletivo Brasil de Comunicação Social), com o apoio técnico do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESEC) e do Instituto Sou da Paz. Ele também determinou que a fabricante deixe de entregar ou recolher os produtos com emprego ilegal dos símbolos nacionais.

O juiz deferiu parcialmente os pedidos liminares das organizações, reconhecendo que, da forma como está, a publicidade da Taurus não atende a legislação. A publicidade de armas é vedada pelo Estatuto do Desarmamento, em vigor desde 2003, mas a empresa fez propaganda institucional de todos os seus produtos em seu site e redes sociais, além de ter realizado campanha publicitária de descontos promocionais de armas de fogo no período de 2 a 12 de setembro do ano passado.

Em sua decisão, o juiz cita os vários casos em que a fabricante foi punida pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) e ressalta que, mesmo tendo sido punida, tornou a violar os parâmetros tanto do CONAR quanto do Estatuto do Desarmamento. De acordo com a decisão, a Taurus terá 15 dias para adequar todas as publicações de suas redes sociais e do seu site aos parâmetros. O juiz pediu ainda a intimação da União e do Exército para se manifestarem sobre o caso nos autos.

Na ação civil pública as organizações se fundamentaram também no Código de Defesa do Consumidor, que proíbe propaganda abusiva, e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que define “armas” como conteúdo inadequado para crianças e adolescentes. A ação lembrou que a ilicitude e reiteração da conduta configuram a prática como abusiva do ponto de vista do consumidor, o que leva à “indenização por danos morais coletivos decorrentes da negligência no dever de alertar para os riscos do aumento da circulação de armas e do manuseio e acomodação inadequadas em ambiente doméstico”. Desde 2018 circulam posts com publicidade da empresa e de seus produtos.

Autores da ação almejam que decisão liminar seja consolidada para restringir a publicidade de armas no Brasil. Arte: Matheus Leal/Sul21

“Os danos decorrem ainda da tentativa de se criar uma ideologia em torno da posse de armas de fogo, associando os itens de maneira leviana e enganosa a noções de patriotismo, a símbolos da cultura e da história nacional e a uma pretensa noção de autodefesa, que explora o imaginário popular de forma deletéria para a cultura de paz”, sustentou a ação.

Essa ideologia armamentista foi favorecida pela política de flexibilização da posse e do porte de armas de fogo, promovida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Foram mais de 40 novos regulamentos que, sem passar pelo Congresso Nacional, permitiram que cidadãos comuns pudessem possuir armas antes restritas às polícias, e andar armados em lugares públicos.

“A decisão reconhece que a Taurus vem realizando publicidade irregular e que desobedeceu reiteradamente às decisões do CONAR a esse respeito. E reconhece também o que o farto consenso científico em torno do tema evidencia: os efeitos deletérios das armas de fogo pra segurança pública. Quanto mais armas de fogo em circulação, mais crimes violentos e mortes”, afirma Lucas Moraes Santos, advogado da Rede Liberdade.

“Como a empresa não vinha cumprindo com as determinações legais, a liminar acaba sendo extremamente importante por garantir a restrição da oferta e apresentação desses produtos que são de extrema periculosidade e não devem ser expostos à população em geral no mercado de consumo. Nossa missão é garantir que essa decisão liminar se torne definitiva, de modo que os consumidores não sejam mais alvo desse tipo de publicidade abusiva”, destaca Christian Printes, coordenador da área Jurídica do Idec.

Segundo o advogado Belisário dos Santos Júnior, ex-secretário de Justiça do Estado de São Paulo e membro fundador da Comissão Arns, a decisão é um marco, mas as autoras e seus advogados ainda querem mais: “O objetivo, na verdade, é o banimento total da propaganda de armas e munições, restabelecendo a cultura de paz, ideia-matriz do Estatuto do Desarmamento, na qual não cabe a busca por armamento que se viu nos últimos quatro anos”, explica.

Como se trata de decisão liminar, a expectativa das entidades, a partir de agora, é consolidar a decisão e ampliar a restrição da publicidade de armas o máximo possível, reduzindo o incentivo à aquisição e ao manuseio de armas pela população. 

Em nota enviada à reportagem, a Taurus diz que a decisão não veda a publicação de propaganda nas suas redes sociais e afirma que já cumpre as decisões do Conar. Confira a íntegra do posicionamento da empresa:

“Circulam na imprensa e nas redes sociais notícias e informações sobre ação civil pública promovida pela Comissão Arns, Rede Liberdade, Intervozes e IDEC, sobre a divulgação de produtos pela Taurus em seu site e em suas redes sociais.

A Taurus apresentou defesa nessa ação demonstrando que atende à legislação aplicável na divulgação de seus produtos na internet e nas redes sociais, e que há muitos anos segue as diretrizes do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (“CONAR”) sobre a publicidade de armas de fogo.

Em decisão liminar, e ainda provisória, a Justiça reconheceu que não há vedação legal ao uso pela Taurus do seu site e de suas redes sociais para divulgação de seus produtos. A decisão determinou ainda que a Taurus siga as diretrizes do CONAR e faça as adequações necessárias de seu site e das redes sociais para tanto.

No curso da ação, a Taurus já havia demonstrado que cumpria as diretrizes do CONAR e as recomendações feitas por seu Conselho de Ética em julgamento de casos específicos.

Sendo assim, são falsas as informações veiculadas na internet de que a Taurus teve propaganda banida das redes sociais da empresa.

A Justiça não determinou a retirada de imagens do site e das redes sociais da empresa; não determinou a retirada de seu site e de suas redes sociais de todas as fotos e vídeos contendo armamento e munições e não vedou o uso desses canais para a divulgação de seus produtos.

Ainda, a decisão liminar apontou que não se verifica na norma “restrição absoluta à publicidade de armamento fora do estrito âmbito das revistas especializadas (…), de modo a determinar, por via transversa, óbice instransponível à atividade publicitária da ré em meio digital, por exemplo, mediante a manutenção de website institucional ou perfil nas redes sociais, desde que observadas redobradas cautelas, bem sintetizada na sumula n. 4 da jurisprudência do Conselho de Ética CONAR.

É contínuo o aprimoramento da Taurus de sua comunicação com o mercado e seu público consumidor, em estrito cumprimento à legislação aplicável, princípio que continuará a ser seguido pela empresa”.

A Taurus também tomará todas as medidas legais cabíveis contra aqueles que estão divulgando notícias falsas a respeito do uso pela Taurus de seu site e redes sociais”.


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