Educação
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7 de outubro de 2022
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15:25

Universidades gaúchas alegam falta de recursos para pagar luz e despesas básicas; UFRGS minimiza bloqueio

Por
Luís Gomes
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Fotos: Carol Ferraz/Sul21
Fotos: Carol Ferraz/Sul21

No último dia 30, o governo publicou um decreto bloqueando de forma imediata R$ 2,4 bilhões de recursos do Ministério da Educação (MEC), sendo R$ 328,5 milhões do orçamento das universidades federais. A decisão veio à tona nesta semana e gerou a indignação dos dirigentes das instituições, assim como a convocação de protestos por parte de estudantes. Nos últimos dias, o Sul21 procurou as seis universidades federais sediadas no Rio Grande do Sul para entender como elas serão impactadas.

Na quinta-feira (7), o ministro da Educação, Victor Godoy, publicou um vídeo em que afirma que não há cortes no orçamento do MEC e que o bloqueio seria, na verdade, um “ajuste operacional”, afirmando que ele será revertido em dezembro. Além disso, afirmou que universidades que precisarem de “apoio do governo” poderiam procurar o MEC, que “conversaria” com o ministério da Economia. Godoy ainda criticou o “uso político” do bloqueio.

Contudo, cinco das seis universidades federais sediadas no Rio Grande do Sul manifestaram preocupação com o bloqueio. A única exceção foi a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), cujo reitor é alinhado a aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Procurada pela reportagem, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) informou em nota que sofreu uma redução no seu limite de empenho de despesas em um montante de R$ 2,583 milhões. “O corte inviabiliza o término do semestre letivo. Os reflexos no não pagamento das despesas serão sentidos ainda no mês de outubro. A capacidade de atendimento às despesas está comprometida e a instituição deverá escolher quais das despesas serão atendidas prioritariamente”, diz a nota.

Segundo a UFPel, os recursos atuais garantem o funcionamento da instituição apenas até o final de outubro e, posteriormente, não há caixa para despesas como energia elétrica e combustível da frota de apoio. “A impossibilidade de atendimento a todas as despesas exigirá uma priorização dos empenhos para as despesas com assistência estudantil, bolsas e restaurante universitário. As demais despesas, como energia elétrica, água e combustível não poderão ser atendidas”, afirma a nota.

A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) destacou que, em junho, a instituição já tinha sofrido um corte de R$ 9 milhões e que o novo bloqueio representa um contingenciamento de mais R$ 5,8 milhões. Considerando que a UFSM já iniciou o ano com uma previsão orçamentária de R$ 129 milhões, o que é R$ 27 milhões a menos do que em 2020, a instituição deve encerrar 2022 com uma dívida de R$ 18 milhões com fornecedores.

A UFSM já havia anunciado o fim do contrato com 115 profissionais terceirizados e a suspensão de obras e reformas. Com o novo corte, será suspensa a concessão de novas bolsas estudantis, as contas de luz não serão pagas, eventos serão cancelados, a jardinagem e arborização da instituição será suspensa, bem como o pagamento de passagens e diárias a servidores. O restaurante universitário não será aberto durante o período eleitoral, conforme orientação da Procuradoria Jurídica da instituição.

Procurada, a Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) informou que o novo bloqueio é grave, mas não inviabiliza o funcionamento da universidade. A UFCSPA ainda manifestou alinhamento à posição tomada pela direção da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) na quinta-feira (6).

Em sua nota, a Andifes destacou que, no ano, já foram retirados R$ 763 milhões dos orçamentos aprovados para 2022 e lembra que, ao todo, o MEC já sofreu um contingenciamento R$ 2,4 bilhões.

“A diretoria da Andifes, que já buscava reverter os bloqueios anteriores para o restabelecimento do orçamento aprovado para 2022, sem os quais o funcionamento das universidades já estava comprometido, aduziu que este novo contingenciamento coloca em risco todo o sistema das universidades. Falou ainda da surpresa com esse critério de limitação de empenhos no mês de outubro, quase ao final do exercício, que afetará despesas já comprometidas, e que, em muitos casos, deverão ser revertidas, com gravíssimas consequências e desdobramentos jurídicos para as universidades federais. Esta limitação estabelecida pelo Decreto, que praticamente esgota as possibilidades de pagamentos a partir de agora, é insustentável. Pediu-se, por fim, que, dada a gravíssima situação, fosse considerada a hipótese de o MEC absorver essa restrição de gastos das universidades com outras rubricas da pasta, tal como ocorreu no bloqueio anterior”, diz a posição tomada pela diretoria da Andifes na quinta.

A Universidade Federal do Pampa (Unipampa) informou que teve R$ 2.306.435,41 contingenciados a partir do último decreto e que, em junho, já havia sofrido um corte de R$ 3,5 milhões, o que resulta na falta de recursos para o pagamento de despesas básicas como água, luz, internet, telefone e aluguéis das dez unidades da Instituição. Além disso, informa que o bloqueio impacta o pagamento de contratos de postos terceirizados de limpeza, vigilância, portaria, motoristas, auxiliares agropecuários, auxiliares do Hospital Universitário Veterinário, intérpretes da Língua Brasileira de Sinais (Libras), entre outros.

“Embora haja esforços para que os programas que envolvem assistência estudantil não sejam atingidos, os programas e ações de ensino, pesquisa, extensão e inovação serão afetados com reduções de atividades e editais. Novas licitações e contratos também estão suspensos”, diz nota divulgada pela Unipampa.

Também por meio de nota, a Universidade Federal de Rio Grande (FURG) informou que foram contingenciados R$ 2.687.619,00 do limite de movimentação de empenho da instituição. A posição da universidade é que, caso o contingenciamento não seja revertido, não será mais possível realizar compras ou contratações.

O reitor da FURG, Danilo Giroldo, pontuou também o texto do decreto do governo, ao contrário do que o ministro Godoy disse, não garante a liberação do montante bloqueado. Ele reconhece que abre a possibilidade, mas pontua que o cenário é de incerteza. “Sendo assim, para os meses de outubro e novembro não existe a chance de fazermos nenhum outro movimento nos empenhos que não aqueles já realizados previamente”, adicionou o reitor.

Giroldo afirma que, apesar do contingenciamento, as atividades estão garantidas para o segundo semestre letivo de 2022. No entanto, ele projeta que, sem uma recomposição do orçamento para 2023, o início do ano letivo em março próximo será “complexo e inviável”, uma vez que o orçamento de 2022 já foi 12% inferior ao de 2021.

“Ainda que se discuta sobre ser um corte ou não, um bloqueio ou qualquer outro termo, não se pode deixar de registrar a gravidade da situação, já que a nomenclatura não torna o cenário prático menos impactante. As universidades tiveram, mesmo que indiretamente, seus recursos retirados, já que a impossibilidade de usar o dinheiro não deixa de ser uma forma de cortar a verba. Este cenário fica ainda mais claro quando, por determinação de um decreto vigente sobre execução orçamentária, toda administração federal pode executar seu orçamento apenas até o dia 9 de dezembro. Então, mesmo que esses valores sejam disponibilizados para uso em dezembro, não há tempo hábil para de fato utilizar a verba”, afirma.

Já a UFRGS inicialmente informou que não iria se manifestar. Contudo, no início da tarde desta sexta (7), o reitor Carlos André Bulhões Mendes divulgou um posicionamento em que afirma que o contingenciamento de recursos afetará apenas um “percentual reduzido” das despesas de custeio da instituição e não trará prejuízo ao funcionamento geral.

“Estão garantidos os valores para o pagamento de salários, bolsas, assistência estudantil, contas compulsórias (energia, água e telefonia), contratos de terceirizados e orçamento das Unidades Acadêmicas. Igualmente, registramos que, em contato com a União e lideranças do Congresso Nacional, foi sinalizado que, antes do final do ano, os recursos poderão ser liberados para utilização pela Universidade”, diz a nota assinada pelo reitor.


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