Economia
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30 de março de 2023
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13:10

Haddad apresenta nova regra fiscal com limite e garantia de crescimento de despesas

Por
Luís Gomes
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Haddad apresentou novo marco fiscal no Senado antes de coletiva | Foto: Edilson Rodrigues/Senado Federal
Haddad apresentou novo marco fiscal no Senado antes de coletiva | Foto: Edilson Rodrigues/Senado Federal

Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, apresentaram na manhã desta quinta-feira (30) a proposta de novo arcabouço fiscal que o governo federal irá encaminhar para o Congresso Nacional na próxima semana. A principal regra da proposta estabelece que o crescimento da despesas a 70% do aumento da receita nos 12 meses anteriores.

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A regra atual que será substituída, o Teto de Gastos implementado pelo governo Temer em 2016, limite o crescimento das despesas do governo federal à correção da inflação.

Com a implementação da nova regra fiscal, o Ministério da Fazenda prevê um déficit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023 e equilíbrio nas contas em 2024. Para 2025, a previsão é de superávit de 0,5%. Em 2026, a Fazenda estima superávit de 1%. As metas terão uma banda — margem de tolerância — de 0,25%, para mais ou para menos.

Em caso de não cumprimento da meta, o crescimento da despesa para o ano seguinte ficará limitado a 50% do crescimento da receita. As únicas exceções ao limite são gastos instituídos pela Constituição, como o Fundeb e o piso nacional da enfermagem, que não podem ser regulamentadas por lei complementar.

Na abertura da apresentação, Haddad lembrou que, em seus dois primeiros governos, o presidente Lula procurou compatibilizar responsabilidade social com responsabilidade fiscal. “Durante a campanha de 2022, repetimos à exaustão que a campanha pública precise ter credibilidade, previsibilidade e seriedade. Ter um horizonte para que as famílias, os investidores, os empresários e os trabalhadores organizem suas vidas a partir de regras claras. Regras exigentes, mas críveis”, afirmou.

Ele pontuou que foram analisadas regras fiscais de outros países e as que já foram estabelecidas no Brasil, como o Teto de Gastos, que o governo pretende substituir, e se chegou a elaboração dos mecanismos de correção para o caso de não cumprimento de metas.

“Se não tiver mecanismos de autocorreção, por mais boa vontade que tenham os gestores públicos, eles próprios ficarão em situação difícil para corrigir os rumos”.

Por outro lado, destacou que a regra possui também uma previsão anticíclica que permite o governo a usar o “colchão” de anos de superávit em momentos de desaceleração da economia e de retração, para evitar ajustes muito duros que levassem a congelamento de investimentos, como o que levou à paralisação de milhares de obras na última década.

Em momentos de maior crescimento da economia, a despesa não poderá crescer mais de 2,5% ao ano acima da inflação. Em momentos de contração econômica, o gasto não poderá crescer mais que 0,6% ao ano acima da inflação. Na prática, isso garante que a despesa irá aumentar entre 0,6% e 2,5% ao ano.

Em um mesmo sentido, pontuou que as bandas de 0,25% das metas têm o objetivo de evitar “correria” tanto para aumentar as despesas, em caso de arrecadação que supere as expectativas, como para aumentar os cortes, em cenário de menor arrecadação.

Haddad pontuou que foi questionado se o governo planejava aumentar impostos para garantir o aumento de arrecadação e que deixou claro que o novo arcabouço fiscal tem como pressuposto a não criação de novos tributos e a não elevação de alíquotas existentes.

Contudo, destacou que injustiças fiscais serão enfrentadas. Ele destacou que a Fazenda tem o compromisso de reverter as regras que favoreceram “demasiadamente” setores da economia com benefícios fiscais. Prometeu encaminhar ainda neste ano medidas para reverter esses benefícios e regulamentar setores da economia que hoje não estão pagando os impostos, como o setor de apostas eletrônicas. Outro exemplo citado, posteriormente, foi a taxação das big techs — grandes empresas de tecnologia, como Google, Meta [Facebook], etc.

Esse conjunto de medidas saneadoras, segundo dele, terão o impacto entre R$ 100 e R$ 150 bilhões até o final do ano e irão cobrir o “buraco herdado da administração anterior”, ao mesmo tempo que darão a possibilidade de crescimento ao País.

Haddad afirmou que a ideia é combater a tendência patrimonialista que se apropriou do Estado brasileiro. “Não vamos penalizar ninguém que está com seus tributos em dia, mas há um esforço mundial de acabar com os abusos que as grandes empresas cometem contra seus estados nacionais”.

O ministro disse que está sendo feito pelo Ministério da Fazenda um grande esforço de revisão dos “jabutis” que foram entrando no sistema tributário para beneficiar alguns setores da economia. E já indicou que o esforço da reforma tributária a ser encaminhada ao Congresso e aumentar a base de pagadores de impostos, o que permitiria, inclusive, reduzir imposto sobre o consumo no futuro. “Se quem não paga imposto passar a pagar, todos nós vamos pagar menos juros. É isso que vai acontecer. Agora, para isso acontecer, aquele que está fora do sistema, tem que vir para o sistema”.

Questionado sobre as intensas discussões que antecederam a apresentação da proposta, as quais colocaram setores do governo que defendiam a priorização de investimentos em conflito com o Ministério da Fazenda, Haddad afirmou que o modelo de arcabouço fiscal foi “estressado” de vários pontos de vista, o que possibilitou chegar a um modelo consistente com o “desejo médio”. Destacou ainda que passou horas respondendo a perguntas de parlamentares na Câmara e no Senado, incluindo da oposição, e de que sua impressão é de que o arcabouço foi bem recebido. “Eu penso que o Congresso Nacional está realisticamente otimista”, disse.

Haddad ainda tentou minimizar a preocupação dos setores que defendiam uma regra mais flexível para investimentos a curto prazo afirmando que as necessidades básicas da população poderão ser garantidas com a nova regra fiscal. “Nós não vamos permitir que um país que é um dos maiores produtores de alimentos do mundo conviva com a fome”, disse, acrescentando que acredita que, a partir do arcabouço, investidores não tenham mais dúvidas sobre investir no Brasil.

Ministra do Planejamento e do Orçamento, destacou como principais virtudes da proposta o fato de ela ser transparente, simples e possível de ser cumprida. “Esta regra fiscal é crível, portanto nós temos condições de cumpri-la de acordo com as metas estabelecidas. Porque ela tem flexibilidade, tem bandas e ela permite, a partir daí, que nós façamos alguns ajustes para conseguir atingir essas metas”, afirmou.

Por outro lado, destacou que ela não tem o objetivo de cortar gastos, mas sim aumentar a qualidade do gasto público e garantir que haja receita suficiente para fazer os investimentos necessários.

“Aqui não tem objetivo de diminuir os gastos públicos, embora isso vá acontecer porque tem limites. O limite é dado em relação ao aumento da receita. Aumenta a receita, aumenta a despesa. Na mesma proporção? Não, porque nós temos um déficit fiscal de R$ 230 bilhões, fruto de uma herança passada de uma pandemia e de políticas públicas que não foram contempladas nos últimos quatro anos”, disse. “A grande realidade é que nós passamos seis anos, praticamente, sem reajustar a merenda escolar das nossas crianças. Num país que é campeão de produção de laranjas, nossas crianças tomavam suco em pó. Nós estamos de quatro anos sem garantir casa popular para quem ganha até um salário mínimo e meio. Nós estamos falando de Farmácia Popular que ficou muito tempo com suas prateleiras vazias. Então, diante desse cenário, foi necessário gerar despesas permanentes, porque elas não são vistas como despesas, isso é obrigação do governo federal, assistir a quem mais precisa”, complementou.

A ministra finalizou afirmando que, com as novas regras, pela primeira vez em muito tempo, será possível ter uma visão de médio e longo prazo na elaboração do Orçamento federal.

Antes da apresentação à imprensa, Haddad, sua equipe e o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, participaram de reunião com senadores — eles já tinham apresentado a proposta a líderes da Câmara na quarta-feira (29). Após o encontro, presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, afirmou que a Casa tem “um compromisso absoluto” com a votação do novo arcabouço fiscal.

“Agora esperamos a evolução de um debate político natural do processo legislativo, em que a concepção inicial do Poder Executivo pode eventualmente sofrer algum tipo de alteração ao longo do tempo. Mas há de nossa parte, de todos os líderes do Senado, inclusive da oposição, um compromisso absoluto com uma pauta que é fundamental para o Brasil, que é a disciplina e o equilíbrio fiscal em substituição ao teto de gastos”, afirmou.

Mesmo o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), manifestou que “o espírito é de colaborar”. “Não somos oposição ao País. É importante que o Brasil tenha de fato uma política fiscal consistente. Nós nos reservamos a ter uma posição mais acurada a respeito do projeto quando verificarmos o documento. O primeiro passo foi dado. No processo de discussão, se o arcabouço apresentado de fato der solidez, mostrar que a trajetória da dívida no futuro vai declinar pelo menos estabilizar e mostrar que vai dar segurança a quem investe no Brasil, não tenha dúvida que terá nosso apoio”, disse.

Após ser encaminhado na próxima semana como projeto de lei complementar, a proposta começará a tramitar na Câmara dos Deputado e, se aprovada, chegará ao Senado. Por não se tratar de uma emenda constitucional, e sim um PLC, ela precisará apenas de maioria absoluta, o que representa 257 deputados e 41 senadores.

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*Com informações da Agência Brasil e da Agência Senado. 


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