Economia
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9 de maio de 2022
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19:02

Entidades criticam projeto que congela investimentos no RS e apontam alternativas

Por
Luciano Velleda
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Reunidas na sede do Cpers, entidades se mobilizam contra aprovação do projeto que será votado nesta terça (10). Foto: Caco Argemi/Cpers Sindicato
Reunidas na sede do Cpers, entidades se mobilizam contra aprovação do projeto que será votado nesta terça (10). Foto: Caco Argemi/Cpers Sindicato

Na véspera da Assembleia Legislativa votar o projeto de lei que pode congelar os investimentos do governo estadual por 10 anos, entidades de servidores se reuniram para criticar a possibilidade e mostrar que há alternativa no tema da dívida do Rio Grande do Sul com a União.

O Projeto de Lei Complementar (PLC) 48/2022, proposto pelo governo de Eduardo Leite (PSDB), altera a Lei do Teto de Gastos, aprovada em dezembro de 2021. De acordo com a lei em vigor, as despesas com investimento podem sair do cálculo do teto de gastos depois de 4 anos, mantendo no teto as despesas com pessoal e custeio. Na nova proposta, o governo estadual quer manter os gastos com investimento no cálculo do teto por 10 anos, reajustado apenas pela inflação.

A lei estadual do Teto de Gastos foi uma das imposições do governo federal para a adesão do RS ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). A nova mudança, que pode ser aprovada na Assembleia nesta terça-feira (10), é mais uma exigência da União no processo de homologação da adesão do estado ao RRF.

Presidente do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers), Helenir Aguiar Schürer criticou o ponto de vista único apresentado pelo governo estadual, como se não houvesse outro modo de enfrentar o problema da dívida do Estado a União. “Há sim outro caminho, que não se entregar e ficar de joelhos para o governo federal”, afirmou, durante coletiva de imprensa realizada pela Frente dos Servidores Públicos do Rio Grande do Sul (FSP-RS).

Filipe Leiria, presidente do Sindicato de Auditores Públicos Externos do Tribunal de Contas do RS (Ceape), fez o mesmo destaque, ponderando que até mesmo sob o viés neoliberal existem outras possibilidades. “Há alternativas para o governo e o parlamento, mesmo nos marcos ideológicos do governo eleito.”

Se o projeto for aprovado, ele enfatizou, o Executivo terá restrição para contratar novos funcionários, com exceção de trabalhadores temporários e em cargos de comissão. Leiria ainda criticou o sigilo dos termos da negociação da dívida entre o governo estadual e a União. “Não é razoável tratar disso como algo sigiloso”, analisou.   

A proposta de manter os gastos com investimento no cálculo do Teto de Gastos por 10 anos tem sido fortemente criticada por deputados, associações e sindicatos de servidores públicos e setores do Judiciário por impor a limitação de investimentos públicos por tanto tempo.

As críticas também se concentram no valor da dívida do RS com a União. Na época do primeiro acordo assinado, em 1998, a dívida do Estado com a União era de R$ 9,5 bi. Agora, depois do RS pagar desde então mais de R$ 37 bilhões, a dívida ainda está em R$ 70 bi.

Duas ações tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando os termos da dívida. Na semana passada, em evento organizado pela OAB/RS, o presidente da entidade, Leonardo Lamachia, disse que a “dívida está quitada”. Na ocasião, ele destacou que a OAB ingressou com uma ação no STF prevendo uma perícia da dívida pública, já que os valores cobrados atualmente pela União são muito maiores do que deveriam ser.

“Estamos abrindo mão de discutir um saldo devedor que temos evidências de que, se formulado em bases justas em 1998, já estaria pago desde 2013”, afirmou Josué Martins, auditor público externo do TCE-RS e integrante da Coordenação do Núcleo Gaúcho da Auditoria Cidadã da Dívida Pública.

Para ele, não é razoável o atual governo deixar para as futuras administrações uma restrição de investimento que não quis para si próprio, e lembrou que Leite foi contra o ex-governador José Ivo Sartori (MDB) aderir ao Regime de Recuperação Fiscal. Martins também criticou a postura do atual governo estadual de abrir mão da ação que tramita no STF e que ainda pode ser vitoriosa para o RS.

Durante a coletiva, Antônio Augusto Medeiros, presidente do Sindicato dos Servidores de Nível Superior do Poder Executivo do RS (Sintergs), reafirmou a necessidade de barrar o projeto do governo na Assembleia. “O que está em jogo é o pacto federativo. Com a aprovação do PLC 48, o Estado assume um papel de submissão ao governo federal, deixa os próximos dois governos sem poder de gestão, de promover políticas públicas no Rio Grande do Sul”, declarou.

O auditor público externo do TCE-RS, Josué Martins, disse não ser verdadeira a afirmação que tem sido feita pelo governo estadual de que se não aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), será obrigado a pagar os valores atrasados numa única parcela e não conseguirá mais pagar em dia o salário do funcionalismo.

Devido a uma decisão liminar do STF, o pagamento da dívida do RS com a União está suspenso desde 2017.

Integrante da Coordenação do Núcleo Gaúcho da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, Martins explica que a tese difundida pelo governo estadual não procede porque o próprio governo assinou um termo aditivo que incorpora as parcelas não pagas. “É falso esse argumento”, afirma.

A ação que defende a tese de que a dívida do RS já está quitada tramita no STF desde 2012. Em 2019, a ministra Rosa Weber determinou uma perícia na dívida. Martins diz que a análise constatou o pagamento de cerca de 70% do saldo devedor.

Além de insistir nas ações judiciais que questionam o valor atual da dívida, o auditor público explica que o governo estadual tem outras opções que não sejam aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Tal regime, diz Martins, é o mais restritivo criado pelo governo federal sobre a economia dos estados.

Ele pondera que a mesma lei que criou o RRF estabelece também outros dois planos: o Plano de Acompanhamento e Transparência Fiscal (PATF) e o Plano de Promoção do Equilíbrio Fiscal (PEF). Martins enfatiza que ambos são menos restritivos que o RRF. No caso do PEF, a vigência das restrições é de apenas uma gestão, com a possibilidade de obtenção de novos financiamentos com garantias da União.


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