Cultura
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2 de julho de 2022
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15:44

Casa de Cultura Mário Quintana recebe exposição em homenagem à cena drag queen da Capital

Por
Duda Romagna
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Cassandra Calabouço é uma das inspirações da exposição. Foto: Tiago Nicoloso
Cassandra Calabouço é uma das inspirações da exposição. Foto: Tiago Nicoloso

Na terça-feira (28), a exposição “antes que a noite acabe” foi inaugurada no Espaço Marilene Bertoncheli, no térreo da Casa de Cultura Mário Quintana. A mostra, de autoria do artista visual Sandro Ka, presta homenagem à cena drag queen e transformista de Porto Alegre, evocando artistas do passado e atuais, como Rebecca McDonald, Cassandra Calabouço, Gloria Crystal, Dandara Rangel, Charlene Voluntaire, Laurita Leão, Maria Helena Castanha, Lady Cibele e Suzzy B. A obra é definida como uma forma de resistência cultural a processos de violência contra a população LGBTQIA+ e permanece exposta até 31 de agosto.

Sandro Ka dá luz aos nomes de drags icônicas de Porto Alegre. Foto: arquivo pessoal.

O autor, que também é doutor em Artes Visuais (PPGAV/UFRGS), especialista em Ética e Educação em Direitos Humanos e professor da Escola de Belas Artes da UFMG, destaca que a cultura LGBTQIA+ é um tema que guiou sua militância e é assunto de suas pesquisas acadêmicas recorrentes. “Nós, sujeitos LGBTQIA+, vivemos e produzimos elementos culturais identitários que são produtores de sentidos, que nos moldam, que nos constituem. São produtores de identidades e significados. Nos auxiliam a nos vermos e nos entendermos no mundo. E, nesse sentido, penso que a arte transformista e a arte drag, enquanto práticas artísticas tão representativas, sejam uma espécie de ícones de nossa cultura”, declara Sandro.

Para ele, desenvolver a homenagem é destacar a importância das artistas como figuras emblemáticas na construção cultural e afetiva para a comunidade. Sua admiração e amizade com a drag queen Cassandra Calabouço o aproximaram desse universo. “Cassandra é minha musa no desenvolvimento do trabalho como um todo. Essa percepção sobre as lacunas e apagamentos relacionados à arte drag e transformista foram a principal motivação para desenvolver as obras da exposição. Especialmente, o totem de luz, que se coloca exaltando nomes de artistas que foram e são muito importantes pra mim, enquanto homem cis gay que na noite reconheceu um espaço de acolhimento, afeto e segurança para desenvolver minha sexualidade.”

Cassandra Calabouço descreve a obra de Sandro como uma aliança entre gerações, um resgate cultural de uma expressão artística que dá vida a nomes de artistas atuais, assim como homenageia aquelas que já faleceram. “Estes nomes resistirão ao tempo, independente da memória da geração que conheceu e teve estas artistas como referência. Eu tive o privilégio de ver no palco, e também dividir camarim, com Dandara Rangel, por exemplo. É importante para as gerações se enxergarem inspirando o trabalho de outros artistas, de outras linguagens artísticas. Para nós, é muito importante afirmar positivamente nossos ancestrais, porque nossas existências tendem a ser esquecidas, apagadas em curto espaço de tempo.”

Sandro Ka foi um dos artistas participantes da exposição Queermuseu, de 2017, que sofreu com a censura de grupos políticos conservadores e foi retirada do espaço Santander Cultural após as manifestações. O resultado disso foi uma multa paga pelo Santander através de um termo de ajuste do Ministério Público e, em 2022, a Parada Livre de Porto Alegre foi parcialmente financiada pelos recursos da multa.

Ato contra o cancelamento da exposição Quuermuseu, no Santander Cultural. Foto: Guilherme Santos/Sul21

“Penso que a melhor resposta possível nesse cenário desastroso e perverso permitiu que outros projetos e ações artísticas surgissem e se fortalecessem. Isso foi um ganho, embora as marcas dessa querela sejam sentidas até hoje. Talvez, uma exposição como ‘antes que a noite acabe’ nunca mais volte a ser exibida num espaço como o Farol Santander”, declara o artista.

“Após o fechamento da exposição Queermuseu, as dinâmicas do circuito da arte mudaram profundamente. Retrocedemos em todos os sentidos, de modo que tal impacto sentimos até hoje. As instituições, de modo geral, passaram a atuar com medo, com receio de dar espaço e visibilidade a determinadas pautas, sobretudo aquelas que dizem respeito a questões de gênero e sexualidade.”


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