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21 de janeiro de 2016
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19:19

Com tecnologia atual, utilizar agrotóxicos é sofrimento gratuito, diz ex-presidente da Agapan

Por
Luís Gomes
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Foto: Lorenzo Leuck - ASCOM/GHC
Oficina debateu os efeitos de uma alimentação não saudável | Foto: Lorenzo Leuck – ASCOM/GHC

Luís Eduardo Gomes

O direito sobre uma alimentação saudável e os efeitos nocivos dos agrotóxicos em nosso organismo, especialmente como responsáveis pelo aumento de incidência de doenças, foi o tema de uma oficinas do Fórum Social Mundial (FSM) Temático nesta quinta-feira (21), proposta pelo Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisa e de Fundações Estaduais do Rio Grande do Sul (Semapi) e pela Central Única dos Trabalhadores (CUT-RS). Na oficina Alimentação Saudável, “Impacto do uso dos agrotóxicos em nossas vidas”, também foi apresentado o case do Grupo Hospitalar Conceição, que desde o ano passado vem abrindo espaço para a agricultura familiar e comunidades quilombolas como fornecedores de alimentos.

Presidente do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do Estado do Rio Grande do Sul (Consea-RS), Edni Schroeder saudou o fato de a mesa ter discutido a questão da alimentação saudável numa perspectiva em que questionou o atual projeto de desenvolvimento do país, que, segundo ele, considera o alimento como um componente do mercado, e não “como um necessário alimento saudável para o desenvolvimento das pessoas”.

“Tratar o alimento como mercado é normal num país capitalista. Por outro lado, é direito humano das pessoas. Como tal, tem que ser acessível. Sendo acessível, tem que ter as características que as pessoas precisam, e nem todas as pessoas têm que se alimentar do mesmos alimentos. É o que chamamos do direito humano à alimentação adequada. Para uma pessoa hipertensa, não é adequada uma alimentação com muito sal”, exemplificou.

Em sua fala, Schroeder abordou o tema da soberania alimentar, que ele considera como o direito de a sociedade controlar que tipo de alimento está consumido. “Esse direito é negado na medida em que outros alimentos são colocados comercialmente como alimentos enriquecidos, alimentos processados, ultraprocessados. Nós já estamos considerando que, por já terem tantos aditivos, eles deixam de ser o que eram originalmente. Já não podem mais ser considerados alimentos”, disse. “Tu come hoje uma batatinha de fast food e ela tem tantos outros ingredientes que deixa de ser batatinha”.

Agrotóxicos

Já o ex-presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natura (Agapan), professor Francisco Milanez, abordou a questão dos agrotóxicos.

Segundo ele, apenas um tipo de químico, o glifosato, está relacionado ao aumento da incidência de cerca de 35 doenças, tais como autismo, mal de alzheimer, mal de parkinson, esclerose múltipla, entre outras, e é considerado como de baixa toxicidade. “O principal culpado pelo autismo é o glifosato. É uma epidemia mundial de uma doença que antes não se ouvia falar”.

Milanez explica que o glifosato é considerado um produto de baixa toxicidade porque atinge apenas a fisiologia das plantas e não dos animais. No entanto, ele salienta que o químico ataca também bactérias que são essenciais para o nosso organismo. “Essa falta de bactérias causa doenças. Os autistas, por exemplo, têm concentração de bactérias diferentes”.

Foto: Lorenzo Leuck - ASCOM/GHC
Foto: Lorenzo Leuck – ASCOM/GHC

Segundo o biólogo, entre 2007 e 2014, foram registradas 35 mil notificações de intoxicação no País, número que ele considera ainda estar muito abaixo da realidade. “A gente sabe muito bem que é um centésimo do que acontece na realidade porque as pessoas não ligam uma coisa a outra, mas são números assustadores”, diz. “Mais assustador ainda, é o fato de que os agrotóxicos movimentaram US$ 12 bilhões no Brasil em 2014”, complementou, salientando ainda que esses números, oficiais, referem-se apenas ao mercado legal de produtos químicos e que ainda existe um grande mercado negro e de contrabando de agrotóxicos, especialmente no RS.

Milanez também criticou o fato de não existirem pesquisas no mundo sobre o efeito combinado de agrotóxicos no organismo humano. Ele citou o fato de que uma pesquisa recente feito com agricultores da região de Bento Gonçalves revelou que eles utilizam, em média, 30 tipos de agrotóxico ao mesmo tempo em suas lavouras e que não há como saber quais são os efeitos dessa mistura no organismo. “Não existe nenhum estudo que analise o uso combinado de agrotóxicos, apenas individualmente. É uma vergonha que ninguém abrace estudos sobre a sinergia de agrotóxicos”, afirmou.

Por outro lado, ele afirmou que hoje já existiriam tecnologias que permitem que se substitua a utilização de produtos químicos por alternativas que não agridem o organismo. “Hoje é um sofrimento gratuito porque há todas as tecnologias para produzir alimentos saudáveis. Mas, claro, não tem interesse, porque alguém lucra com os agrotóxicos, enquanto com alimentos saudáveis ninguém lucra”, diz.

Ele cita, por exemplo, a possibilidade de aumentar a fertilização com a utilização de pó de rocha junto com bactérias e fungos, uma técnica de biomineralização para fertilizar em lugar do adubo químico, desenvolvida no RS.

Experiência do GHC

Outro destaque da oficina foi a apresentação de Sandra Fagundes, Diretora Superintendente do GHC, sobre a experiência da instituição na compra de produtos da agricultura familiar.

Desde maio de 2015, o GHC passou a comprar alimentos de cinco comunidades quilombolas do Estado para serem utilizados em pratos servidos aos usuários do SUS atendidos nos hospitais do Grupo, em Porto Alegre. Em novembro passado, o GHC expandiu a compra para mais de 60 quilombolas. Esta segunda chamada financiou a produção de 146 toneladas de alimentos.

Também participou da mesa secretário da Agricultura Familiar do MDA, Onaur Ruano, que abordou as experiências de fortalecimento da agricultura familiar colocadas em prática pelo governo federal.



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