Por Selvino Heck (*)
Vinte anos depois do primeiro Fórum Social Mundial em 2001, em Porto Alegre, realizado em contraposição ao Fórum Econômico de Davos, do projeto neoliberal do grande capital, a pergunta pode ser, ou continua sendo: Um outro mundo é possível?
Porto Alegre e o Rio Grande do Sul acabaram sendo o território do primeiro Fórum Social Mundial porque aí floresceu, a partir de 1989, e continuava florescendo em 2001, a participação popular nos governos populares locais, através do Orçamento Participativo: o povo participava da construção do orçamento público, decidia para onde ia o dinheiro que era de todos, em diálogo com o governo construía e decidia políticas públicas. Florescia uma nova forma de fazer política, com menos desigualdade, com mais justiça social, com vida melhor para todas e todos, especialmente os mais pobres, trabalhadoras e trabalhadores, moradoras e moradores da periferia, e com democracia em todos os poros da sociedade.
Isso nunca tinha acontecido na história do Brasil, e começou a se espalhar pelo resto do país, com mais governos populares assumindo o Orçamento Participativo, e se espraiava pela América Latina. com governos populares e progressistas. A vitória de Lula, em 2002, veio coroar esse período de protagonismo popular, soberania e democracia.
20 anos se passaram. Em 2016, um golpe ilegítimo e antidemocrático e o impeachment da presidenta Dilma Rousseff interromperam este tempo de luz e esperança, não só no Brasil, com reflexos na América Latina e outros lugares do mundo. As elites capitalistas e escravocratas brasileiras não suportaram o exercício da liberdade e a força das e dos que nunca tiveram vez, voz e direitos. Resolveram, mais uma vez, romper com a democracia, como já tinham feito no Brasil em 1964, de novo com as bênçãos das Forças Armadas, tal como aconteceu em diferentes países latino-americanos e caribenhos ao longo do tempo e da história.
Estamos em 2021. O mundo está em crise. Não só pela pandemia do coronavirus, mas também porque a desigualdade econômica cresceu violentamente, as emergências climáticas ameaçam a humanidade, as ditaduras, reais ou disfarçadas, estão de volta, a democracia está ameaçada, a soberania dos povos e nações está em perigo.
Há outras grandes mudanças. Pela primeira vez, um FSM é totalmente virtual, por causa da pandemia. Ao mesmo tempo, os donos da internet e das redes sociais são também donos das vidas, donos do poder e donos do mundo. Vasculham tudo, sabem tudo de todos, ganham rios de dinheiro, dominam as democracias, como se viu nas eleições presidenciais brasileiras de 2018, entre outras eleições, como a de Porto Alegre em 2020, quando as fake news a serviço da direita foram vencedoras, à base da mentira, da calúnia, das inverdades e do controle de corações e mentes.
Que fazer? Como ainda pensar num outro mundo possível, e construí-lo? Há luz no horizonte ou no fim do túnel?
Mil atividades, debates, diálogos acontecem na semana de 24 a 31 de janeiro de 2021. Milhares de pessoas, educadoras e educadores, lutadoras e lutadores, militantes, gente de todas as latitudes participam, ultrapassando fronteiras, e preparando o Fórum Social do México em 2022.
Mas uma atividade em 26 de janeiro, embora não diretamente ligada ao FSM 2021, chamou a atenção, depois das grandes carreatas acontecidas em todo Brasil no domingo 24 de janeiro, maiores que o esperado, pelo Fora Bolsonaro e por democracia.
A Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo convocaram uma Plenária nacional de Organização das Lutas populares. Mais de 400 participantes: participantes todos os partidos progressistas e de esquerda, todas as Centrais Sindicais, os movimentos sociais e populares mais importantes do país, representantes de diferentes igrejas e religiões, entre outras representações nacionais. E foram assumidas por todas e todos 3 bandeiras de luta: VACINAÇÃO JÁ! AUXÍLIO EMERGENCIAL E EMPREGO JÁ! FORA BOLSONARO JÁ!
A Plenária acordou e estabeleceu um calendário comum de lutas e mobilizações até 8 de março, Dia Internacional da Mulher: carreatas e bicicletas no domingo, 31 de janeiro; 1 de fevereiro, data da eleição no Congresso Nacional, Dia Nacional de Luta; 6 de fevereiro, retomada das iniciativas de solidariedade; no carnaval, 15 e 16 de fevereiro, manifestações políticas, agitação e propaganda; 21 de fevereiro, super carreata nacional de mobilização e protesto.
Tudo isso vai acontecer incorporando a celebração do centenário de Paulo Freire em 2021, com muito debate e prática popular da pedagogia libertadora freireana, e a Sexta Semana Social Brasileira, promovida pela CNBB até 2022, com o tema TERRA, TRABALHO E TETO, UM MUTIRÃO PELA VIDA!
As duas palavras que mais apareceram na Plenária nacional de Organização das Lutas populares foram solidariedade e unidade. Solidariedade com os mais pobres e com quem sofre com a pandemia, com reforço dos Comitês Populares contra a Fome e Comitês Populares da Saúde. Unidade de todas aquelas e todos aqueles que assumem e lutam pelo Fora Bolsonaro.
O Fórum Social Mundial 2021 virtual está produzindo frutos e vai canalizar energias, vontade, coragem para o resto do ano. Um novo tempo está chegando, mesmo que o amanhecer ainda demore um pouco.
A luta continua. Um outro mundo é possível, urgente e necessário.
(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990). Em quinze de janeiro de dois mil e vinte um.
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